Por: POR FERNANDO MOLICA

CORREIO BASTIDORES | Contradições legais abrem brechas para condenados

Bolsonaro, ameaçado de perder posto e patente | Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

Publicados durante a ditadura, o Código Penal Militar (CPM) e o Estatuto dos Militares não incluem os crimes de golpe de Estado e de Abolição Violenta do Estado de Direito entre os capazes de gerar declaração de indignidade ou de incapacidade de um oficial que, assim, perderia posto e patente.

A omissão é encarada como uma brecha para impedir a punição militar a Jair Bolsonaro, capitão aposentado do Exército, e aos oficiais-generais que com ele foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal.

Ao ser em parte reformado em 2023, o CPM foi adaptado à Constituição e passou a exigir condenação adicional por tribunal militar para que um oficial condenado a penas superiores a dois anos perca posto e patente.

 

Combinação

A brecha é aberta pela combinação do Estatuto dos Militares com um artigo do CPM. Assinado em 1980 pelo presidente João Baptista Figueiredo, o Estatuto define que o oficial perderia posto e patente "se for declarado indigno do oficialato, ou com ele incompatível".

Exigência

Segundo o artigo 120 do Estatuto, bastaria a condenação, à prisão por mais de dois anos para caracterizar a indignidade ou a incompatibilidade. Mas o artigo 100 do CPM define os crimes que podem gerar essas caracterizações — não bastaria a condenação anterior.

Furto, extorsão, peculato: e nada sobre Golpe de Estado

Almirante Garnier também pode perder posto | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Segundo o o CPM, a indgnidade só ocorreria em caso de condenações por por "traição, espionagem ou cobardia" e por outros 13 crimes. Entre estes estão furto, extorsão, peculato e até ato libidinoso em área militar.

Mas não há nada sobre golpe de Estado ou de tentativa de abolição do Estado de Direito.

Também segundo o CPM, para ter declarada sua incompatibilidade com o oficialato o militar precisaria ser condenado com base nos artigos 141 e 142 do CPM, que tratam de casos de atos contra a soberania nacional ou de entendimento com país estrangeiro para gerar conflito ou divergência com o Brasil.

Constituição

Para um advogado que atuou na Justiça Militar, divergências devem ser superadas pelo que diz a Constituição, que se impõe às outras leis e que foi promulgada em 1988, depois da redemocratização: seu texto fala em indignidade ou incompatibilidade do oficial.

Muleta

A Constituição prevê que o julgamento da indignidade ou da incompatibilidade caberá a tribunal militar. Mas o advogado admite que as contradições e omissões são capazes de gerar polêmica no Superior Tribunal Militar e usadas para justificar o corporativismo.

A Junta

O CPM foi estabelecido em forma de decreto-lei, em 21 de outubro de 1969, pela Junta Militar que assumira o poder com o impedimento, por doença, do presidente Costa e Silva. Formada pelos ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica, o grupo governou por dois meses.

Golpe no golpe

Seria impossível que o CPM punisse a extinção do que não havia — Estado de Direito. Golpistas os militares, também não poderiam punir um golpe. Ao impedir a posse do vice-presidente, o civil Pedro Aleixo, a Junta Militar acabou dando um golpe dentro do golpe.