Por: Sérgio Nery*

O amadurecimento de João Fonseca e a confiança na jornada

João é o primeiro brasileiro a conquistar um troféu do nível ATP 500 | Foto: Reuters/Folhapress

O triunfo de João Fonseca na Basileia, Suíça, neste domingo (26) é daqueles momentos que parecem escritos com tintas de destino. Um brasileiro de apenas 19 anos, ergue seu primeiro troféu de ATP 500 na terra natal de Roger Federer, seu ídolo de infância. Mas, por trás da imagem simbólica, há um processo longo, feito de altos e baixos, que merece ser compreendido.

Desde a conquista em Buenos Aires, no ATP 250 de fevereiro, Fonseca viveu a oscilação natural de um jovem que encara pela primeira vez o circuito mais competitivo do esporte. Houve vitórias marcantes, como o triunfo sobre Stefanos Tsitsipas na Copa Davis, mas também derrotas precoces e semanas frustrantes. Nada fora do roteiro de um garoto em formação: na elite do tênis, cada detalhe físico, técnico e mental pesa. E é justamente aí que mora o aprendizado.

O carioca começou 2025 como 145º do ranking e, com a vitória avassaladora na final deste domingo sobre Alejandro Davidovich Fokina, saltou para o 28º lugar, entrando de vez no top 30 do tênis mundial.

Entre o ATP 250 e o título na Suíça, somam-se ainda conquistas em dois challengers (Canberra e Phoenix), degraus que reforçam a ideia de um crescimento consistente. Mais do que isso: de um trabalho coletivo iniciado cedo, aos 12 anos, quando conheceu o técnico Guilherme Teixeira.

Teixeira, mineiro de 37 anos, também dá seus primeiros passos no topo do tênis. Não é um “medalhão” e por isso virou alvo de críticas de quem pede um treinador mais renomado. Mas os resultados falam por si: junto do preparador físico Emmanuel Jiménez e do fisioterapeuta Egídio Magalhães Júnior, estruturou um projeto sólido que moldou não apenas o tênis agressivo de Fonseca, mas sua resiliência emocional. A academia “Yes Tennis”, fundada em 2022 e que hoje conta com 40 atletas, é fruto direto dessa evolução conjunta.

A semifinal na Basileia ilustra a relação de confiança entre treinador e atleta. Pressionado por Denis Shapovalov, Fonseca desabafou sobre as dificuldades no backhand adversário. Em 30 segundos de conversa, Teixeira ofereceu uma leitura objetiva e motivadora. O brasileiro voltou para quadra inflamado, abriu 4-1 e, logo depois, avançou. É um exemplo do quanto a conexão entre os dois vai além da técnica: é visão de jogo, confiança mútua e coragem em momentos decisivos.

O abraço emocionado após a final sintetiza esse elo. Fonseca não chegou até aqui sozinho — seu time e sua família, presentes na Suíça, são parte inseparável da conquista. E é justamente esse alicerce que dá segurança para seguir adiante.

Respeitar o processo é a grande lição. Primeiro os challengers, depois o ATP 250, agora o ATP 500. O próximo passo serão os Masters 1000 e, inevitavelmente, os Grand Slams. O tênis é imprevisível: as próximas conquistas podem vir rápido ou demorar. Mas o caminho está sendo pavimentado com consistência.

Independentemente do que acontecer no Masters 1000 de Paris, que começa nesta semana, a temporada de João Fonseca já é fantástica. O mais importante, neste momento, é a continuidade do trabalho. A evolução é surreal, mas não um acaso: é fruto de um projeto pensado, de uma equipe dedicada e da maturidade impressionante de um jovem que ousa sonhar grande.

João está hoje na posição em que deve estar. Por mérito próprio. Cabe ao Brasil, agora, torcer para que esse processo siga firme — e para que novos domingos de glória no tênis se multipliquem.

*Colunista do Correio da Manhã