Por: Fernando Molica

A masterclass da bandalheira

A pirâmide sobre o M indicava o que banco fazia | Foto: Símbolo do banco Master

Se eu soubesse desenhar, faria uma ilustração que remeteria às fotos dos corpos, enfileirados, de mortos na operação policial nos complexos do Alemão e da Penha. No lugar dos cadáveres de cuecas haveria, principalmente, sujeitos de terno e gravata, políticos e empresários que correm o risco de virarem vizinhos de cela de Jair Bolsonaro.

Desenharia também rapazes e moças vestidos com os coletes que identificam funcionários de fintechs e corretoras que, em troca de polpudas comissões, empurravam papéis do Master para clientes comuns; eles de sapatênis, elas de scarpins. Ocupavam posições secundárias no esquema criminoso, mas não podem ser esquecidos. 

Os que aceitaram investir nos títulos do Comando Azul e Prata também seriam representados no desenho; homens e mulheres comuns, vítimas do golpe. No lugar da Igreja da Penha ficaria o logotipo do banco, um M imenso coroado por um pequeno e bandeiroso triângulo pousado sobre uma das pernas da letra inicial do nome do Master: da pequena pirâmide sairia uma luz mortiça, que iluminaria os mortos.

As primeiras informações divulgadas sobre a decisão do Banco Central de liquidar o Master indicam, além de um escândalo econômico, um outro de viés político. O caso parece ser um daqueles que deveriam ser usados de maneira didática, capazes que são de mostrar como funciona boa parte da vida política e institucional no País. Rende, com perdão do óbvio trocadilho, masterclass sobre safadeza.

O caso mais evidente é do BRB, Banco de Brasília, que pertence ao governo do Distrito Federal, dono de 71,92% de suas ações. De acordo com a Polícia Federal, diretores dos dois bancos inventaram uma operação que, entre janeiro e maio deste ano, transferiu R$ 12,2 bilhões — bilhões, não milhões — da instituição estatal para a privada. Uma grana muito maior do que a movimentada nas bocas de fumo do Alemão e da Penha.

Entre um pix e outro, o BRB se propôs a pagar R$ 2 bilhões por 58% do Master, que continuaria a ser dirigido pelo agora preso Daniel Vorcaro, que assim, com dinheiro público, salvaria seu banco. Uma espécie de parceria público-privada em que, mais uma vez, a grana de todos iria para os bolsos de alguns. A PPP não saiu graças à atuação do Banco Central, que impediu a jogada.

Ano passado, quem por pouco não morreu em R$ 500 milhões foi a Caixa Asset, braço do banco federal que cuida de investimentos.  Em troca de apoio no Congresso, a administração da Caixa foi cedida para partidos de uma espécie de Centrão ampliado, que incluiria até políticos do PL-raiz, fiel aos princípios, meios e fins que norteiam a carreira de Valdemar Costa Neto. A parada não saiu porque dois gerentes —  Daniel Cunha Gracio e Maurício Vendruscolo, importante citá-los - foram contra. Como prêmio, eles perderam seus cargos. Já o fundo de previdência do Estado do Rio comprou cerca de R$ 1 bilhão em papéis do Master.

É compreensível que pessoas físicas volta e meia se sintam tentadas a arriscar um pouco mais, a buscar investimentos que prometam maior rentabilidade. A existência do Fundo Garantidor de Crédito, que banca o pagamento de investimentos de até R$ 250 mil, colabora para minimizar ou eliminar eventuais perdas. Mas é inconcebivel que entes públicos coloquem dinheiro na boca desse tigrinho, eles sabem com quem estão lidando.

Ainda não são conhecidas todas as faces da pirâmide do Master, mas, por enquanto, não se tem notícia de grandes empresas privadas que tenham sido lesadas; quem assumiu o risco foi, principalmente, a área pública. Assim como no caso da megaoperação policial, a idenficação dos mortos virá aos poucos, mas não deve demorar muito para que os corpos engravatados do desenho ganhem rostos.