Pimpão no comando do espetáculo "Meus 2 Pais", que tem sessão sábado e domingo, às 16h, na Sala Nelson Pereira dos Santos, em Niterói, Cesar Augusto protagoniza uma sequência do mais alto teor de paixonite na minissérie da HBO Max "Máscaras De Oxigênio (Não) Cairão Automaticamente". Arranca suspiros de pombinhos que acompanham a trama de mãos dadas ao mesmo tempo em que alarma a plateia, ao encampar para si diálogos de precisa tradução do machismo e da homofobia.
Lançada mundialmente na Berlinale, em fevereiro, projetada no Festival de Gramado, em agosto, e já no ar, na TV e no streaming, a produção expõe o quão intolerante foi o Rio de Janeiro que testemunhou o boom da Aids, entre o fim dos anos 1980 e o início dos 1990. Antunes - personagem que extrai do diretor teatral uma atuação de rasgar miocárdios - vive entre dois amores, mas esconde da sociedade o que vive com uma de suas amadas, por transfobia. Vive com HIV e não sabe, até ser tarde demais.
"A Aids trouxe o horror do preconceito e das agressões punitivas, mas também impulsionou a comunidade gay, como era representada na época, a se organizar politicamente, reivindicar direitos de saúde pública e buscar alternativas, independentemente de sua legalidade", lembra Cesar Augusto ao Correio da Manhã.
"Era uma questão sem precedentes, e o enfrentamento era (e ainda é) uma afirmação vital. No Brasil, grupos como o GAPA e o Grupo Pela Vidda foram fundamentais para romper barreiras de ódio e preconceito. A partir daí, cresceu a consciência de que a tragédia não se restringia a um gueto, mas atingia toda a sociedade. As manifestações coletivas deixaram claro que a verdadeira epidemia estava no preconceito e na negação da informação. A maior dor foi ver uma geração ceifada pelo medo e pela ignorância. A quebra da patente do retroviral, aqui, tempos mais tarde, também foi um marco histórico mundial, sendo disponibilizado pelo SUS", completa.
Idealizado por Thiago Pimentel, que assina produção com Tiago Rezende e Mariza Leão, na Morena Filmes, "Máscaras de Oxigênio (Não) Cairão Automaticamente", dirigida por Carol Minêm e Marcelo Gomes, acompanha a luta de dois comissários de bordo (Johnny Massaro e Bruna Linzmeyer) para trazer ao Brasil, clandestinamente, o medicamento (AZT) capaz de auxiliar a luta de pacientes para preservar a imunidade em meio ao avanço virótico. A médica Marcia Rachid, autora de livros obrigatórios como "Sentença de Vida", foi consultora da dramaturgia.
Nos roteiros de Patrícia Corso e Leonardo Moreira, Antunes frequenta uma boate queer - ainda que dizendo para as pessoas "você não me viu aqui" -, onde mantém um caso com a personagem de Kika Sena. Sua companheira (Rita Assemany) fica em casa, entre costuras e a TV, mas não consegue conter o avanço de uma tosse sem explicação... pelo menos até o episódio dois.
"Antunes é o retrato da desinformação. Representa uma parcela da sociedade que não se enxerga, que não se percebe como realmente é", diz Cesar Augusto. "Ele se estabelece a partir do que é escondido. Na época, usava-se o termo 'enrustido', alguém socialmente dissimulado. Isso não se refere apenas à questão homo ou bissexual, mas também à sexualidade de forma mais ampla e à prevenção. Em uma sociedade heteronormativa e punitiva, até mesmo o uso de preservativos era (e ainda é) um tabu em casais conservadores, onde essa possibilidade se cogita. Talvez aí resida a problemática mais profunda em que o personagem se insere, ainda que mascarada por uma figura masculina tóxica. Procurei trazer, junto com Marcelo Gomes e Carol Minêm, uma camada de afeto na sua relação com as duas mulheres de sua vida. Sim, havia amor ali e é justamente essa complexidade que me interessa neste trabalho".
No palco, além de "Meus 2 Pais", que ainda será encenadada em Itaguaí (11 e 12/10), Nova Iguaçu (18 e 19/10) e Teatro Municipal Ziembinski, na Tijuca (25 e 26/10), a agenda de Cesar Augusto tá danada de cheia. "Em outubro apresento um cabaré, gênero que faz parte das minhas tentações artísticas, e será no Teatro Glaucio Gil. Este trabalho, veio a convite do Rafael Raposo, atual diretor artístico do espaço. Nesse projeto, 'Cabaré em Transe', o cinema nacional é o tema. Além dele, ainda trago as criações dos Residentes da Sede da Cia dos Atores, inspirados na dramaturgia da Grace Passô, uma referência da cena contemporânea nacional, e sigo com os meus xodós em circulação e temporadas: os espetáculos 'Claustrofobia', de Rogério Corrêa, com Marcio Vito, e 'Terminal', com Kelzy Ecard e Gustavo Vaz e Kelzy Ecard", diz o encenador. "O que me move é o ato da criação. Se for hora de expandir este território, o audiovisual é mais do que bem-vindo".