Muita gente no PT ficou irritada com a atitude do presidente Lula de lavar as mãos no caso do aumento do IOF e de jogar toda a responsabilidade pelo problema nas costas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Na entrevista coletiva de ontem, Lula afirmou que a mudança em alíquotas do imposto foi uma proposta que Haddad "elaborou na Fazenda".

Segundo ele, o ministro se apressou no "afã de dar uma resposta logo à sociedade".

O governo e o parlamentares do partido sabem que a proposta foi levada ao presidente antes de ser transformada em decreto.

O próprio Haddad, em entrevista ao jornal O Globo publicada no último dia 25, declarou que a medida havia sido debatida "na mesa do presidente".

Lula tentou agradar o Congresso, afirmou que esse tipo de decisão precisa ser discutida com as lideranças no Legislativo. "Ninguém pode ser líder do governo e o governo mandar alguma coisa para lá sem conversar com eles", disse, em crítica a Haddad.

O puxão de orelhas foi visto como particulamente injusto porque o ministro é reconhecido como alguém sempre disposto a conversar. Apesar da bronca e do cansaço que vem demonstrando nos últimos dias, ninguém crê que Haddad vá romper com Lula.

A fuga da deputada Carla Zambelli e o auto-exílio do colega Eduardo Bolsonaro (ambos são do PL paulista) indicam uma espécie de profecia de Lula.

Em 19 de março de 2018, 19 dias antes de ser preso, o então ex-presidente foi a Santana do Livramento, cidade gaúcha que fica numa fronteira aberta — basta atravessar a rua para se chegar ao município uruguaio de Rivera.

Lula, em discurso, lembrou que estava sendo processado e disse, numa referência a um exílio, que poderia "dar um pulo ali" (no Uruguai). "Não dou", acrescentou.

Em seguida, completou: "Mais dia menos dia, quem vai sair do país são meus acusadores".

No ato estavam presentes os ex-presidentes do Uruguai Pepe Mujica e do Equador Rafael Correa. Santana do Livramento foi a segunda parada de caravana do petista pelo Rio Grande do Sul. Pela manhã, ele havia sido hostilizado em Bagé, e obrigado a mudar seu itinerário.

Depois de preso, Lula afirmou ter recusado a sugestão de correligionários defendiam sua fuga para o exterior para escapar da punição. Repetiu que queria provar sua inocência. O destino mais óbvio era o Uruguai, então presidido por Tabaré Vazquéz, também de esquerda.

A saída de Zambelli do país aumentou a preocupação de denunciados pela tentativa de golpe de Estado, entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro. Há no grupo o temor de que a fuga sirva de pretexto para a decretação de prisão de alguns deles.

Condenada a dez anos de prisão por invasão de sistemas do Conselho Nacional de Justiça, a deputada já vinha sendo rejeitada por Bolsonaro. Para ele, Zambelli teve influência direta em sua derrota ao, na véspera da eleição, perseguir um adversário de arma em punho.