Cults como 'Romaria' renovam o prestígio da pátria de Pedro Almodóvar nos festivais de maior prestigio à força de uma nova linhagem de produtoras
Representado nas telas do Festival do Rio por uma esquadra de realizadoras sintonizadas com conflitos de pertencimento como Avelina Prat ("Uma Quinta Portuguesa") e Eva Libertad ("Surda"), o audiovisual de CEP espanhol arrebatou as plateias cariocas nesta terça-feira (7) com "Romaria", que chegou à cidade trazendo uma indicação à Palma de Ouro de Cannes, onde a diretora Carla Simón foi aclamada pela crítica. Quem trouxe o longa-metragem ao Brasil foi María Zamora, que hoje produz um sucesso atrás do outro, já sintonizada com a América Latina.
"Vou produzir a chilena Manuela Martelli, que dirigiu '1975', num projeto chamado 'El Deshielo', e vou fazer o novo filme de Tatiana Huezo", antecipa María Zamora, ao Correio, lembrando que levantou outras três produções de sua Espanha natal, além do cult de Simón, com quem trabalha há dez anos. "Ela é uma parceira generosa com quem eu partilho não só o processo artístico, mas também decisões sobre trailers e questões práticas da filmagem".
Com sessões nesta sexta (às 14h, no Cinesystem Belas Artes) e no domingo (às 21h30, no Kinoplex São Luiz 2), "Romaria" saiu do papel em meio ao êxito mundial de "Alcarràs", que assegurou o Urso de Ouro a Simón e a María em 2022. Aqui, essa trama sobre um clã de agricultores ligados ao plantio de pêssego está na grade da plataforma Mubi.
"Não há um só ano em que os grandes festivais do mundo não tragam filmes espanhóis nas sessões de maior relevo de suas mostras, revelando uma nova geração de artistas de um país antes conhecido por Pedro Almodóvar e por Carlos Saura. Isso também se aplica a uma nova geração de produtores, que buscam financiamento em fontes diferentes. O caso de 'Romeria', por exemplo, envolve a Netflix Espanha, Moviestar e a TVE", explica María, que participou de títulos premiados como "O Corno do Centeio", que ganhou a Concha de Ouro de 2023, e "Creatura", uma sensação em Cannes há dois anos.
Com "Romaria", o Festival do Rio megulha na cruzada de Marina (Llucia Garcia), uma jovem de 18 anos, órfã desde pequena, que viaja até a costa atlântica da Espanha para obter uma assinatura dos avós paternos — que nunca conheceu — a fim de poder completar a inscrição em uma bolsa de estudos. Ela enfrenta um mar de novos tios, tias e primos, sem saber se será acolhida ou recebida com resistência. Ao despertar emoções há muito enterradas, reviver ternuras esquecidas e revelar feridas não ditas ligadas ao passado, Marina tenta juntar as memórias fragmentadas e muitas vezes contraditórias dos pais de que mal se lembra. A Aids e a dependência química são fantasmas no arranjo familiar que passa a acolher a moça.
Uma das cineastas de maior prestígio do Velho Mundo hoje, a catalã Isabel Coixet é outra voz autoral da Espanha que ecoa neste Festival do Rio. Ela integra o evento com o drama "Três Despedidas", rodado na Itália. Nele, tudo parte do que parece ser uma briga trivial entre Marta (Alba Rohrwacher) e Antonio (Elio Germano). O casal termina a relação, na fricção do ressentimento. A reação de Marta é se fechar em si mesma e ficar fora do mundo. A única coisa que ela não consegue ignorar é sua perda brusca de apetite.
O Festival do Rio segue até domingo. No próximo dia 15, a Espanha vai abrir a Mostra de São Paulo com "Sirat", do galego Oliver Laxe.