Por: Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

Marco Altberg: 'A sala de cinemaé a tela nobre'

Marco Altberg | Foto: Rodrigo Fonseca

É sempre importante ouvir o que Marco Altberg tem a sugerir, não apenas nas dicas de filmes e séries que ele transmite em seu canal, o Like, mas também nas reflexões que faz acerca da luta política do cinema brasileiro em relação a hegemonias estrangeiras e a falta de regras no trato com as plataformas internacionais de streaming.

Como seu trabalho como produtor é intenso, por vezes as pessoas esquecem que o tanto de lúcido - e de poético - que ele tem a agregar, em suas palestras e ações, estende-se ainda a seus exercícios autorais como realizador. "Prova de Fogo" (1980), "Aventuras de um Paraíba" (1982) e "Fonte da Saudade" (1986) são pérolas ali da década de 1980 com foco nas alianças possíveis que nosso povo faz para resistir. Alianças com o Divino, com os ditames financeiros e com a solidão. Ele as filma com graça.

No fim de julho, com o compromisso de esquadrinhar o modelo de sustentação da produção de filmes num papo no festival Bonito Cine Sur, Altberg levou para o evento - numa seleção feita sob a curadoria da pesquisadora Elis Regina - um documentário que dirigiu com Tainá De Luccas: "Kopenawa, Sonhar a Terra-Floresta". Ancestralidades variadas mobilizam o longa-metragem, que nos lembra da artesania delicada em seu olhar na hora de gritar "Ação!" e "Corta!". O papo a seguir funde o executivo de TV, o diretor e o produtor que ele é num amalgama inquieto.

Depois de exibir um documentário sobre Davi Kopenawa Yanomami em festivais, como você avalia o lugar das salas de exibição na economia do audiovisual?

Marco Altberg: A sala ainda é a tela nobre, aquela que legitima estéticas. Apesar dos baques no circuito, pela invasão estrangeira e pela ausência de regulação dos streamings, o cinema se mantém, como pode. A voracidade das novas mídias é perversa. Cresceu com a pandemia. No Brasil, contudo, nosso problema maior é a ausência de política industrial.

Apesar dessa carência, seu novo filme, dirigido com Tainá De Luccas, tem alcançado janelas - e elogios - com seu olhar sobre as lutas indígenas. Que aprendizado veio de Kopenawa?

Com ele, a gente aprende a fazer arte ligada à Natureza, na qual ele é o narrador de si mesmo. A gente conhece vários mitos da Europa, mas desconhece a realidade dos povos originários. Queria levar às telas, com a Tainá, um filme que fizesse as pessoas saírem da sala informadas e entretidas.

Você tem uma carreira prolífica como produtor, mas nunca arredou pé da direção. De que maneira a aposta em dirigir amplia e refina seu conhecimento na produção?

Marco Altberg: Filmes deveriam sempre ser o resultado da fricção criativa entre cineastas e produtores. Minha origem profissional é na direção. Em 1971, moleque ainda, eu dirigi um curta chamado "Pra Início De Conversa" para o extinto Festival JB. Fui assistente do Cacá Diegues, do Paulo Cezar Saraceni, do Joaquim Pedro de Andrade, do Geraldo Sarno. A condição econômica do cinema brasileiro impôs a diretores como eles - todos artistas incríveis - a serem produtores também. Copiamos, de certa forma, o modelo francês em que o diretor assume o papel de produzir também. Como eu sou diretor, ao produzir, acrescento a esse trabalho aquilo que o set me ensina. Para ser produtor no Brasil, é preciso sangue-frio.

Qual é a filosofia de um canal com o Like?

É indicar, 24 horas por dia, o que você pode assistir de bacana, no cinema, nas plataformas, na TV. Como diz a nossa chamada: "A gente recomenda e você curte". Mesmo se você considerar o cabo como uma mídia em queda, hoje, no mundo, o Like tem uma audiência importante hoje na Claro e direciona o público para muitas descobertas, com uma equipe de que eu me orgulho muito. Ele nasceu como decorrência do programa "Revista do Cinema Brasileiro", em que eu somei quase dez mil horas de memórias da produção nacional. Foram mil programas, que começaram nos anos 1990, com a Retomada, e foram descontinuados na Era Temer.

Que novos projetos estão a caminho?

Estou dirigindo um documentário sobre o cantor Ivan Lins e vou produzir um longa sobre o Zeca Pagodinho, de ficção, com o Silvio Guindane na direção.quinta