Repostados por Eduardo Bolsonaro, os xingamentos de Carlos Bolsonaro a governadores de direita não devem surpreender ninguém: desde sempre, a família Bolsonaro age apenas de acordo com seus próprios interesses.
Agora, trabalha com o único objetivo de tentar livrar o patriarca da cadeia, mesmo que, para isso, seja preciso brigar com aliados e submeter o país a uma chantagem dos Estados Unidos.
O vereador Carlos (PL) postou que os "governadores democráticos" (as aspas são dele) se comportam como ratos e têm comportamento "desumano, sujo, oportunista e canalha". Isto porque não estariam se esforçando o suficiente para que seu pai, o ex-presidente Jair, não seja condenado e preso.
Segundo o 02, os "direitistas" (de novo, aspas dele) são "cúmplices covardes" que "querem apenas herdar o espólio de Bolsonaro, se encostando nele de forma vergonhosa e patética".
O recado e as ofensas são dirigidos a quatro governadores não nominados por Carlos, todos citados como possíveis candidatos a presidente: Tarcísio de Freitas, de São Paulo (Republicanos); Romeu Zema, de Minas (Novo); Ronaldo Caiado, de Goiás (União Brasil) e Ratinho Júnior, do Paraná (PSD).
Em alguns pontos é preciso concordar com Carlos. Volta e meia, alguns desses governadores demonstram atitudes oportunistas, de olho no tal espólio eleitoral de Bolsonaro. Sabem que precisam dos votos do ex-presidente para conseguirem chegar ao Planalto: daí alternarem posturas mais radicais com acenos a setores conservadores tradicionais.
Tarcísio é mestre em assumir posturas contraditórias. Para tentar encarnar o tal do bolsonarismo moderado, expressão contraditória em si, ele costuma dormir na Faria Lima e acordar num palanque golpista da avenida Paulista, ou o contrário. Sempre de pijama azul, nunca amarelo.
Os xingamentos de dois dos filhos de Jair deveriam constranger tais governadores, fazer com que eles reagissem, tivessem posturas compatíveis com os cargos que ocupam, com os mandatos que receberam dos eleitores. Mas o mais provável é que eles os engulam como quem toma um comprimido de cloroquina.
Beneficiado por uma onda direitista internacional e por uma conjuntura brasileira que combinava lavajatismo com crise econômica, Bolsonaro foi eleito e acabou identificado como algo que nunca foi, porta-voz de teses da direita.
O ex-capitão não defendia ditadores e torturadores porque eles foram de direita, mas porque eram ditadores e torturadores. Não há qualquer registro anterior à sua primeira campanha presidencial de que tenha feito uma elegia ao capitalismo, ao liberalismo e ao livre comércio.
Sempre foi muito mais próximo da lógica estatizante, corporativa e intervencionista que marcou por décadas um certo pensamento militar brasileiro, muito representado pelo general Ernesto Geisel, que exerceu a Presidência entre 1974 e 1979. Sua grita contra a privatização da Vale e seus elogios a Hugo Chávez representam bem esse perfil.
Por décadas integrante da parcela inferior do baixo clero da Câmara, Bolsonaro nunca tratou de questões maiores relacionadas a questões econômicas, lutava para obter vantagens para sua própria categoria profissional, a dos militares.
Sua adesão aos princípios liberais representados por Paulo Guedes foi tão oportunista quanto o comportamento dos governadores agora humilhados por Carlos e Eduardo. A defesa do mercado era o único cavalo disponível para que ele chegasse à Presidência.
No governo, transformou aliados em inimigos assim que desconfiava de alguma traição — ou seja, de alguém quecontrariava ou poderia contrariar interesses de sua família.
Confinado em sua casa por ordem judicial, contando os dias para uma provável condenação, Bolsonaro mostra desespero e, pelas mãos dos filhos, ataca até quem está ao seu lado. Conta com a subserviência oportunista dos ofendidos.