Múltiplos concorrentes ao Oscar passaram pela Berlinale, ao longo de sete décadas e meia de história do festival alemão em busca de notabilidade ao olhos da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, como "Rain Man" (1988), "Em Nome do Pai" (1994), "Além da Linha Vermelha" (1998) e "A Separação" (2011) - todos coroados com o Urso de Ouro. Há cults que foram premiados na maratona cinéfila germânica e saíram de lá cheios de prestígio, em busca das estatuetas douradas hollywoodianas, como "O Silêncio dos Inocentes" (1991), nosso "Central do Brasil" (1998) e "Uma Mulher Fantástica" (2017).
Nos últimos dois anos, mestres que foram indicados pela Academia ganharam prêmios honorários do festival berlinense, como Steven Spielberg (enquanto badalava "Os Fablemans") e Martin Scorsese (quando estava no páreo estadunidense com "Assassinos da Lua das Flores"). Houve espaço no Berlinale Palast também para "Vice" (em 2019) e "Tár" (em 2023), em projeções hors-concours.
O oscarizável a ser abraçado pelo evento esta vez é "Um Completo Desconhecido" ("A Complete Unknown"), a cinebiografia do cantor, compositor e prêmio Nobel Bob Dylan. Sua estreia no Brasil está marcada para o dia 27.
No dia 2 de março, seu diretor, James Mangold, leva seu elenco e sua equipe para esperar as deliberações das/os votantes da Academia no Dolby Theatre, em Los Angeles, com chances de levar oito Oscars para casa. É na categoria Melhor Ator que o longa tem mais chances, à força de um desempenho arrebatador de Timothée Chalamet. Nesta sexta, a Berlinale confere como se sai no papel do bardo folk.
"Esse filme fala sobre os anos de gênese da poética de Dylan e eu tive confiança para entrar nesse universo pela experiência que James Mangold tem em biopics", disse Chalamet numa Zoom promovida pela Searchlight Pictures, na presença do Correio da Manhã, a quem falou sobre a resiliência do músico em não se adaptar a modismos da indústria fonográfica mesmo quando ainda era um aspirante a artista. "Eu não chamaria Dylan de herói, mas enxergo nele uma figura que confia em seus instintos".
Dono de um currículo invejável (e pluralíssimo), Mangold é um realizador que vai de "Ford vs. Ferrari" (2019) a "Indiana Jones e a Relíquia do Destino" (2023) com a mesma desenvoltura. É o responsável por um banho de loja em Sylvester Stallone, a quem dirigiu em "CopLand", em 1997. Fez ainda "Garota, Interrompida", que rendeu o Oscar de coadjuvante a Angelina Jolie em 2000. Cinco anos depois, ele dirigiu Reese Whiterspoon no sucesso de público que lhe oscarizou: "Johnny & June" (2005), também centrado no universo das gravadoras, falando do casal de aves canoras June Carter (1929-2003) e Johnny Cash (1932-2003). Aliás, Cash faz uma participação em "Um Completo Desconhecido", interpretado pelo habitual parceiro do cineasta, Boyd Holbrook. Uma série de vocalistas e instrumentistas são citados na trama do livro "Dylan Goes Electric!", de Elijah Wald. O ás do violão Pete Seeger (1919-2014) é um deles. O papel é encarnado por um Edward Norton em estado de graça.
Existe um pavimento romântico potente no longa que envolve a relação de Dylan com a cantora e compositora Joan Baez. O desempenho de Monica Barbaro, ao revivê-la, comoveu espectadores nos Estados Unidos (onde a produção estreou no Natal) e tem arrebatado a crítica. Ela também concorre ao Oscar, como Atriz Coadjuvante. Seu recorte acompanha o momento em que a ativista iniciou seu flerte entre a música e a reflexão social. É a partir do engajamento dela que o trânsito de Dylan pela cena folk adquire contornos de combatividade. "Baez é uma personalidade que buscou na autoria de suas canções um meio de expressar seus pontos de vista e compartilhar sua voz pessoal", diz Barbaro, que atraiu atenções em "Top Gun: Maverick" e na série "Fubar", da Netflix, ao lado de Arnold Schwarzenegger. "Eu mergulhei em referências documentais na minha pesquisa para entender como Joan foi construindo uma expressão própria numa época em que a música forjava comunidades".
A Berlinale 2025 termina no dia 23 de fevereiro.