Encomendado por Drica Moraes para celebrar os seus 40 anos de carreira, "Férias", de Jô Bilac, um dos melhores dramaturgos contemporâneos, é bem urdida ao investir nos quiproquós de um casal, que comemora bodas de prata e faz um cruzeiro, presente dos filhos. O texto se desconstrói, desvelando ao público o jogo teatral!
O autor apresenta H e M, protagonistas, cultos e afiados, que pretendem quebrar a mesmice do relacionamento ao embarcarem numa viagem transloucada, criando inúmeras citações, como "Dois Perdidos Numa Noite Suja", numa alusão a peça icônica de Plínio Marcos, armando uma brincadeira com o próprio teatro. O casal é expulso do navio por comportamento libidinoso e aporta numa praia colombiana, onde se deparam com X e Y, outras personagens enlouquecidas vividas pelos mesmos intérpretes. E o texto vai dando elementos para que atores e diretores possam voar.
A direção de Enrique Diaz e Debora Lamm, em perfeita sintonia com o dramaturgo, aposta num espetáculo ágil, num ritmo delirante, somado a eficiente direção de movimento de Marcia Rubin. Numa explícita ideia de entretenimento, a dupla de diretores acerta em estabelecer uma sujeira cênica, permitindo uma soltura aos intérpretes, que desenvolvem imediata comunicação com a plateia.
Para além do bom teatro, há uma química edificada entre Drica e Diaz: amigos de longa data, ex-namorados, criadores da Cia dos Atores, preservando uma conexão absolutamente divertida. Madura e dona do seu ofício, ela concebe suas personagens sem pudor algum, brilhando a cada movimento, a cada palavra proferida, atingindo o timing, numa performance que nos traz a doce lembrança de atrizes do calibre de Marília Pêra. Impagável a cena que as personagens estão embriagadas, quando Drica faz o público gargalhar, suprimindo sílabas e ainda assim tudo se ouve e se compreende. Uma confusão quando repetem "bad trip, bad trip", até sair "Brad Pitt"! Na dramaticidade, que abrange todos os gêneros, a atriz dosa pílulas de delicadeza em rasgos cômicos, em determinado momento que o casal olha pro céu e filosofam sobre a vida.
No cenário de Dina Salem Levy, uma pista de skate é instalada no palco, reforçando o desequilíbrio entre as personagens. O figurino de Antônio Medeiros é criativo com aventais pintados que sugerem órgãos genitais. A luz de Wagner Antônio é aberta, reforçando o conceito cômico, contrastando os diversos momentos e lugares em que as personagens estão situadas. Tudo isso aliado a um final surpreendente corrobora que o teatro encontra eco quando se faz com talento, entrega e amor.
SERVIÇO
FÉRIAS
Teatro Claro Mais RJ (Rua Siqueira Campos, 143, 2º piso) | Até 28/9, sextas (20h30), sábados (18h) e domingos (17h) | Ingressos a partir de R$ 50