Por: Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

A imagem que fica: Rithy Pahn preside o júri do Festival de Locarno

O realizador cambojano Rithy Pahn terá como missão avaliar os 18 filmes da competição oficial do Festival de Locarno, que tem início nesta quinta-feira (7) | Foto: Divulgação

 

Com a tarefa de assistir e julgar os 18 longas-metragens das partes mais variadas do mundo - entre os quais a produção Romênia/Brasil "Drácula", de Radu Jude - da competição oficial do 78° Festival de Locarno, o cineasta cambojano Rithy Pahn preside o júri do evento suíço guiado por uma inquietude:

"Há muita informação hoje nas telas, mas pouca contemplação, algo que se estabelece quando a dimensão crítica do cinema se faz presente, no questionamento da intolerância".

Essa foi a resposta dele ao Correio da Manhã, na Berlinale de 2022, ao ganhar o Prêmio de Contribuição Artística por "Tudo Vai Dar Certo", exibido aqui no festival É Tudo Verdade. Trata-se de um ensaio com uma porção fabular, na qual animais escravizaram os seres humanos e conquistaram o mundo. A partir dessa premissa fantásticas, Panh perseguia sua trilha de diretor autor habitual ao falar de um de seus fetiches: o apagamento da memória. A destruição de monumentos históricos está sempre em seu radar. O assunto rendeu-lhe uma indicação ao Oscar por "A Imagem Que Falta", com o qual ganhou o Prêmio Un Certain Regard de Cannes em 2013. Essa apreensão vai navegar pelos títulos escalados para Locarno, como o esperado "With Hasan in Gaza", de Kamal Aljafari. Para analisa-los e escolher qual receberá o Leopardo de Ouro de 2025, Rithy conta com um time de respeito: a produtora americana Joslyn Barnes; as atrizes Ursina Lardi (suíça) e Renée Soutendijk (holandesa); e o diretor mexicano Carlos Reygadas.

Em janeiro, Rithy mobilizou o circuito brasileiro com "Encontro com o Ditador" ("Rendez-vous Avec Pol Pot"), hoje na grade do streaming Amazon Prime. Ali se encontra uma parte sangrenta do passado de seu país.

"O Mal e a Esperança se alternam nesta narrativa a fim de devolver a imagens do passado uma dimensão poética", disse o realizador de 61 anos.

Inspirada no livro "When the War Was Over: Cambodia and the Khmer Rouge Revolution", de Elizabeth Becker, o longa-metragem acompanha o empenho de um grupo de jornalistas franceses para conduzir uma entrevista exclusiva com o líder Pol Pot (1925-1998). Tudo parece tranquilo, mas o regime político dele está em declínio e a guerra contra o Vietnã ameaça o país de uma invasão. Procurando culpados, o governo comete secretamente um genocídio. Com ele, o ideal de harmonia buscado por Pot é destruída perante os olhos do time de repórteres, revelando o horror. O trio que trabalha em prol da notícia é vivido por Irène Jacob, Cyril Gueï e Grégoire Colin.

"Meus filmes buscam criar, a partir do som, um desenho sensorial que potencialize registros de dor", disse Rithy, quando exibiu "Encontro com o Ditador" pela primeira vez, em maio, em Cannes, em 2024, fora da disputa pela Palma de Ouro.

Ele também foi um sobrevivente dos massacres perpetrados pelo Khmer Vermelho, que contabilizou quase 2 milhões de mortos em uma população de 7 milhões de pessoas. Com a ajuda da Cruz Vermelha, o cineasta chegou à França em 1979, com quinze anos, sonhando aprender uma nova língua e um novo ofício. No colégio, realizou um pequeno filme cômico em super-8, que impressionou seus professores. Descobriu ali vocação que o levaria a se graduar no IDHEC (Instituto dos Altos Estudos Cinematográficos, Paris).

"Quando eu cheguei na França, vim do Camboja cheio de histórias para contar, mas não havia interlocução. Quem quereria ouvir um estrangeiro falar de estratégias de sobrevivência? Foi nesse momento que, a partir do cinema de Godard, Alain Resnais e de Souleymane Cissé, eu encontrei um modo de expressão a partir de filmes que reagem indo na margem oposta ao imediatismo do cinema comercial".

Nesta quinta, Locarno se mobiliza em torno de mais um show de atuação de Willem Dafoe, que passa pela telona da Piazza Grande, em sessão hors-concours, com "The Birthday Party", de Miguel Ángel Jiménez. Sua trama se passa no final da década de 1970, em algum lugar do Mediterrâneo, onde Marcos Timoleon (Dafoe), um magnata parecido com Aristóteles Onassis, está dando uma festa de aniversário extravagante para sua filha Sofia (sua única herdeira), numa ilha particular exclusiva. A celebração é a desculpa perfeita para várias pessoas se aproximarem dele.

A programação do festival se estende até o dia 16. O encerramento fica por conta da nova versão (agora musical) de "O Beijo da Mulher Aranha", o livro de Manuel Puig (1932-1990), que inspirou um dos maiores êxitos do diretor Hector Babenco (1946-2016), em 1985. Jennifer Lopez encarna o papel que foi de Sonia Braga. O longa, dirigido por Bill Condon, tem Diego Luna e Tonatiuh nos papéis que foram de Raúl Julia (1940-1994) e William Hurt (1950-2022), que ganhou o Oscar pela versão de Babenco, interpretando o decorador Molina.