Mesmo lançados no ano passado, 'Ainda Estou Aqui' e o 'O Auto da Compadecida 2' seguiram em cartaz 2025 adentro levando os brasileiros às salas de exibição | Foto: Adrian Tejido/Divulgação
O audiovisual brasileiro brasileiro vive um momento de efervescência que se reflete diretamente nos números da bilheteria nacional. O circuito exibidor do país registrou seu melhor desempenho desde 2019 nos primeiros seis meses de 2025, com uma arrecadação superior a R$ 1,2 bilhão e a venda de 61,2 milhões de ingressos. Os dados, compilados pelo site Filme B, revelam um crescimento expressivo de 12% na renda e 8% no público em comparação ao mesmo período de 2024.
Mesmo estreando no fim de 2024, o oscarizado "Ainda Estou Aqui", de Walter Salles, e "O Auto da Compadecida 2", de Guel Arraes e Flávia Lacerda, seguiram em cartaz 2025 adentro levando multidões às salas de exibição.
Os números não mentem. As produções brasileiras registraram um salto de 16,3% no número de espectadores, totalizando 9,1 milhões de pessoas nas salas de cinema, enquanto a renda cresceu 15,9%, alcançando R$ 172 milhões. Este desempenho permitiu que os filmes nacionais conquistassem quase 15% da fatia do mercado no semestre, um indicador que demonstra a crescente aceitação do nosso público às narrativas produzidas no país. O brasileiro começa a se ver no cinema.
Diversidade nas telas
Homem com H | Foto: Divulgação Paris Filmes
A diversidade temática e de gêneros sempre foi a receita de nosso cinema e esta receita agora é também de sucesso. Só neste semestre "Chico Bento e a Goiabeira Maraviosa", de Fernando Fraiha, trouxe para as telas a nostalgia dos quadrinhos de Mauricio de Sousa, conquistando diferentes gerações de espectadores.
Chico Bento e a Goiabeira Maraviosa | Foto: Fabio Braga/Pivô Audiovisual
Inspirado numa história real, "Vitória", de Andrucha Waddington e Breno Silveira, explorou uma narrativa dramática, impulsionada pelo talento de Fernanda Montenegro.
Vitória | Foto: Suzanna Tierie/Divulgação
"Homem com H", de Esmir Filho, ultrapassou a barreira os títulos com temática LGBTQIAPN ao apresentar a cinebiografia de Ney Matogrosso, um dos maiores cantores da MPB, oferecendo ao público uma imersão na trajetória artística e pessoal deste fenômeno da canção popular.
Homem com H | Foto: Divulgação Paris Filmes
Esta variedade de abordagens demonstra a vocação de nossos realizadores em explorar diferentes universos narrativos.
A infraestrutura do setor também apresenta sinais de crescimento. O número de salas de cinema no país aumentou de 3.410 em 2024 para 3.484 nos primeiros meses de 2025, representando um crescimento de 2,2%. Esta expansão indica não apenas a recuperação do mercado após os impactos da pandemia, mas também a confiança dos exibidores no potencial de crescimento do setor.
Estima-se que a coqueluche verde e amarela do segundo semestre seja "O Agente Secreto", de Kleber Mendonça Filho, que ganhou os troféus de Melhor Direção e Interpretação no Festival de Cannes, com Wagner Moura em estado de graça. Esse lançamento fica lá pra Oscar season, em 6 de novembro.
Vencedor do Grande Prêmio do Júri da Berlinale, "O Último Azul", de Gabriel Mascaro, abre o Festival de Gramado, no dia 13 de agosto e estreia 15 dias depois, com Denise Weinberg em atuação luminosa. Num Brasil distópico em que pessoas 70 são condenadas a isolamento em um campo de concentração, sua personagem central, Tereza, sobe rio acima, nos afluentes do Amazonas, em busca de liberdade. Rodrigo Santoro é seu barqueiro.
Agosto está logo ali, ok, mas, antes, neste julho que está para começar, uma pedida quente é "Um Lobo Entre os Cisnes", de Helena Varvaki e Marcos Schechtman. Sua trama revive a cruzada de consagração de Thiago Soares, um garoto do subúrbio carioca que deixa para trás o hip hop e embarca no mundo do balé clássico. O dançarino cubano Dino Carrera vira seu mentor e conduz seus passos para a glória.
No dia 21 de agosto, "Enforcados", de Fernando Coimbra, põe Leandra Leal e Irandhir Santos em rota de colisão com a máfia do Bicho no Rio. Na mesma data, Edmilson Filho brinca de 007 em "CIC - Central de Inteligência Cearense", a fim de salvar a comédia da mesmice.
Em 4 de setembro, nossa produção documental bate cabeça para os orixás com "3 Obás de Xangô", de Sérgio Machado, deu um banho de descarrego na Première ao relembrar a amizade entre o compositor Dorival Caymmi, o best-seller Jorge Amado e o artista plástico Caribé, uma trinca de orixás da Bahia.
Esse 4/9 terá outra bênção das ancestralidades africanas: é a data em que "Malês", de Antônio Pitanga, entra em cartaz. Com base num enredo de Manuela Dias (autora da nova versão da novela "Vale Tudo") produzido por Flávio R. Tambellini, esse épico recria a Bahia do século XIX, em meados de 1830. Na ocasião, uma rebelião começou a ser arquitetada por africanos muçulmanos, chamados de malês.
Campeão de bilheteria na década passada, Leandro Hassum promete o que pode ser seu melhor trabalho de interpretação em "Silvio Santos Vem Aí", que a diretora Cris D'Amato lança em 31 de outubro. A produção relembra os tempos em que o Homem do Carnê do Baú sonhou ser presidente da República.
Para 11 dezembro, multiplexes de todo o país terão um réquiem para prestar a Cacá Diegues (1940-2025), que nos deixou em fevereiro, com a projeção de "Deus Ainda É Brasileiro", que foi rodado em Alagoas, em 2022. Antonio Fagundes volta ao papel do Todo-Poderoso na parte dois do longa de 2003, que vendeu 1,6 milhão de bilhetes num ano de pico para a Retomada. O termo é usado para a fase compreendida entre 1995 e 2010, em que o país voltou a produzir longas depois de um hiato imposto pelo sucateamento da Embrafilme, a distribuidora criada em 1970. Seu marco zero foi "Carlota Joaquina, A Princesa do Brasil", de Carla Camurati, que volta ao circuito no dia 14/8 para comemorar seus 30 anos. Três décadas atrás, essa fita botou 1,2 milhão de pessoas para ver filmes com o Brasil no DNA. Pode repetir o feito de mobilizar multidões agora, em seu regresso.
O momento atual do cinema brasileiro reflete uma conjunção de fatores favoráveis, a começar pela crescente evolução técnica de nossas produções, que vêm conquistando, ano a ano, maior prestígio no circuito internacional de festivais.
Mas nada disso seria possível em que o público brasileiro se identificasse com cada história contada, afinal estamos tratando de uma arte brasileira feita e pensada para o público brasileiro.