O senador Renan Calheiros (MDB-AL) foi o principal artífice da tentativa de desarmamento privado do país. Em 2003, foi aprovado o Estatuto do Desarmamento, e muitas pessoas chegaram na época a entregar suas armas particulares. Mas em 2005 a questão foi levada à decisão da sociedade em um referendo. E o brasileiro decidiu na ocasião que tinha direito a ter as suas armas. Talvez o que tenha na ocasião derrubado o desarmamento foi uma falta de entendimento sobre o sentimento do cidadão. Ao contrário dos Estados Unidos, o brasileiro talvez não queira ter arma própria por um sentimento semelhante ao do norte-americano de que isso é seu direito individual. A razão aqui pode ser mais falta de confiança na capacidade do Estado.

O problema, porém, é que a questão do desarmamento gera mais dos "debates interditados", como diz o cientista político André Cesar, que há no Brasil a respeito do crescimento do crime organizado e da sensação de falta de segurança da população. Temas tabus.

Mantido o direito das armas, especialmente no governo Jair Bolsonaro, triplicou o registro de CACs (Caçadores, Atiradores e Colecionadores). Segundo o hoje presidente da Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Ricardo Capelli, seriam 800 mil.

Capelli, que foi secretário-executivo do Ministério da Justiça e interino do Gabinete de Segurança Institucional, diz que esse números de CACs é quase o dobro do efetivo total do Exército: 360 mil. E o número de queixas de Clubes de Tiro sobre roubos de armas tem aumentado significativamente. Há, portanto, uma suspeita de que boa parte da artilharia do crime se abastece por aí. Outro caminho, segundo Capelli, é a entrada de armas pela Tríplice Fronteira, vinda do Paraguai. A partir daí, dois "debates interditados". O primeiro quanto ao direito particular do armamento. O segundo, sobre o papel de cada ente da Federação.

Já durante o tempo em que foi ministro da Justiça, no governo Fernando Henrique Cardoso, Renan Calheiros já defendia a necessidade de nova repactuação da responsabilidade sobre segurança pública. Ele não falava em sistema único, como diz a PEC da Segurança.

A ideia de um Sistema Ùnico de Segurança foi proposta primeiramente por Raul Jungmann quando foi ministro da Segurança Pública no governo Michel Temer, entre 2018 e 2019. Sugere uma repactuação nos moldes do que existe no Sistema Único de Saúde (SUS).

Se armas entram pela Tríplice Fronteira e chegam na mão do crime, se parte dos que foram presos na operação nos Complexos do Alemão e da Penha eram oriundos de outros estados, fica evidente a necessidade de uma ação coordenada em nível nacional.

Um modelo tripartite, como o do SUS, que estabelecesse funções da União, dos estados e dos municípios. Para Renan, o tempo para uma discussão sobre isso é curto. Haverá agora ambiente, ou ele acabará contaminado pela proximidade do debate político-eleitoral?