Por Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã
Alçado à categoria de ator de prestígio (por sua disposição para o risco) com "Bicho de Sete Cabeças", 25 anos atrás, Rodrigo Junqueira Reis Santoro vai a Gramado, na Serra Gaúcha, esta noite, rever seu histórico de lutas. Muitas foram travadas aqui dentro, em filmes cercados de culto, como "Carandiru" (2003) e "Heleno" (2012). Outras, ele lutou lá fora, na Hollywood que lhe deu a coroa do persa Xerxes, em "300" (2007), e em produções da Argentina ("Leonera") e de Cuba ("Um Tradutor") nas quais atuou. Cada qual tem sua relevância num currículo que traz parcerias com cineastas do naipe autoral de Laís Bodanzky, Steven Soderbergh, Luiz Fernando Carvalho, Roland Joffé, Philip Kaufman, David Mamet, Patricia Riggen, Walter Lima Jr., Hector Babenco, Daniel Filho, Carlos Saldanha, Marão, Fernando Meirelles...
A lista é longa e ainda não incluiu o que ele fez na TV, no exterior, como "Lost" e "Westworld". À luz dos Pampas, prestes a completar 50 anos, Santoro vai receber esta noite o Kikito de Cristal, honraria inaugurada há 18 anos para reverenciar artistas aptos a levar a América Latina para além de suas fronteiras.
Na mesma ocasião, um de seus trabalhos mais recentes, "O Último Azul", dirigido por Gabriel Mascaro, será exibido em projeção hors-concours, como atração de abre-alas da maratona cinéfila mais popular deste país, que engata, a partir de sábado, a seleção competitiva de sua 53ª edição.
Com o mesmo diapasão sensorial que rodou "Boi Neon" (2015) e "Divino Amor" (2019), Mascaro fez Santoro se embrenhar pela Amazônia em "O Último Azul", que ganhou o Grande Prêmio do Júri da Berlinale. A produção ganhou ainda a láurea do Júri Ecumênico de Berlim e o Prêmio dos Leitores do Berliner Morgenpost. Essa belíssima distopia contra o etarismo entra em circuito no dia 28.
O Festival de Gramado será sua pré-estreia nacional. Sua protagonista é Tereza (Denise Weinberg, em atuação estonteante), funcionária septuagenária de um curtume de jacarés, em terreno amazônico, que se vê forçada a migrar para um campo de concentração para cabeças grisalhas. A recusa de ser isolada num retiro obrigatório, imposto pelo governo a quem tem 70 , faz com que ela engate numa jornada rio acima. Tereza (papel de Denise) conta com a ajuda de barqueiro de coração quebrado para cruzar a geografia fluvial amazonense, ouvindo dele segredos sobre o caracol da baba azul, um visco que abre portas da percepção. Esse homem das águas é um devir Oxum de Santoro. Nesta entrevista, ele fala de escolhas.
Você recebeu o troféu Cidade de Gramado, uns onze anos atrás, pela força estética da sua participação nas telas e, agora, uma década depois, regressa para ganhar o Kikito de Cristal, com um filme que celebra a força amazônica. O que te leva a dizer "sim" para um roteiro como o de "O Último Azul"?
Rodrigo Santoro: O que me levou a dizer "sim" foi a mesma razão que me levou a dizer "sim" para "Bicho de Sete Cabeças": uma grande história, com um tema urgente a ser discutido, personagens com profundidade e muito talento envolvido no processo. Quanto a Gramado, tô feliz em retornar, tenho um carinho muito especial pelo festival.
O que a floresta te deu de mais bonito nesse universo de Gabriel Mascaro?
A floresta é professora. Aprendi tanto. Cheguei da cidade totalmente fora da sintonia. Aos poucos, fui sintonizando com o tempo e o espaço daquele lugar. Quando percebi, já estava conectado, escutando os sons da mata nos Igarapés.
O cinema brasileiro vive um tempo de fartura nos festivais estrangeiros, mas sonha se manter forte em circuito. De que maneira a chegada de um filme como "O Último Azul" pode nos aproximar das telas e pode aproximar o Brasil do Norte, da Amazônia?
"O Último Azul" tem encantado muita gente por onde passou. É um filme bonito, que fala de um tema importante e de fácil identificação. O público está orgulhoso do cinema brasileiro. O Brasil sempre foi reconhecido pelo futebol, as belezas naturais e, agora, estamos sendo mundialmente reconhecidos pela nossa arte. Tomara que esse orgulho se transforme em presença nas salas para que ele continue existindo e contando nossas histórias.
Você será visto, em breve, em "O Filho De Mil Homens" e "Corrida dos Bichos". O que você tem para filmar nos próximos meses?
Estou filmando "BR-70: A Saga do Tri", uma série para a Netflix.