Por: Fernando Molica

Aviso ao crime: golpe sai barato

Câmara aprovou redução de penas para golpistas | Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Ao aprovar a diminuição de penas para golpistas, a Câmara dos Deputados mandou um recado para organizações criminosas como o PCC e o CV: não percam tempo, dinheiro e vidas para conquistar alguns pedaços do território nacional, tentem um golpe de Estado. Se der certo, vocês levam o país inteiro; se der errado, mesmo seus líderes pegarão apenas dois anos e pouco de tranca, de regime fechado.

Um baita negócio: trata-se de um tempo de cadeia muito menor do que o que tem sido — merecidamente, vale frisar — cumprido por Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola (342 anos de cana), e Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar (309 anos). Fora que seria muito difícil que cúmplices da tentativa de virada de mesa institucional venham a ser mortos em operações policiais como a ocorrida nos complexos do Alemão e na Penha — 122 morreram nos confrontos.

Caso o golpe de Estado seja vencedor, os caras poderão fazer como todos os ditadores, inclusive aqueles que mandaram por aqui entre 1964 e 1985. Terão o direito de sequestrar, torturar, matar, roubar — e nada vai lhes acontecer. Ficarão com caminho livre para exercerem até mesmo o negócio de compra e venda de drogas ilegais.

Não haverá Judiciário, Ministério Público, imprensa, rede social, grupos de zap, tudo será controlado. Imagine, leitor, qual seria a atitude desses criminosos, aboletados no poder, se um detento, integrante da facção rival, requisitasse prisão domiciliar por sofrer crises de soluço. O que decidiriam os tribunais do tráfico diante dessa alegação?

Dá até para prever qual seria o laudo que, no caso, seria emitido por um médico sucessor do Amilcar Lobo, o tenente que indicava aos torturadores o quanto de pancada cada vítima seria capaz de aguentar. Nos porões, usava o codinome de "Dr. Cordeiro". Ninguém teria o direito de falar em direitos humanos, expressão, que segundo camiseta já mostrada por Jair Bolsonaro, representa o "esterco da vagabundagem".

No caso de ditaduras, o choque que se dá em Chico também se aplica em Francisco. Apesar da tradição golpista brasileira ser parceira da direita, não é impossível que haja uma ditadura de esquerda. Daí a necessidade de se estabelecer punições abrangentes e duras para os que atentam contra a democracia — qualquer um de nós pode ser vítima do arbítrio.

Os deputados que aprovaram a redução de penas, que consideram a tentativa de golpe de Estado algo banal, talvez tenham se esquecido do óbvio: numa ditadura, eles têm grandes chances de serem arrancados de suas cadeiras, como ocorreu anteontem com Glauber Braga. E ainda seriam presos, talvez torturados.

Apesar da leniência de Hugo Motta com a direita e de sua dureza com a esquerda, vale lembrar que conservadores também foram vítimas da ditadura implantada em 1964. Regimes autoritários adoram devorar seus antigos parceiros. Politicos como Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda, que apoiaram o golpe, tiveram seus direitos políticos cassados (o segundo chegou a ser preso e a fazer greve de fome na cadeia).

Homicidas, traficantes, assaltantes, correi: é chegada a hora de conspirar e golpear, vocês têm muito a ganhar e pouco a perder. Há crimes que compensam, mesmo quando não dão certo.