Por: Fernando Molica

Na esquerda, um por todos; na direita, todos por nenhum

Presidente Lula afirma que quer garantias de tratamento digno aos deportados | Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação

A julgar pela última pesquisa da Quaest, os campos que polarizam a disputa política no país têm problemas opostos nessa pré-corrida presidencial. A esquerda tem o hoje favorito, Lula, mas tem ele; a direita tem vários candidatos, mas não tem nenhum.

Apesar da liderança apontada pela pesquisa, a situação do presidente não é das mais simples — o mesmo levantamento que apurou sua presença na ponta indicou queda na sua popularidade. É preciso ver se a nota vermelha é passageira ou se tende a permanecer e, mesmo, a ficar ainda mais baixa.

Há também a questão da idade — ele terá 81 anos em outubro de 2026 — e do seu estado de saúde. A pesquisa mostra que ele é o único representante viável da esquerda; depois de uma nova sequência de vacilos, Ciro Gomes não pode ser mais escalado nesse time.

O substituto eventual de Lula seria o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que já envergou a camisa 13 na disputa presidencial em 2018. Mas ele, além de ter perdido as três últimas eleições de que participou, foi atingido pela campanha contra impostos promovida pela oposição: as chances de mudanças no Pix dedurarem pequenos sonegadores parecem ter feito grudar nele o apelido de "Taxad". Segundo a Quaest, 56% dos eleitores sabem quem é Haddad, e não dariam seu voto a ele.

Fora isso, Haddad também é alvo frenquente de ataques da esquerda. Para ser candidato, a economia precisaria melhorar a ponto de o crescimento ser percebido por uma população cada vez mais cética. Os nordestinos do PT, como o senador Jaques Wagner (BA) são sempre lembrados, mas até agora apenas Lula, pernambucano que nasceu para a política em São Paulo, foi o único da região ungido pelo partido para disputar o Planalto. São também nomes desconhecidos da maior parte da população.

Se esquerda sofre com o risco do ter um é como não ter nenhum, a direita se vê pulverizada, presa a Jair Bolsonaro. O temperamento do ex-presidente, que enxerga traições em cada esquina, complica a vida de pretendentes ao cargo. Os representantes da direita e da extrema direita que sonham com a presidência sabem que não podem abrir mão do apoio de Bolsonaro — e ninguém quer irritá-lo.

Governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União) já derrotou o ex-presidente na disputa pela prefeitura de Goiânia, mas ainda é pouco conhecido nacionalmente (68% não sabem quem ele é) e tem consciência de que seria muito difícil viabilizar sua candidatura sem ao menos a tolerância de Bolsonaro. Seu colega de Minas, Romeu Zema (Novo), também tenta construir um caminho próprio, mas evita bater de frente com o ex-capitão.

Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) repete que será candidato à reeleição, mas aliados não descartam a possibilidade de ele tentar o Planalto se Lula desistir. Caso parta para a briga, precisará se tornar mais popular — segundo a Quaest, é desconhecido por 45% dos eleitores.

A eventualidade de Bolsonaro escolher alguém de casa para a disputa — a mulher, Michelle, ou o filho Eduardo — também complica o jogo e inibe ainda mais outros correligionários. Fica difícil botar o bloco na rua quando o grande chefe volta e meia insinua lançar alguém da família.

Mais preocupado com prováveis denúncias da Procuradoria-Geral da República e com uma hoje improvável anistia, Bolsonaro se diz candidato para se manter no foco e poder posar de vítima em caso de condenação. O problema é que, com isso, atrasa movimentos do seu campo político e dificulta outras candidaturas. Em 2018, o PT insistiu com Lula até o último recurso. Impedido de lançá-lo na disputa, o partido teve que correr contra o tempo para tentar viabilizar Haddad. Agora parece ser a vez da direita de repetir o erro.