Concebido inicialmente como um concerto de sapateado, "Touro{Bull}", é uma peça coreográfica que tem como tema a ancestralidade feminina na cultura do sertão do Cariri Cearense. O espetáculo entra em sua última semana no Mezanino do Sesc Copacabana.
A obra transita por diversos ritmos brasileiros, como o maracatu, o samba, o baião, e com toques de orixás. Sua trilha sonora original dialoga com os batuques dos pés da atriz, dançarina e coreógrafa Valéria Pinheiro, que se inspirou nas "pisadas" e "trupés" dos brincantes e das manifestações culturais locais.
"O conteúdo é basicamente sobre a guerreira, a força da mulher sertaneja, a forma como ela se reinventa, se reconstrói e exerce de forma brilhante e harmoniosa essa resiliência. É isso sobre o que o Touro fala. É busca por sobrevivência acima de tudo, e no final do dia, a busca pela alegria. Somos brincantes", explica Valéria.
"Touro{Bull}" é inspirado na sabedoria ancestral das mulheres do Cariri: um touro que gera, nutre e celebra a vida. As principais referências são as memórias de Valéria, atriz, dançarina e coreógrafa nascida em Juazeiro do Norte (CE) e criada com mestras e mestres populares.
No sincretismo religioso brasileiro, a figura do touro está ligada à mitologia do orixá Iansã, orixá que rege a artista, uma performer de 65 anos, com prótese total no quadril direito, que reinventa sua maneira de existir: dançando, sapateando, cantando e trocando alegria em diversos territórios. "O que me inspira neste espetáculo são os meus ancestrais, as guerreiras que de alguma forma digerem e testam a casa, a família e força feminina", completa Valéria.
O carro de boi é o principal elemento cênico, uma carroça com duas rodas grandes, sustentada e puxada por um ou dois bois. Durante dois séculos, o carro de boi foi o principal meio de comunicação e transporte do Cariri para o mundo. O tambor é outro objeto de cena.
Ao tocá-lo, a personagem entra em contato com sua ancestralidade. Enquanto os tambores se comunicam com o imaterial, o carro de boi se comunica com o material.
No figurino, um patchwork de tecidos e aviamentos foi pensado para revelar uma mistura de referências simbólicas, como uma armadura medieval de Joana D'Arc, com virtude e coragem, honra e força e o vermelho de Iansã. Na maquiagem são usadas referências indígenas (urucum), mouros (pontos pretos) e do candomblé.
Já as muletas são uma escolha poética para reforçar a memória e a história da atriz/dançarina/coreógrafa que possui uma prótese total no quadril, que para se ressignificar, precisou implantar, tal qual uma ciborgue, ferramentas em seu corpo. E a mesma coisa acontece com a personagem, que se fere e se reconstrói.
Hoje genuinamente cearense, a Cia Vatá foi fundada em 1994, no Rio, por Valéria. Desde 2000 ancorada no Ceará, ela é uma das companhias brasileiras com representatividade internacional, que apresenta essa mistura entre a cultura tradicional brasileira e a dança contemporânea. A linguagem mestra da Cia Vatá são os ritmos brasileiros e é a partir dessa técnica que a Cia expande o comportamento do corpo acoplando outras linguagens, unindo a música, a dança, o teatro, o circo e a folia.
SERVIÇO
TOURO{BULL}
Mezanino do Sesc Copacabana (Rua Domingos Ferreira, 160)
Até 17/11, de quinta a domingo (20h30)
Ingressos: R$ 30, R$ 15 (meia) e R$ 7,50 (associado Sesc)