Por: POR RUDOLFO LAGO

CORREIO POLÍTICO | Sorte do Brasil: militares às vezes não se entendem

Freire Gomes: Exército negou, Marinha topou | Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

O relator dos processos sobre os atos golpistas no Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, resolveu não incluir como prova as conversas do agente da Polícia Federal Wladimir Soares. A razão é lógica, do ponto de vista técnico: as conversas apareceram depois da denúncia do procurador-geral da República, Paulo Gonet. Então, não tinham sido incluídas como prova por ele. Moraes afirma que elas não acrescentam fato novo ao que já se sabia. É possível. Mas, mesmo não sendo prova a ser analisada, o que disse Soares certamente servirá para aprofundar as convicções pessoais dos ministros. Porque há ali um roteiro detalhado do que foi planejado, e que só não teria sido executado porque faltou o aval do ex-presidente Jair Bolsonaro.

 

Exército

Aval que faltou, segundo ainda o que relata o agente Soares, porque Bolsonaro "foi traído dentro do Exército". No relato de Soares, "os generais deram a última forma e disseram que não iam apoiar mais eles". Pelo raciocínio de Soares, "o PT" teria comprado esses generais.

Disputa

Para além dos delírios conspiratórios de quem conspirava, o que se sabe é que os comandantes militares divergiram sobre a proposta de golpe. Freire Gomes, do Exército, e Baptista Júnior, da Aeronáutica, não toparam. E houve só o apoio de Almir Garnier, da Marinha.

No auge da repressão, Forças Armadas também divergiram

Prédio onde funcionou o Doi-Codi de São Paulo | Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

O jornalista Eumano Silva é um dos maiores especialistas do país sobre o regime militar. Sobre a ditadura, escreveu, entre outros, "Araguaia - Os arquivos secretos da Guerrilha", em parceria com Taís Morais, vencedor do Prêmio Jabuti em 2006. No ano passado, Eumano publicou o volume 2 de "Longa Jornada até a Democracia - Os 100 anos do Partidão", que conta a história do Partido Comunista Brasileiro (PCB) de 1967 até o seu fim, quando se tornou o PPS e depois o atual Cidadania. Novamente, em muitos momentos Eumano mergulha em arquivos da ditadura . No caso, não somente para contar a perseguição aos comunistas.

Divisão

Eumano mostra que as Forças Armadas, em muitos momentos, entram numa disputa de vaidades, que provoca divisão. Um dos momentos detalhados em seu livro conta justamente como isso se deu quando os militares montaram suas ferramentas de repressão.

Codi

Após o famigerado Ato Institucional 5 (AI-5), a ditadura começou a estruturar seu aparelho de repressão com os novos poderes que recebia. Criou-se, então, o Centro de Operações de Defesa Interna (Codi). E a ideia de quem o idealizou era o comando do Exército.

Sarmento

O idealizador foi o general Syseno Sarmento. Que apresentou um modelo no qual os órgãos de informação das demais forças ficassem subordinadas ao Exército. Na época, a Marinha não aceitou esse modelo, e voltou-se contra ele, adiando as instalações dos Codis.

Marinha

A Marinha achava que tinha organismos melhores de inteligência que as demais forças. Defendeu ficar só na análise. Com isso, à época livrou-se do serviço sujo da tortura, que ficou com o Exército. Curioso é que, agora, quem teria evitado o serviço sujo foi o Exército.