O presidente Donald Trump estreou seu mandato, esse ano, com o anúncio de que o Canadá iria se tornar o 51º estado dos Estados Unidos. Suas informações de pesquisas canadenses e do partido da direita, eram que essa declaração facilitaria a vitória do partido de extrema direita canadense nas eleições parlamentares; bola fora! Venceu para o cargo de primeiro-ministro do Canadá Mark Carney, líder do Partido Liberal do Canadá, cujo viés é de centro no espectro político do país, e que fez, durante a campanha, duras críticas a essa loucura aventada por Trump.
Na semana passada, o governo da província de Ontário, no Canadá, postou um antigo vídeo em que Ronald Reagan, presidente dos EUA de janeiro de 1981 a janeiro de 1989, faz duras críticas às altas taxações impostas nas relações comerciais entre países. Indignado com a postagem, Trump anunciou elevar as tarifas aos produtos canadenses de 25% para 35%. Reagan é um ícone da direita americana e ídolo de Trump.
Além de fustigar o seu vizinho ao norte, Trump partiu pra dentro do vizinho ao sul, o México. Esbarrou com uma mulher de forte personalidade e estadista, a presidente Claudia Sheinbaum. Claudia já havia governado a Cidade do México, cargo equivalente ao de governador de estado, entre 2018 e 2023. Deu um forte "chega pra lá" no vizinho falcão. E Trump "baixou a bola" com o México.
Sob o pretexto do combate aos cartéis do tráfico de drogas, agrediu de maneira estúpida o presidente colombiano, Gustavo Petro, chamando-o de traficante, sem apresentar nenhuma prova contra o chefe de estado. Além de explodir barcos colombianos no Pacífico, supostamente de traficantes.
Tenho pavor de Maduro e de sua gangue. Desde Hugo Chaves, a Venezuela vive o caos. Um regime autoritário e que já levou ao êxodo de 8 milhões de venezuelanos na última década, segundo as Nações Unidas. Entretanto, nada justifica o ataque incessante às embarcações venezuelanas, explodindo-as, sem que ninguém saiba as identidades dos que se encontravam dentro dos barcos. Além dos Estados Unidos ter todo o aparato para abordar essas embarcações e realizar as prisões necessárias no caso de se confirmar como traficantes. Mas não. Explodem os barcos e divulgam os vídeos ao mundo, numa exibição bélica, cujo objetivo é intimidar os países latino-americanos. A exibição ganha ares de uma possível invasão à Venezuela com a presença de navios de guerra, milhares de militares e a chegada do maior porta-aviões do mundo, o Gerald Ford. Como assim? Não é possível que, porque o regime venezuelano é horroroso, a opinião pública internacional irá ser condescendente com tal abuso do governo norte-americano. E com as graves consequências de perdas de vida que isso pode gerar na Venezuela.
Trump recebeu o presidente argentino, Javier Milei, liberou 20 bilhões de dólares ao país, e condicionou as possíveis ajudas futuras à Argentina à vitória de seu aliado nas eleições parlamentares, realizadas ontem. Declaração de um déspota. Sem respeito nenhum às regras básicas da diplomacia internacional.
Por aqui não foi diferente. Constrangeu ministros do STF com retaliações vis. Além de membros do Ministério da Saúde. Foi extremamente grosseiro com o presidente Lula e implementou taxas altíssimas para uma lista de produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos. Deu com a cara na parede. Não contava ter o Brasil uma democracia sólida, com instituições fortes e uma sociedade comprometida com a democracia e a nossa soberania. Ontem, Trump e Lula tiveram seu primeiro encontro civilizado, na Malásia. Com suas respectivas equipes, o encontro durou 50 minutos e se abriram negociações em relação às absurdas tarifas impostas a produtos brasileiros, como café e carne, como também a revisão de sanções surreais a autoridades do judiciário e do executivo brasileiros.
Trump é tudo, menos um estadista à altura do poder e da representação que os Estados Unidos desempenham no mundo democrático. Desde 20 de janeiro se vê um animador de auditório que detém, naturalmente, a atenção midiática pelo tamanho norte-americano no mundo. Mas que de concreto pouco fez internamente, em seu país. Há ameaça inflacionária nos Estados Unidos, pelas altas tarifas impostas aos seus parceiros comerciais e, como decorrência, aumentos nos preços dos produtos consumidos pelo povo americano. "Tornar a América Grande Novamente" tinha um sentido claro, quando Ronald Reagan lançou o slogan. Época dos estertores da Guerra Fria, com o bloco autoritário comunista virando pó. Reagan e Margaret Thatcher lideraram, juntos com o Papa João Paulo II, a derrocada da União Soviética e seus países satélites.
Hoje, a realidade é outra. A China, com seu capitalismo de estado, se tornou o mais forte parceiro comercial de inúmeras nações no mundo. A América Latina, com todas as suas dificuldades, tem a maioria de seus países no sistema democrático, e não será no grito que Trump irá fortalecer os Estados Unidos na região.
*Jornalista. Instagram: @sergiocabral_filho