Além de cruéis, desumanos e injustificáveis, os gestos e as declarações de Donald Trump revelam um comportamento infantil, dele e da maioria dos eleitores norte-americanos. O presidente dos Estados Unidos comporta-se como uma criança mimada, que quer todos os brinquedos e não economiza maldades como a de amarrar bombinhas no rabo de um gato.
As atitudes irresponsáveis de Trump mostram que ele se encaixa com perfeição na fase do desenvolvimento infantil que o psicólogo, pensador e biólogo suíço Jean Piaget (1896-1990) definiu como pré-operacional, típica de crianças dos dois aos sete anos de idade.
Algumas das características dessa etapa chegam a assustar quando pensamos no presidente da nação mais poderosa do planeta: egocentrismo, incapacidade de se colocar no lugar do outro, confusão entre realidade e fantasia, dificuldade para separar o certo do errado.
Isso faz lembrar alguém, né? Melhor, lembra muitas pessoas, inclusive por aqui — é só pensarmos na incapacidade de Jair Bolsonaro de demonstrar empatia com as centenas de milhares de vítimas da pandemia da covid 19.
Apesar de toda sua fofura, crianças pequenas tendem a ser egoístas — aquela história de pegar o brinquedo do amiguinho e gritar "É meu!" — e cruéis. Costumam não ser solidárias com a dor alheia, tudo gira em torno de seus próprios interesses. Têm dificuldades para absorver valores que vêm com o crescimento e com o processo de educação. Trump, seus eleitores e admiradores parecem parados no tempo da infância.
Há nos Estados Unidos uma lógica que reforça a ideia do egocentrismo, do conceito excludente de América (como se não houvesse outros países no continente), da simplificação do bem e do mal. Até hoje, costumam valorizar mais competições esportivas nacionais do que as envolvem outras nações — o importante é ser o campeão entre eles. A própria educação formal norte-americana privilegia o conhecimento do próprio país em detrimento da história de outros povos.
O estímulo à falta de empatia sempre favoreceu a atuação internacional dos Estados Unidos, justificou a invasão de outros países — os outros eram apenas inimigos que ameaçavam "a América". Costumamos sentir menos a dor de pessoas nos são estranhas. Uma tragédia que acontece perto de nós ou em lugares que amamos dói mais que aquela que atinge povos distantes, desconhecidos.
O tema da ameaça externa, vinda de outras nações ou do espaço, é constante em Hollywood. Como em antigas histórias infantis, os outros são apresentados como feios, sujos e malvados, têm pele não branca, são maus, cometem crimes, estão sempre de olho nas riquezas americanas.
Na pedagogia da dominação, é preciso temer o outro, estrangeiro ou extraterreno, o bicho-papão. Uma dicotomia que chegou ao ponto de escalar entre os "outros" os habitantes nativos da América do Norte. Os imigrantes e os palestinos são os outros da vez.
Um querido ex-professor de jornalismo, o Nilson Lage (1936-2021), costumava frisar como, nos tempos da Guerra Fria, criou-se nos Estados Unidos um repertório simbólico para caracterizar os soviéticos — e comunistas, por extensão — como bárbaros, não civilizados. Atacá-los seria assim uma forma necessária de defesa.
Ao anunciar que quer retirar os palestinos de Gaza para lá construir um complexo turístico, Trump superou a sua própria já conhecida insensatez. Pior, colocou-se num patamar semelhante ao de outra liderança que, não faz tanto tempo assim, gabava-se da suposta superioridade de sua raça, conduziu campanhas de difamação e, depois, de extermínio de povos que considerava inferiores, prejudiciais à humanidade.
Boa parte da opinião pública se deixou convencer que aquelas pessoas apontadas como inimigas eram inferiores, más, sujas, ameaçadoras, criminosas por uma espécie de defeito de nascença — eram seres humanos que mereciam ser banidos do planeta.
O mal foi banalizado e visto por muita gente como um bem. Judeus, em particular, conhecem muito bem essa história. Todos temos o dever moral e histórico de impedir que algo assim se repita. É preciso que adultos entrem na sala, o que está em jogo não é uma brincadeira de criança.