Por: Karoline Cavalcante

Relator de Eduardo Bolsonaro tem relações com bolsonarismo

Freitas já classificou Eduardo como seu "amigo" | Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados

A escolha do deputado Delegado Marcelo Freitas (União Brasil-MG) como relator do processo contra Eduardo Bolsonaro (PL-SP) no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados escancara um embate entre competência técnica e alinhamento político. A avaliação é do cientista político Elias Tavares, em entrevista ao Correio da Manhã. Para ele, de um lado, Freitas acumula experiência em pautas de grande impacto — como a relatoria da Reforma da Previdência. De outro, sua proximidade com o bolsonarismo levanta dúvidas sobre a imparcialidade do parecer.

A designação do relator ocorreu na última sexta-feira (26), após sorteio de uma lista tríplice que incluía ainda Duda Salabert (PDT-MG) e Paulo Lemos (Psol-AP). A escolha foi oficializada pelo presidente do colegiado, Fábio Schiochet (União Brasil-SC). A partir da nomeação, Freitas terá até dez dias úteis para apresentar um parecer preliminar sobre a admissibilidade da denúncia.

Reações

O processo, que pode resultar na cassação do mandato de Eduardo, foi instaurado a partir de uma representação apresentada pelo Partido dos Trabalhadores (PT). A sigla acusa o deputado de quebra de decoro parlamentar por ataques a instituições brasileiras — especialmente ao Supremo Tribunal Federal (STF) — durante sua estadia nos Estados Unidos, além da disseminação de discursos considerados antidemocráticos.

A nomeação de Freitas gerou reações no meio político, principalmente por seu histórico de alinhamento ao bolsonarismo. Ex-delegado da Polícia Federal e em seu segundo mandato na Casa Baixa, o parlamentar já se referiu a Eduardo Bolsonaro como “amigo” e tem feito críticas recorrentes ao STF. Em 2023, defendeu a anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro — quando manifestantes invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília — e apoiou a chamada “PEC da Blindagem”, que dificultaria investigações contra parlamentares e foi enterrada na última semana pelo Senado Federal.

Perda de mandato

No entanto, como observa Tavares, o maior risco enfrentado por Eduardo pode não estar diretamente relacionado à relatoria. Desde o fim de sua licença parlamentar, em julho, o deputado acumula faltas injustificadas. Tentativas de seguir licenciado ou atuar remotamente fracassaram, e até a estratégia de assumir a liderança da Minoria como forma de se proteger foi rejeitada pela Mesa Diretora e pelo presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB).

“O resultado é que Eduardo passa a encarar não só um julgamento político, mas também a aplicação objetiva do regimento, que prevê a possibilidade de perda de mandato por excesso de ausências”, destacou o especialista.

Conselho de Ética

O deputado pode ser enquadrado no artigo 55 da Constituição Federal, que prevê a perda de mandato de parlamentares que faltarem a um terço das sessões ordinárias sem justificativa aceita. O PT argumenta que as ausências do deputado são deliberadas e dolosas, configurando infração regimental.

A tramitação do caso no Conselho de Ética segue rito definido: após o parecer preliminar, haverá uma fase de instrução, com coleta de provas e depoimentos, que pode durar até 90 dias úteis. Ao fim, o relatório final será votado pelos membros do colegiado e, se aprovado, encaminhado ao plenário da Câmara, onde a cassação depende do voto favorável de pelo menos 257 deputados.

Atualmente, Eduardo responde a quatro representações no Conselho de Ética, três delas apresentadas por partidos de oposição — duas pelo PT e uma pelo PSOL. O presidente do colegiado já sinalizou a intenção de unificar a tramitação dos casos, o que pode acelerar os desdobramentos.

Encruzilhada

Na análise de Tavares, a situação do deputado é delicada em duas frentes: “Essa combinação coloca Eduardo em uma posição de extrema vulnerabilidade. Politicamente, ainda conta com apoios dentro do Congresso, mas institucionalmente se vê encurralado: o processo no Conselho de Ética e o risco de cassação por faltas correm em paralelo. Nesse cenário, o relatório de Freitas ganha um papel importante, mas não é suficiente por si só para garantir a sobrevivência parlamentar. O jogo é duplo: depende tanto da articulação política quanto do rigor regimental”, iniciou.

“Em suma, ele não está diante de uma simples disputa política, mas de uma encruzilhada institucional que pode definir seu futuro no Parlamento”, concluiu o cientista político à reportagem.