O teatro por todas as veias

O trabalho com o teatro, algumas vezes, nos faz encontrar verdadeiros, como se diz na gíria, "monstros" de teatro. Há 10 anos, saindo de um peça esbarrei com um jovem de risada franca, amoroso, que tinha acabado de apresentar um espetáculo completamente diferente do que as pessoas consideram o teatro "certo"( como se isso existisse). "Meu Sangue Ferve Por Você" usava música brega, sentimentos cotidianos considerados. "cafonas", trama juvenil mas que impacta pessoas de qualquer idade. Assim, conheci Pedro Henrique Lopes e comecei a acompanhar seu trabalho com lupa.

Corajoso em experimentar, natural de São Gonçalo e morador da Tijuca, Pedro iniciou sua carreira artística aos 14 anos e, desde então, construiu uma trajetória sólida e diversificada. Formado em Artes Cênicas pela Uni-Rio e Mestre em Comportamento do Consumidor pela FGV, ele está sempre envolvido em múltiplos projetos simultaneamente. Pedro saca com acuidade o que diferentes platéias querem, com isso seus projetos são centrados em nossa brasilidade mais raiz ao mesmo tempo que trata de sentimentos universais.

A sua versatilidade é de uma riqueza porque pode fazer musicais que falam de amor como o atual "Detalhes de Nós Dois" e ser o único, o único autor que está explorando a dor e a covardia causadas pelas torturas da ditadura e pelos ataques às populações de baixa renda, com foco nas mulheres e nas mães pretas. Em "O Que Sobrou" acompanha Dora, a jovem paulistana, que se suicida no Chile. Em "A Cena(não) Muda" conta casos emblemáticos de assassinatos de mulheres pretas e o desespero infindo de suas mães.

Só essa dramaturgia, com os casos reais que demonstram a infinita injustiça do Brasil, já seria suficiente para fazê-lo um dos grandes talentos teatrais deste século 21. Mas Pedro vai além no seu amor pelo Brasil. A série "Grandes Músicos para Pequenos", criada em parceria com o diretor Diego Morais, completa 11 anos em 2024, homenageando grandes nomes da música popular brasileira ao apresentar suas trajetórias de maneira lúdica para o público infantil. Desde sua estreia com "Luiz e Nazinha - Luiz Gonzaga para Crianças", a série já levou mais de 300 mil espectadores ao teatro e recebeu mais de 60 indicações em prêmios teatrais, consolidando seu papel na valorização da cultura brasileira.

Atualmente, Pedro faz parte de nove produções teatrais em todo Brasil. Entre elas, a comédia romântica "Detalhes de Nós Dois" na qual atua e assina o texto; o espetáculo musical infantil "Detetives do Prédio Azul 2 - Um Mistério Musical em MagoWood", que está em circulação nacional; e o já citado "Luiz e Nazinha - Luiz Gonzaga para Crianças".

Além disso, ele também participa de outros trabalhos como o documentário cênico "A Cena (Não) Muda", o monólogo "Gênero: Livre" e os espetáculos infantis "Luccas e Gi em Um Mundo de Magia e Fantasia", "Galinha Pintadinha: em Busca do Natal", e "A Menina do Meio do Mundo - Elza Soares para Crianças", todos em circulação ainda neste ano.

Sobre sua diversidade de projetos, Pedro explica que transitar entre diferentes temas e públicos é parte essencial do seu processo criativo. "As pessoas se confundem quando me veem escrevendo para crianças e, logo em seguida, assinando um espetáculo sobre a ditadura. Para mim, a escrita é uma forma de viajar por universos distintos e dar voz a diferentes histórias. O bom de ser autor é poder colocar no papel tudo aquilo que existe dentro da nossa imaginação", afirma.

"Quando começamos esse projeto, nosso foco era criar espetáculos que dialogassem com todas as idades e que, ao mesmo tempo, valorizassem a cultura do Brasil", comenta Pedro. Ele também destaca a importância de respeitar o entendimento do público infantil, afirmando que o processo de comunicação com as crianças é muito mais complexo do que se imagina. "As crianças estão descobrindo o mundo, e seus questionamentos são muito mais amplos do que aparentam. Elas merecem espetáculos que dialoguem com essa percepção mais profunda", conclui.

Pedro andou pela Disney, novelas, é curador da melhor programação infantil no Teatro Ri-Happy no Jardim Botânico, fala da dor, do amor, das canções, dos horrores da injustiças, mas sempre ostentando o sorriso do menino que fez traquinagem e deu certo. Segue Pedro, vai ser dramaturgo na vida.

SERVIÇO

DETALHES DE NÓS DOIS

Teatro Clara Nunes (Shopping da Gávea - Rua Marquês de São Vicente, 52 - 3º piso)

Até 22/9, sexta e sábado (20h) e domingo (19h)

Ingressos: R$ 130 e R$ 65 (meia)