Por: Sérgio Cabral*

Não era Monty Python

Pete Hegseth anunciou diretivas que incluem o fim da cultura "woke" nas Forças Armadas | Foto: U.S. Secretary of Defense

Quando assisti aos discursos do Secretário de Defesa e do Presidente dos Estados Unidos para os principais oficiais norte-americanos das Forças Armadas do país, confesso que pensei estar num programa de tv ou num filme do Monty Python.

Monty Python foi um grupo britânico de humoristas extraordinários que fizeram um gigantesco sucesso do final dos anos 1960 até meados dos anos 1980. O non-sense, as bizarrices, o absurdo, tudo isso estava contido na turma do Monty Python. Fez e faz a cabeça de humoristas no mundo todo.

Mas não era o grande e criativo grupo de humoristas britânicos. Tratava-se do chefe da nação mais rica e poderosa do planeta e do seu Secretário de Defesa, ou guerra, como desejam os falcões caricatos.

Pete Hegseth anunciou diretivas que incluem o fim da cultura "woke" nas Forças Armadas. Woke é uma expressão para definir pessoas liberais, defensoras de direitos civis e sociais. E que, na última década, a extrema direita ironiza e desdenha. Ordenou padrões de "neutralidade de gênero" ou "nível masculino" para preparo físico — mencionou o sexo feminino como de papel menor nas Forças Armadas. Hegseth afirmou que não vai tolerar oficiais obesos. Defendeu as demissões que fez de oficiais de alto escalão, incluindo o ex-Chefe das Forças Armadas, Charles Q. Brown, que é negro, e Linda Fagan, a primeira mulher a chefiar uma das seis forças das Forças Armadas. Disse que "eles faziam parte de uma cultura falida".

Fico a imaginar os 800 oficiais do alto comando do país, experientes, com décadas de serviços prestados e, de repente, convocados de vários cantos dos Estados Unidos e do exterior, para assistir "àquilo". Após o besteirol de Pete Hegshet, o momento do clímax da chanchada, o presidente Donald Trump acessa o palco.

Trump disse que nunca havia estado diante de uma plateia tão silenciosa. Sem se tocar que, além da disciplina militar, ou talvez por causa dela, o silêncio era a melhor resposta às besteiradas que acabavam de ser ditas pelo seu Secretário. Após a gracinha sobre o silêncio dos oficiais, emendou com a pérola de que quer usar as cidades dos Estados Unidos como campos de treinamento para enfrentar "o inimigo interno". Quanta disciplina e ginástica facial os generais e almirantes norte-americanos devem ter exercitado após ouvir essa loucura. Desfiou ataques aos imigrantes, um assunto contumaz nos discursos de Trump. Exigiu "lealdade ideológica" dos oficiais. O culto à sua personalidade me faz lembrar gente como Josef Stálin e Adolf Hitler. Aliás, o palco e o auditório montados para o presidente e o seu auxiliar despejarem tanta baboseira me fez lembrar o conceito estético criado pelo famigerado Joseph Goebbels para Hitler.

Não, não era o grande grupo comediante Monty Python. Era um ex-apresentador de TV do canal Fox News, que se tornou popular pela sua verborragia bestial, ex-veterano de guerra, e que foi aprovado para o cargo de Secretário de Defesa do país, no Senado americano, por apenas 1 voto de diferença! 50 pela aprovação e 50 contra. Quem desempatou favoravelmente à Pete Hegshet foi o Vice-Presidente dos EUA, J.D. Vance, que pela Constituição, preside o Senado Federal.

Trump também teve seu programa de televisão, O Aprendiz, onde selecionava os concorrentes a uma vaga de emprego tratando-os grosseiramente. Fez sucesso. Sou testemunha ocular. Quando em roadshow em NY, pelo governo do Rio, estive com diversos empresários. Dentre eles, Donald Trump, com quem almocei na Trump Tower. Fiquei impressionado com a sua popularidade. O ano era 2011. Ele se elegeu em 2016 para o primeiro mandato.

Mas o fato é que o non-sense dos Python só nos fazia rir pela qualidade do humor e porque nos deixava mais leves para a vida. Já Trump e sua milícia, com seu non-sense de estupidez e ódio, pode provocar consequências gravíssimas para o povo americano e o planeta como um todo.

*Jornalista. Instagram:

@sergiocabral_filho