Por: William França

BRASILIANAS | 'Vai de Graça' gera pico de inflação no DF em maio

O programa Vai de Graça foi criado em março deste ano | Foto: Geovana Albuquerque/Agência Brasília

Parece confuso... e é confuso! Brasília registrou 0,82% de inflação em maio (a maior de todo o país), porque teve 4 dias de transporte público gratuito em abril por conta de feriados, contra apenas 1 dia grátis em maio

Na última terça-feira (10), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) relativo ao mês de maio. E como faz todos os meses, divulga os dados por regiões metropolitanas. São 16 em todo o país e Brasília é uma delas.

Este mês, o aumento de 12,9% no custo do transporte urbano em maio, registrado pelo IBGE, foi um dos itens que impulsionou a taxa da inflação do mês para 0,82%, deixando Brasília com a maior taxa de inflação do país.

Mas, como assim? Se as tarifas do transporte público estão congeladas no DF desde 2019, como é que o instituto registra um aumento tão expressivo assim nos preços, de um mês pra outro?

Foi exatamente esta pergunta que "Brasilianas" fez ao IBGE. O que está por trás desse índice?

A resposta foi a mais inusitada possível: por causa do "Vai de Graça", o programa do GDF que oferece transporte público gratuito à população aos domingos e feriados. Isso mesmo!

Confesso que daí a minha perplexidade só aumentou... Se o transporte é gratuito, como é que isso provocou aumento, que gerou inflação?

Vale lembrar a você, leitor, que não é apenas um dado simples, dentro de tantos outros. O IPCA impacta diretamente o poder de compra da população e é usado como referência para ajustes em diversos contratos (como de alugueis residenciais e comerciais) e investimentos.

Mas, o que aconteceu, afinal?

O IBGE, pacientemente, explicou ontem a "Brasilianas". Na série histórica, os itens relativos a custo do transporte público (ônibus urbanos e metrô) no DF apareciam com 0% há vários anos. SE não houve nenhum aumento, não tem registro.

Mas em março deste ano, esse item do transporte público registrou queda de 24,18% se comparado com o mês de fevereiro. Isso porque foi em março, no mês do Carnaval este ano, que o governador Ibaneis Rocha (MDB) anunciou o "Vai de Graça".

O brasiliense não pagou pelo transporte público nos dias 2, 3, 4 e 5 de março (Carnaval) e nos domingos 9, 16, 23 e 30 daquele mês. Ou seja: foram 8 dias de transporte gratuito em março, contra nenhum dia em fevereiro.

Já em abril, por conta do aniversário de Brasília e da Semana Santa, houve feriados/recessos em 3 dias (17, 18 e 21) além de quatro domingos (6, 13, 20 e 27). No total, 7 dias de transporte público gratuito.

Em maio, no entanto, só houve 1 feriado (dia 1º) e 4 domingos (4, 11, 18 e 25), somando "apenas" 5 dias de transporte público gratuito.

Pois foi justamente essa leitura, de 8 dias de "Vai de Graça" em março, que derrubou o índice em -24,18% em comparação a fevereiro.

Já em abril, que teve 7 dias gratuitos, a variação foi de -3,36%, se comparado a março (que teve 8 dias grátis).

Em maio, que registrou apenas 5 dias de transporte gratuito, houve aumento de 12,9% a mais se comparado a abril.

"É uma questão metodológica, que analisa o preço médio dos produtos", explicou um asssessor técnico do IBGE. A grosso modo, pega-se o valor do mês e divide por 30 (que é o número de dias). Se num mês o usuário pagou em 22 dias e em outro pagou em 25 dias, ele acabou pagando mais. Ou seja: houve inflação. Essa é a conta do IBGE. Conseguiu entender?

Confesso que gostaria que o Instituto revisse a forma de pesquisa desse quesito. É muito estranha...

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O quadro demonstra os índices de deflação (inflação negativa) em março e abril, e de inflação (positiva) em maio | Foto: Divulgação/IBGE

Grupo de transporte é o vilão da inflação no DF

Se em maio, em todo o país, houve uma desaceleração na taxa de inflação (recuo de 0,17 ponto percentual) medida pelo IPCA, em Brasília "ela foi para a estratosfera", segundo o jornalista Chico Sant'Anna, do Blog Brasília, que comentou os índices inflacionários anteontem.

Segundo ele, a alta no Distrito Federal é quase quatro vezes maior do a inflação do Brasil como um todo. Em nível nacional, a alta foi de 0,26%. "A inflação de maio em Brasília deu um pulo olímpico se comparada a abril. Cresceu mais de vinte vezes o custo de vida do mês anterior", afirmou Chico Sant'Anna,

Segundo o IBGE, sete dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados em Brasília apresentaram altas no IPCA de maio.

E o grupo que mais puxou o IPCA de Brasília para cima foi justamente o de transportes (1,50%), com destaque para a majoração do preço médio da gasolina em 2,60% e do ônibus urbano em 12,90%. E foi este dado aqui, caro leitor, tão fora da curva, que chamou a atenção de "Brasilianas".

E, para piorar, a alta no preço dos combustíveis em Brasília seguiu um comportamento oposto ao verificado nacionalmente, onde todos os combustíveis pesquisados registraram queda de preço: óleo diesel (-1,30%), etanol (-0,91%), gás veicular (-0,83%) e gasolina (-0,66%).

Opinião final

É... Brasília segue sendo mesmo sui generis. Até quando o governo oferece algo de graça, a conta recai para todos em efeito bumerangue. Afinal, os índices de reajuste da inflação mais altos, medidos pelo IBGE, valerão para todos os cidadãos que terão contratos reajustados este mês.