Por: Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

O flamingo alça seu voo carioca

O diretor Diego Céspedes e o ator Matías Catalán no Armazém da Utopia | Foto: Rodrigo Fonseca

Diretor e ator da produção chilena premiada em Cannes discutem aceitação numa América Latina assolada pela transfobia

Vencedor do Prix Un Certain Regard de Cannes, o contagiante drama de CEP chileno "O Olhar Misterioso do Flamingo" ("La Misteriosa Mirada Del Flamenco"), de Diego Céspedes, hoje dispara na procura do público, na venda de ingressos da Prrmière Latina do Festival do Rio, de onde há de sair como um hit. Tem mais uma sessão dele no domingo, 12/10 (que será a data de encerramento da maratona carioca), 21h, no Estação NET Gávea. O evento acolheu Céspedes e o ator Matias Catalán, estrela n.1 dessa produção, que foi um acontecimento na Croisette em maio e vai representar seu país no Oscar. Filas gigantes se formaram nas projeções dessa reconstituição histórica da vida no norte do Chile no início dos anos 1980, numa área de mineração na qual um cabaré de mulheres trans e travestis enfrenta o boom da Aids sob a fúria da população masculina de trabalhadores.

"Como a organização da sociedade é desconectada dos afetos e dos desejos, a raiz de todo conflito de gênero é o medo e dele nasce o ódio", diz Céspedes num encontro com o Correio da Manhã no Armazém da Utopia, a sede do Festival, no Cais do Porto.

"Todo confronto no nosso filme se resolve pelo amor, inclusive o materno, no momento em que Flamingo assume um papel protetor, de mãe", complementava Matias, ao lado do diretor.

Tudo no longa-metragem deles é visto pelos olhos de uma menina, Lidia (Tamara Cortes), tratada como filha pela performer Flamingo (papel de Matías), alvo de transfobia. Na trama, o contágio do HIV é tratado com misticismo, numa crença de que a "peste" se espalha pela troca de olhares.

"A menção explícita que o filme faz aos anos 1980 é curta e rápida, pois conversei com a equipe, na fotografia e na direção de arte, para que o tempo não ficasse tão marcado, a fim de mostrar que a violência contra trans hoje cresce tanto como na época em que o enredo se passa, sobretudo na América Latina", diz Céspedes, que vê "O Olhar Misterioso do Flamingo" se tornar um ímã de plateias por onde passa. "Não sei se somos representativos da imagem padrão do cinema chileno, pois nos vinculamos com uma linhagem que traz novos rostos vindos de classes sociais mais pobres, como eu. É um Chile mais cotidiano".