Por: William França

BRASILIANAS | Para onde foi o dinheiro do patrocínio?

Paulo Henrique Costa, ex-presidente do BRB | Foto: Lúcio Bernardo Jr./Agência Brasília

Altos Investimentos no Flamengo, na Fórmula 1 e em outras categorias do automobilismo, além de campeonatos de tênis e em jogos de futebol promovidos pelo Metrópoles, estão sob investigação

A representação que está sendo investigada pelo Tribunal de Contas do DF detalha a concentração dos recursos em contratos com entidades esportivas e eventos de entretenimento, muitos deles sediados fora do Distrito Federal. Elas vão em sentido oposto ao que prevê a Lei Orgânica do DF e da LDO de 2024.

Nos primeiros nove meses de 2024, o BRB já havia desembolsado R$ 85 milhões em patrocínios, sendo: R$ 31 milhões (36,7%) para o automobilismo, R$ 26,5 milhões (31,4%) para o futebol e R$ 7,2 milhões (8,5%) para eventos e entretenimento.

 

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O BRB mantém um contrato milionário com o Flamengo, que já ultrapassa R$ 200 milhões desde 2020 | Foto: Reprodução / Coluna do Fla

BRB x Flamengo

O BRB mantém um contrato milionário com o Flamengo que já ultrapassa R$ 200 milhões desde 2020, com previsão de mais R$ 50 milhões até o fim de 2025. O patrocínio é alvo de críticas e investigações por desvio de finalidade, já que o clube é sediado fora do DF.

Segundo dados da representação do distrital, apenas entre 2020 e 2023 o Flamengo recebeu R$ 153,18 milhões do BRB, que se tornou um dos maiores contratos de patrocínio já firmados por uma instituição pública do Distrito Federal.

Em abril de 2024, o Conselho Deliberativo do clube aprovou a renovação do contrato, com previsão de R$ 50 milhões até dezembro de 2025 — sendo R$ 25 milhões por ano.

O BRB deixou de ser patrocinador master (posição central da camisa) após a entrada da casa de apostas Pixbet, e passou a ocupar a omoplata (região dos ombros) do uniforme.

A relação entre banco e clube envolve não apenas a exposição da marca na camisa, mas também a operação do chamado "Banco Nação", uma plataforma digital voltada à torcida rubro-negra, com valor mínimo de R$ 15 milhões por ano, podendo chegar a R$ 25 milhões caso o patrocínio não seja renovado após dois anos.

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Em 2019, o governador do DF esteve no Monumental, em Lima, na final da Libertadores | Foto: Reproducao/Instagram

O governador Ibaneis Rocha - que, conforme apuração de "Brasilianas", viajaria para Lima, no Peru, para assistir a final da Libertadores neste sábado (29), onde o Flamengo enfrenta o Palmeiras na final - tem uma relação pessoal e comercial direta com o Flamengo: é torcedor declarado do clube, adquiriu franquias de lojas oficiais da marca no DF com os filhos e, sob sua gestão, o BRB firmou e ampliou contratos milionários de patrocínio com o time carioca.

Em 2021, veio à tona que Ibaneis e seus filhos abriram duas lojas da franquia "Nação Rubro-Negra" em Brasília, especializadas na venda de produtos oficiais do Flamengo. A empresa RB Comércio Varejista de Artigos Esportivos Ltda., com capital social de R$ 1 milhão, tem como sócios o governador e seus três filhos. A primeira loja foi aberta no Brasília Shopping; a segunda, no Shopping JK, em Taguatinga.

O filho mais velho, Caio Rocha, é o administrador da empresa e tem poderes para assinar documentos e gerir os negócios. A abertura das lojas coincidiu com a flexibilização das restrições da pandemia no DF e com a realização de jogos do Flamengo no Estádio Mané Garrincha, o que levantou suspeitas de conflito de interesses.

O Ministério Público do DF abriu uma investigação para apurar se houve favorecimento indevido ao clube e, por consequência, às lojas da família do governador. A suspeita surgiu após o GDF liberar a presença de público em jogos do Flamengo em Brasília, pouco depois da inauguração das lojas. Um dos jogos, contra o Olimpia pela Libertadores, levou mais de 20 mil torcedores ao Mané Garrincha, movimentando o comércio local.

Segundo reportagem do site Relatório Reservado, a parceria entre BRB e Flamengo seria, na prática, um projeto pessoal do governador. Em entrevista ao Canal Paparazo Rubro Negro, em agosto de 2022, o ex-presidente do BRB afirmou que buscava um sócio para financiar a compra do terreno e a construção do estádio do Flamengo - na cidade do Rio de Janeiro. Paulo Henrique Costa também contou que o banco pretendia ter o naming rights do futuro estádio.

A plataforma Nação BRB Fla, segundo a mesma fonte, acumulava inadimplência de quase R$ 450 milhões em 2023, o que levantou dúvidas sobre a viabilidade financeira do projeto.

 

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Logo do BRB ocupa espaço próximo ao bico dos carros da Alpine | Foto: Reprodução/X

BRB x Fórmula 1

A equipe de Fórmula 1 BWT Alpine também figura entre os principais beneficiários.

O Banco de Brasília entrou oficialmente no universo da Fórmula 1 em 2023 ao firmar uma parceria com a equipe francesa BWT Alpine F1 Team. A iniciativa, segundo o banco, visava fortalecer a marca, ampliar relacionamentos e posicionar a instituição no cenário internacional. No entanto, o patrocínio milionário a uma equipe estrangeira — que ocupa a penúltima colocação no campeonato de 2025 — tem sido alvo de críticas e investigações por suposto desvio de finalidade.

O BRB investiu R$ 1.657.433,33 na Alpine apenas entre janeiro e março de 2024. O valor é o segundo maior entre os patrocínios esportivos do banco no período, atrás apenas do investimento na Supercopa do Brasil (R$ 1,77 milhão).

Segundo o banco, o patrocínio se justifica "como parte de uma estratégia de internacionalização da marca". O banco também se tornou parceiro exclusivo de serviços financeiros da escuderia na América do Sul. A representação do deputado Gabriel Magno ao TCDF menciona o patrocínio à Alpine como exemplo de "espetáculo elitizado" financiado com recursos públicos.

Em julho de 2023, o BRB anunciou que se tornaria o parceiro exclusivo de serviços financeiros da Alpine na América do Sul. Como parte do acordo, o banco pretende criar uma academia de pilotos em Brasília, com seletivas anuais para apoiar jovens talentos brasileiros no automobilismo internacional.

A proposta é transformar a capital federal em um polo do automobilismo, oferecendo oportunidades para que pilotos brasileiros tenham acesso a categorias de base e, eventualmente, à Fórmula 1. "Estamos muito entusiasmados com a possibilidade de termos uma Alpine Academy no Brasil", afirmou o então presidente do BRB, Paulo Henrique Costa.

Além da Alpine, o BRB também patrocina outras categorias do automobilismo, como Stock Car, Fórmula 4 Brasil, Touring Car Championship (TCR) e o Rally dos Sertões.

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Ibaneis Rocha com o senador Ciro Nogueira (PP-PI) no GP Brasil de Fórmula 1 | Foto: Instagram

Também se somam aos "investimentos" do BRB na Fórmula 1 a compra de ingressos. Em 2024, o BRB gastou R$ 3,2 milhões na aquisição de ingressos de camarotes para o GP de F1 em São Paulo, valor que foi divulgado no "Diário Oficial do DF" dois dias antes da corrida, conforme demonstrou reportagem do jornal O Estado de S.Paulo.

Este ano, o BRB distribuiu ingressos VIP para que políticos, empresários e clientes comparecessem ao GP de F1 em São Paulo, que aconteceu no dia 9 de novembro. O banco adquiriu ingressos para o F1 Paddock Club, que garantiam acesso à área mais luxuosa do autódromo e visão privilegiada da pista. O deputado distrital Chico Vigilante (PT) chamou a ação de "farra" e acionou o Ministério Público para investigar esse gasto, além do ressarcimento ao erário e responsabilização dos agentes envolvidos.

 

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O BRB é patrocinador direto do piloto Gabriel Bortoleto, da equipe Sauber na Fórmula 1. E do pai dele, na Vicar, promotora da Stock Car | Foto: Divulgação/Fórmula 2

BRB x Bortoleto e família

O BRB é patrocinador direto do piloto Gabriel Bortoleto, da equipe Sauber na Fórmula 1. O banco também mantém relações com o pai do piloto, Lincoln Oliveira, que é CEO da Stock Car e figura influente no automobilismo nacional — setor no qual o BRB tem investido pesadamente.

No campeonato de 2025 da Fórmula 1, Bortoleto pontuou apenas uma vez nas últimas seis corridas, com o décimo lugar no GP do México. O brasileiro é o 19º colocado no campeonato de pilotos, com 19 pontos ganhos. Segundo o relatório do Dieese, Gabriel Bortoleto recebeu em 2023 um patrocínio de R$ 2.383.333,00.

A ascensão do jovem piloto Gabriel Bortoleto (completou recentemente 21 anos) teve o apoio direto do Banco de Brasília, que se tornou um dos principais patrocinadores do brasileiro. O patrocínio - segundo o BRB - faz parte da estratégia do banco de se posicionar no automobilismo internacional, mas também levanta questionamentos sobre critérios de escolha e possíveis conflitos de interesse, dada a forte presença da família Bortoleto no setor.

O pai de Gabriel, Lincoln Oliveira, é uma figura central no automobilismo brasileiro. Ele é CEO da Vicar, empresa promotora da Stock Car, e também fundador da Americanet, que se fundiu com a Vero em 2023, formando uma das maiores operadoras de internet do país.

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O ex-presidente do BRB reune-se com o governador Ibaneis Rocha, o piloto Gabriel Bortoleto e o pai dele, Lincoln Oliveira, no Palácio do Buriti | Foto: Renato Alves/Agência Brasília

A influência de Lincoln no setor é significativa: além de comandar a principal categoria do automobilismo nacional, ele tem forte trânsito entre patrocinadores e gestores públicos. A Vicar, por exemplo, é responsável por eventos que recebem apoio do BRB, como etapas da Stock Car em Brasília. A próxima será neste sábado, dia 29, na reinauguração do Autódromo de Brasília.

Essa sobreposição de interesses — com o BRB patrocinando tanto o filho quanto eventos promovidos pela empresa do pai — levanta dúvidas sobre a transparência e os critérios adotados pelo banco para a concessão de patrocínios.

"Esses patrocínios não preservam seu caráter regional, uma vez que muitos dos eventos patrocinados  ocorrem fora do Distrito Federal e entorno, como é o caso da Fórmula 1 em São Paulo", afirma a representação.

 

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O Metrópoles e o BRB desenvolveram parceria em patrocínios esportivos, como este, para um jogo da chamada Supercopa | Foto: Instagram

BRB x Metrópoles

O Metrópoles Produções Audiovisuais aparece na representação preparada pelo deputado Gabriel Magno como o quinto maior beneficiário em recursos para patrocínio no primeiro trimestre de 2024. Os dados ainda são parciais. O braço de entretenimento do site de notícias recebeu R$ 4.675.000 (quatro milhões, seiscentos e setenta e cinco mil reais).

O relatório indica que foram empregados R$ 1,775 milhão na Supercopa do Brasil 2024, outros R$ 200 mil no jogo entre Nova Iguaçu e Internacional e mais R$ 200 mil para patrocinar o jogo entre a Inter de Limeira e o São Paulo.

No ranking das despesas, depois do Flamengo, da Vicar e da Alpine, aparece a Confederação Brasileira de Tênis, tendo recebido R$ 6.500.000,00 (seis milhões e quinhentos mil reais) de patrocínio do banco. "É mais um exemplo de 'espetáculo elitizado' financiado com recursos públicos, em detrimento de investimentos em causas sociais e desenvolvimento local", completa o deputado distrital.