CRÍTICA / TEATRO / DESERTO: O registro de um artista atormentado

Por Cláudia Chaves | Especial para o Correio da Manhã

Deserto

Pregar no deserto; deserto de ideias; local em que não vive gente; despovoado; que se acha vazio; que não é frequentado; sem movimento; inóspito; abandonado.

O espetáculo "Deserto" faz do árido um oásis, no qual a obra de Roberto Bolaño, o escritor chileno, ganha a primorosa atuação de Renato Livera e a direção e dramaturgia de Luiz Felipe Reis.

Bolaño, morto aos 50 anos — jovem para o atual panorama demográfico —, começou sua carreira como poeta, mas ganhou reconhecimento mundial por seus romances. Seu estilo une o lirismo da poesia à experimentação narrativa. Entre seus temas recorrentes estão o exílio, a literatura, a violência política e o desencanto pós-utópico da América Latina.

É desse contexto que "Deserto" não busca apenas adaptar textos do autor chileno, mas reinventá-los para uma linguagem cênica que desafia convenções e linearidades. O teatro torna-se um território híbrido, onde palavra, imagem e presença física se entrelaçam numa encenação profundamente marcada pela obra de Bolaño. As projeções tornam-se extensão do corpo e da palavra. Frases projetadas nos remetem a pensamentos interrompidos, epígrafes descoladas do tempo, notas de um diário mental em estado de combustão. Imagens cruas e delicadas coexistem, criando um diálogo silencioso com o texto falado — ora em tom íntimo, ora cortante como uma confissão tardia.

Dessa forma, "Deserto" é um mergulho em um artista angustiado, com êxito na transposição de sua literatura para o teatro.

SERVIÇO

DESERTO

Teatro Poeira (Rua Sao Joao Batista, 104, Botafogo)

Até 29/6, de quinta a sábados (20h) e domingos (19h)

Ingressos: R$ 100 e R$ 50 (meia)