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Reflexões sobre família, tempo e ancestralidade no palco

Em "Têmpora", acompanha-se a convivência de três irmãos — uma cientista, um filósofo e um terapeuta holístico — que estão em um ponto crítico de suas vidas, lidando com a mãe com um quadro de alzheimer | Foto: Hugo Tolipan/Divulgação

Contemplada pelo Sesc Pulsar, a peça "Têmpora" aborda temas como ancestralidade, relações familiares, tecnologia e o eterno ciclo da vida, trazendo à cena o cotidiano de uma família que está vivenciando um momento delicado, propiciando uma perspectiva contemporânea e paralelamente sagrada sobre o impacto do tempo em suas vidas. Sob direção, texto e idealização de Simone Kalil, a peça está em cartaz no Teatro 2 do Sesc Tijuca.

Em "Têmpora", acompanha-se a convivência de três irmãos — uma cientista, um filósofo e um terapeuta holístico — que estão em um ponto crítico de suas vidas, lidando com a mãe com um quadro de alzheimer em quarto, em outro cômodo a esposa da cientista dando a luz em um parto humanizado que dura 24h. Enquanto os irmãos dialogam, a presença de Iroko, o Orixá do Tempo, simbolizando ancestralidade e continuidade, permeia a narrativa — a figura de Tempo, que também é Deus, é interpretada por uma mulher negra que vai rejuvenescendo e que compartilha o espaço cênico com os outros personagens, mas por meio de uma outra dimensão, trazendo sabedoria através de provérbios africanos.

A leitura da obra "Performance do Tempo Espiralar" de Leda Maria Martins que motivou a criação do espetáculo, usando-se conceitos elaborados pela escritora, como corpo tela e a espiralidade do tempo e dos corpos em cena. Já a montagem explora a complexidade das relações humanas e o eterno ciclo da vida através de um enredo que desafia a linearidade temporal.

Em "Têmpora" há um diálogo dinâmico entre o texto e a performance, como Jefferson Almeida destaca. "Parte do texto é composta por reflexões que desenvolvemos na sala de ensaio, a partir do tema principal; nossas falas foram transmitidas aos personagens em um processo que se aproxima do que se costuma chamar de 'processo colaborativo', um tipo de criação na qual o texto já nasce íntimo de quem fala uma vez que ecoa as vozes reais. É um tipo de processo no qual atores, direção, dramaturgia… em que esses limites são borrados, em que as funções se interpenetram", explica.

Para Ney Madeira e Dani Vidal, Têmpora foi um exercício de síntese. "Na primeira leitura do texto foi difícil imaginar um conceito que refletisse o despojamento da cena, mas a ida ao primeiro ensaio nos trouxe a água como elemento do figurino. A água que dá vida e que resseca com o tempo", ressalta. A metáfora foi traduzida de forma literal no conceito de "corpo tela", no uso da água para aderir os figurinos aos corpos dos atores. O figurino da personagem Tempo faz alusão ao orixá Iroko, na utilização de crochê de palha em sua composição.

O espetáculo traz questões atuais, como os efeitos da tecnologia nas relações e na vida, além da ansiedade induzida pela sociedade acelerada. No entanto, apesar de sua densidade temática, a peça é feita com humor, refletindo a vida cotidiana, um texto realista, dentro de uma estética não realista. É através de uma abordagem cotidiana, entrelaçada com um humor sarcástico, que "Têmpora" convida o público a refletir sobre a condição humana moderna, espelhando-se nas experiências dos personagens e na ancestralidade. "É possível se reconhecer na relação entre os irmãos e paralelamente a isso, há a figura onipresente do Orixá do Tempo, nos fazendo refletir sobre a sabedoria ancestral, o significado de família e a influência do tempo na humanidade", conclui Simone Kalil.

SERVIÇO

TÊMPORA

Teatro 2 Sesc Tijuca (Rua Barão de Mesquita, 539)

Até 28/4, de quinta a sábado (19h) domingos (18)

Ingressos: R$ 30, R$ 15 (meia), R$ 7,50 (associado Sesc) e gratuito (PCD)

 

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