Por: Silas Martí e André Fontenelle (Folhapress)*

Morre, aos 81 anos, Sebastião Salgado, o maior fotógrafo brasileiro

O fotógrafo Sebastião Salgado em exposição de parte de sua obra realizada em 2022 | Foto: Drew Forsyth/Divulgação

Sebastião Salgado, um dos maiores fotógrafos do mundo, morreu nesta sexta-feira (23) em Paris. A causa da morte ainda não havia sido divulgada até o final da tarde, pelo horário da França. Salgado, de 81 anos, sofria de problemas de saúde crônicos relacionados à malária, doença que contraiu nos anos 1990. 

Neste sábado (24), o artista participaria do vernissage de vitrais desenhados pelo filho Rodrigo, que tem síndrome de Down, para uma igreja na cidade de Reims. Na véspera, Salgado havia cancelado sua presença em um encontro para jornalistas também em Reims, alegando problemas de saúde.

A reportagem esteve com Salgado há um mês, para entrevistá-lo sobre os vitrais de Rodrigo. Na ocasião, ele disse que vinha fazendo um novo tratamento, que lhe dera mais energia. "Minhas fotos talvez sobrevivam cem anos, mas os vitrais dele vão ficar por milhares de anos", disse Salgado na ocasião.

O fotógrafo se consagrou no final dos anos 1980 com uma série de imagens em preto e branco de Serra Pelada, local de mineração de ouro na Amazônia que atraiu 50 mil trabalhadores que acalentavam o sonho de ficar ricos. Suas fotos davam a impressão de que o garimpo era um formigueiro humano.

Fotógrafo documental e fotojornalista, Sebastião Ribeiro Salgado Júnior nasceu em 1944 na pequena Aimorés, no interior de Minas Gerais. Um humanista, ele dedicou seu olhar às injustiças do mundo, tendo fotografado a mineração e levantes sociais, como a Revolução dos Cravos, em Portugal. Também ficou conhecido como um dos principais defensores da preservação ambiental com suas fotografias da Amazônia.

Em 1996, as lentes de Salgado testemunharam uma das maiores ocupações na história do MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra. O resultado foi o celebrado livro "Terra", editado pela Companhia das Letras, que contou com prefácio do português José Saramago e músicas de Chico Buarque.

"O Brasil perdeu hoje um dos maiores nomes do fotojornalismo de todos os tempos. Mestre dos mestres, deixa um legado gigantesco, não só na fotografia, mas no trabalho magnífico de reflorestamento que realizou em Minas, no cuidado com o meio ambiente e na maneira poética com que denunciou, através de suas lentes, a forma desumana como são tratados os trabalhadores mundo afora. A luz do planeta está menos cintilante com sua partida", declarou o fotógrafo Carlos Moneiro, colunista do Correio da Manhã.

Para o editor Luiz Schwarcz, publisher da Companhia das Letras, a morte de Salgado representa uma "grande perda". "Era um perfeccionista, realmente. Além da amplitude, era muito preocupado com aspectos gráficos."

Em 2024, o fotógrafo deu uma entrevista à revista GQ falando sobre a morte. Na ocasião, Salgado desmentiu boatos sobre aposentadoria depois de uma entrevista ao jornal The Guardian. "Não falei que pararia de trabalhar, só que, aos 80, você atinge uma liberdade inimaginável. O que vier pela frente é lucro", disse à revista.

Salgado lembrou que "está mais próximo da morte". "As pessoas vivem, quando muito, até os 90, e estou mais próximo da morte (...) Não me engajaria em um projeto que se arrastasse por seis ou sete anos, porque possivelmente não teria como concluí-lo."

O artista esclareceu ainda que a iminência da morte não o assustava. "Eu estou vivo!", celebra. "Trabalhei quatro anos na Gamma (agência fotográfica francesa fundada em 1966), no fim da década de 1970. Éramos doze fotógrafos e quatro deles foram assassinados; já vi tanta gente morrer", observou.

Ele morava com a mulher, Lélia Salgado, e o Filho Rodrigo, em um apartamento em Paris, perto da Praça da Bastilha. O estúdio dele na cidade guarda um acervo com mais de 500 mil imagens.

O trabalho do fotógrafo está em destaque no centro Les Franciscaines, na comuna francesa de Deauville, em uma mostra aberta ao público até o dia 1º de junho de 2025. A exposição foi organizada em colaboração com a Maison Européenne de la Photographie, que possui mais de 400 obras do artista no acervo.

"Sebastião foi muito mais do que um dos maiores fotógrafos de nosso tempo. Ao lado de sua companheira de vida, Lélia Deluiz Wanick Salgado, semeou esperança onde havia devastação e fez florescer a ideia de que a restauração ambiental é também um gesto profundo de amor pela humanidade", disee o Instituto Terra em comunicado.

Mineiro, era o único homem, e o sexto, entre nove irmãs. Formado em Economia em Vitória, no Espírito Santo, e pós-graduado na Universidade de São Paulo (USP), trabalhou no Ministério da Economia em 1968.
Durante a ditadura militar, foi obrigado a exilar-se, indo morar em Paris (1969). Na capital francesa, ele fez doutorado em Economia, em 1971. No mesmo ano, começou a trabalhar na Organização Internacional do Café, como consultor no controle de plantações na África.

Foi estudando os cafezais africanos que descobriu as possibilidades da fotografia: melhor meio de retratar a realidade econômica do que textos e estatísticas. Retornando a Paris, em 1973, iniciou a vida como fotojornalista.

Suas primeiras reportagens foram sobre a seca na região africana de Sahel (faixa ao sul do Saara) de Níger e trabalhadores imigrantes na Europa. Em 1979, tornou-se membro da Magnum Photos, uma cooperativa de fotógrafos, fundada em 1947 por Robert Capa e Henri Cartier-Bresson, entre outros. Iniciou então a comovente série de fotografias documentais sobre camponeses na América Latina. O trabalho, que durou sete anos, resultou no livro Autres Ameriques (1986).

Em 1986, trabalhando para a Organização Humanitária Médicos sem Fronteiras, fotografou, durante 15 meses, os refugiados da seca e o trabalho dos médicos e enfermeiros voluntários na região africana de Sahel da Etiópia, Sudão, Chade e Mali, o que resultou no livro Sahel L'Homme en Détresse. A série Workers, sobre trabalhadores em escala mundial, realizada de 1987 a 1992, correu o mundo em exposição.

*Colaborou Affonso Nunes