Por: Affonso Nunes

Entre sonhos, corpos e territórios: Exposição no CCBB Rio reúne 160 obras de artistas negros do Brasil e dos EUA e reflete sobre a diáspora africana nas Américas

Mais de 100 artistas evocam a história negra em múltiplas linguagens e perspectivas na exposição 'Ancestral: Afro-Américas' | Foto: Divulgação

A ancestralidade como força criativa e política está no centro da exposição "Ancestral: Afro-Américas", em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro. Com direção artística de Marcello Dantas e curadoria de Ana Beatriz Almeida, a mostra apresenta cerca de 160 obras de artistas negros do Brasil e dos Estados Unidos, promovendo um diálogo crítico e poético entre as heranças afrodescendentes dos dois países. O elenco inclui nomes como Abdias Nascimento, Simone Leigh, Emanuel Araújo, Leonardo Drew, Sonia Gomes, Arthur Bispo do Rosário, entre outros.

A exposição ocupa as oito salas do primeiro andar do CCBB e traz também um núcleo de arte africana tradicional, com curadoria de Renato Araújo da Silva, e um conjunto de joias de crioula, adornos usados por mulheres negras libertas na Bahia colonial. Para Marcello Dantas, "'ancestral' é uma palavra compartilhada nas línguas portuguesa e inglesa — e essa origem comum é o ponto de partida para explorar uma arte que atravessa fronteiras geográficas e simbólicas".

A curadora Ana Beatriz Almeida destaca que a mostra foi guiada pelas reinvenções culturais feitas por comunidades negras nas Américas. "Selecionamos artistas que evocam essa invenção como ferramenta estética e existencial. A exposição é também sobre o 'tornar-se', sobre resistir e se reinventar."

Entre os destaques, há trabalhos inéditos de Gê Viana, Gabriella Marinho e da norte-americana Simone Leigh, além de uma obra criada no Brasil especialmente para a mostra por Nari Ward. A presença de artistas consagrados como Kara Walker, Julie Mehretu, Melvin Edwards, Rosana Paulino e Carrie Mae Weems reforça a amplitude da proposta.

Três núcleos e múltiplas linguagens

A exposição ocupa oito salas do primeiro andar do CCBB RJ | Foto: Divulgação

A exposição está organizada em três eixos temáticos — corpo, espaço e sonho — que estruturam as reflexões estéticas e políticas. No núcleo "corpo", as obras discutem a representação de pessoas negras como ato de resistência e afirmação. Estão reunidos artistas como Benny Andrews, Carlos Martiel e Dalton Paula, cujas obras abordam identidade, memória e representação cultural.

O segmento "espaço" examina questões de território, deslocamento e pertencimento. As instalações de Leonardo Drew, os trabalhos com tecidos de Sonia Gomes e as pinturas abstratas de Caroline Kent expandem o conceito de lugar. Neste núcleo também se destacam as joias de crioula, utilizadas como símbolos de emancipação e pertencimento cultural por mulheres negras no período colonial brasileiro.

No núcleo "sonho", a exposição investiga territórios da abstração, espiritualidade e imaginação. Obras de Simone Leigh, Kevin Beasley, Betye Saar e Sam Gilliam exploram formas, texturas e narrativas que sugerem novas possibilidades de existência. Leigh, por exemplo, reconfigura a experiência feminina negra a partir de uma perspectiva subjetiva e escultórica.

Além dos três eixos principais, "Ancestral: Afro-Américas" apresenta um núcleo de Arte Africana Tradicional, com peças de povos como os iorubás, fon, bijagós, baga, tchokwe, bakuba e bakongo, provenientes de países como Nigéria, Benim, Guiné-Bissau, Angola e República Democrática do Congo. Esses objetos, originalmente de uso espiritual ou social, são apresentados como testemunhos de uma continuidade cultural que sobreviveu às violências da escravidão e da diáspora.

SERVIÇO

ANCESTRAL: AFRO-AMÉRICAS

Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro (Rua Primeiro de Março, 66 - Centro)

Até 12/8, de quarta a segunda (9h às 20h)

Entrada gratuita, com retirada de ingressos pelo site ou na bilheteria