Por: Sérgio Cabral*

A chave é o poder local

TRE-RJ quer diminuir a influência de criminosos em zonas | Foto: Antonio Augusto/Ascom/TSE

Temos um dever de casa que há anos não conseguimos debatê-lo com a profundidade e a prioridade que ele merece: o modelo de representatividade nos parlamentos do Brasil.

Sou um profundo crítico do voto proporcional puro, adotado em nosso país. É chocante já na base da pirâmide da representação parlamentar ter um vereador da cidade do Rio tendo votos em Copacabana, zona sul da cidade, e Campo Grande, zona oeste carioca. Como a população pode acompanhar e cobrar esse político se ele não depende de uma determinada região para se eleger?

O mesmo vale para os deputados estaduais, que podem conquistar votos na cidade de Varre e Sai, no noroeste fluminense, e na Tijuca, zona norte da capital. E assim, também, o deputado federal.

Em dias de Brics, peço licença para pegar como exemplo os países do G7, os sete países democráticos mais ricos e desenvolvidos do mundo. O voto distrital puro é adotado em todos os países do grupo: Estados Unidos, Reino Unido, França, Canadá, Japão e Itália. Na Alemanha ele é distrital misto. O eleitor vota duas vezes: no seu território distrital e na lista do partido de sua preferência.

Veja que nos sete países mais desenvolvidos o poder local é a base da representação parlamentar. E assim também funciona a democracia representativa na Áustria, Bélgica, Holanda, Suécia, Dinamarca, Noruega, para citar países que alcançaram um padrão de vida muito superior ao nosso.

A chave é o poder local. Winston Churchill tinha que voltar ao distrito de Woodford, na Inglaterra, para se reeleger membro do parlamento inglês.

Aqui empacamos na discussão sobre a dispersão de gastos das emendas parlamentares que atendem às demandas das bases de cada parlamentar. E elas são dispersas. É raro encontrar no parlamento, seja ele municipal de médio ou grande porte, nos estados e na união, um parlamentar que tenha tido sua eleição concentrada em uma região específica. Assim ele distribui suas emendas de acordo com a pressão legítima da coletividade que o elegeu. Mas como teve votos em muitas cidades, ele não se conecta, muitas vezes, aos projetos mais coletivos e estruturantes da região. Ora, a culpa não é do parlamentar! O sistema de representatividade é que está distorcido. Se eu estou deputado federal pelo estado do Rio, e se tive votos dispersos em diversas cidades, vou fazer uso das emendas que atendam às bases que me elegeram. E assim o valor que o parlamentar dispõe é disperso. Podendo aplicar em qualquer região ou cidade do seu estado. Ao passo que o voto distrital aumenta o poder local na elaboração das emendas de interesse da coletividade, a população acompanha o desempenho do seu representante com mais precisão. Na França, o candidato precisa alcançar 50% mais um dos votos do distrito para ser eleito ao parlamento.

Não há modelo democrático perfeito. Mas penso que o aprimoramento da nossa democracia deve buscar a representatividade e o poder local obsessivamente. O poder local vai exigir melhor desempenho dos seus representantes, vai fortalecer os laços cívicos da região, naturalmente a população se organiza melhor e ganha mais força na luta por melhor qualidade de vida.

*Jornalista. Instagram: @sergiocabral_filho