CRÍTICA / TEATRO / ELA, E ALGUMAS HISTÓRIAS: Começarde novo

Por Cláudio Handrey - Especial para o Correio da Manhã

Francisca Queiróz se aventura (e bem) na dramaturgia em 'Ela, e Algumas Histórias'

A atriz Francisca Queiroz se aventura como autora e estreia seu espetáculo "Ela, e algumas histórias" com bom aproveitamento dramatúrgico. O texto relata as inúmeras passagens que uma mulher busca se equilibrar diante de tantos acontecimentos numa vida em transformação. Ao abrir a cena, "Ela" se encontra naquele momento dificultoso, em que a personagem, ao 45 anos, com três filhos, abre mão de um relacionamento de 20 anos, numa intensa necessidade de se reinventar. Como uma mulher de meia-idade se depara com tantos desafios? Como equalizar a sabedoria profissional, a vida financeira, a maternidade e ainda recomeçar a vida afetiva? A debutante escritora trata com delicadeza e humor os variados temas, pelos quais a narrativa se desenvolve, quando por exemplo a personagem assume usar a tecnologia a seu favor para criar formas de flertar com o sexo oposto, apelando para os aplicativos. O grande mérito da dramaturga é aglutinar presente e passado, estabelecendo boa carpintaria cênica, dando agilidade à obra, na qual ratifica a liquidez dos tempos modernos.

Em sintonia com o texto, Ernesto Piccolo impõe dinâmica ao espetáculo, articula com clareza e apresenta uma encenação de bom gosto. O diretor quebra a quarta parede, conduzindo as personagens a se comunicarem diretamente para o público, sobretudo em circunstâncias de narração, muitas delas repletas de delicadeza e reflexão, outro êxito de Queiroz.

Francisca se entrega, se emociona e emociona, matizando com sabedoria os seus tons, mas se atrapalha na velocidade teatral, esgarçando algumas cenas, perdendo-se em muitas pausas, recursos mais utilizados no audiovisual. Já Claudio Gabriel funciona como um farol na condução de suas personagens. O ator abrilhanta o espetáculo em todas as suas aparições, descortinando sua experiência profissional, compondo com sagacidade e teatralidade todos os seus papéis: o porteiro, o garotão, o marido machista, o advogado, o pai, o amigo gay. Gabriel não perde uma respiração e alavanca o espetáculo, recheando seus momentos de humor com categoria. A dupla estabelece boa sinergia.

Caixas de tamanhos variados revelam a mudança/transformação que "Ela" vai viver, numa cenografia eficiente de Clivia Cohen. A luz de Vilmar Olos alterna bons ambientes abertos e fechados, auxiliando os estados dramáticos e cômicos. Há algo de personificação no figurino de Bel Garcia, que se alinha ao contexto, aclarando a ideia de que "Ela" é uma artista plástica.

SERVIÇO

ELA, E ALGUMAS HISTÓRIAS

Teatro Gláucio Gill (Pç. Cardeal Arcoverde, s/nº - Copacabana)

Até 29/9, de sábado a segunda (20h) | R$ 60 e R$ 30 (meia)