Flávio Bolsonaro passa à frente entre candidatos de direita
Primeira pesquisa sem Jair Bolsonaro muda o cálculo eleitoral de Tarcísio para 2026
A mais recente rodada da pesquisa Genial/Quaest, divulgada nesta terça-feira (16), trouxe um dado que mexeu com o xadrez da direita brasileira de olho nas eleições presidenciais de 2026: nos cenários pesquisados, de primeiro e de segundo turnos, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aparece à frente de outros nomes do campo conservador, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). O resultado não apenas reposiciona Flávio no debate nacional, como reabre discussões internas sobre liderança, herança política e estratégia eleitoral do bolsonarismo após a inelegibilidade de Jair Bolsonaro.
A Quaest ouviu 2.004 pessoas entre 11 e 14 de dezembro. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais. Em todos os cenários testados de primeiro turno, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lidera, oscilando, dependendo dos candidatos, entre 41% e 34%. E em todos os cenários, Flávio agora aparece em segundo, oscilando entre 27% e 21%. Em um eventual segundo turno, Lula teria 46% e Flávio, 36%. É mais do que teria Tarcísio e o governador do Paraná, Ratinho Jr (PSD): ambos teriam 35%.
Nome em teste
Para o professor de políticas públicas do Ibmec Brasília, Eduardo Galvão, o desempenho de Flávio Bolsonaro cumpre hoje um papel duplo. “A pesquisa indica as duas coisas ao mesmo tempo, mas com pesos diferentes. No estágio atual, Flávio Bolsonaro ainda funciona principalmente como um instrumento de medição da força do bolsonarismo sem Jair Bolsonaro na urna”, avalia. Segundo ele, esse teste é central para que a direita entenda até que ponto o eleitorado permanece fiel ao projeto político associado ao ex-presidente.
Ao mesmo tempo, Galvão pondera que o desempenho não pode ser tratado como meramente simbólico. “O fato de aparecer à frente de outros nomes do campo conservador confere densidade política à sua pré-candidatura e impede que ela seja tratada apenas como um balão de ensaio irrelevante”, afirma. Na leitura do especialista, Flávio ainda não é um candidato plenamente consolidado, mas já ultrapassou a condição de experimento descartável.
Efeito Tarcísio
O avanço de Flávio Bolsonaro nas simulações tem impacto direto sobre outros projetos da direita, especialmente o de Tarcísio de Freitas. Para Galvão, o recado da pesquisa é claro: o bolsonarismo continua sendo o eixo organizador do campo conservador. “O desempenho de Flávio reduz o espaço político de Tarcísio como alternativa viável fora do núcleo familiar Bolsonaro”, analisa.
Essa dinâmica impõe um dilema estratégico ao governador paulista. Confrontar o espólio bolsonarista pode significar desgaste precoce, enquanto preservar capital político pode ser mais vantajoso para ciclos futuros. “A pesquisa sinaliza que qualquer projeto competitivo à direita passa, goste-se ou não, pela base bolsonarista”, resume Galvão.
Arthur Wittenberg, professor de ciência política do Ibmec Brasília, vai na mesma linha, mas destaca que Tarcísio não sai fragilizado. Para ele, o governador pode se beneficiar do cenário. “O desempenho do Flávio puxa o sobrenome de volta para o centro do tabuleiro, mas Tarcísio fica confortável: pode entregar apoio pesado a um nome do campo e preservar seu ativo principal, que é a reeleição com baixa tensão”, afirma.
Bênção necessária
Apesar do capital simbólico do sobrenome, especialistas são unânimes em apontar que Flávio Bolsonaro depende diretamente de Jair Bolsonaro para se viabilizar como candidato competitivo. “Ele entra com o capital simbólico do sobrenome, mas isso não é suficiente”, diz Galvão. Segundo ele, o bolsonarismo é um movimento altamente personalista, no qual a transferência de liderança não ocorre de forma automática.
Wittenberg reforça esse ponto ao destacar que o apoio do ex-presidente precisa ser mais do que protocolar. “Não é só abençoar; é sinalizar comando, reduzir disputa interna e deixar claro para elites partidárias e regionais quem é o candidato da vez”, afirma. Sem esse gesto disciplinador, avalia, a candidatura corre o risco de permanecer indefinidamente no campo do teste, sem virar um projeto de poder consolidado.
Rejeição elevada
Se por um lado a liderança nas simulações fortalece Flávio Bolsonaro internamente, por outro ela expõe um obstáculo central: a rejeição. Dados da própria Quaest mostram que o senador aparece com cerca de 60% de eleitores que afirmam “conhecer e não votar”, índice semelhante ao de Jair Bolsonaro e superior ao de outros nomes da direita, como Ratinho Junior, Zema e o próprio Tarcísio.
Na avaliação de Galvão, a candidatura de Flávio tanto ameaça quanto beneficia o presidente Lula, dependendo do ângulo. “Ela ameaça ao manter viva uma base conservadora mobilizada, mas pode fortalecer Lula se elevar a rejeição no eleitorado moderado e empurrar o centro para um voto defensivo”, analisa.
Cenário aberto
Apesar do impacto imediato, especialistas concordam que a pesquisa não encerra o debate sucessório da direita. “A estratégia para 2026 segue em aberto”, afirma Galvão, lembrando que variáveis como economia, segurança pública, desempenho do governo Lula e eventuais crises políticas ainda podem alterar significativamente o cenário.
Wittenberg acrescenta que a eleição passada, decidida pela menor diferença da história recente no segundo turno, serve de alerta. “Risco sempre existe. Se a direita conseguir unificar discurso e reduzir rejeição sem transformar a disputa em um plebiscito sobre Bolsonaro, o cenário pode ficar mais acirrado e imprevisível”, conclui.
Por ora, Flávio Bolsonaro emerge como peça central desse tabuleiro: pode vir a ser candidato de fato ou o principal ativo de negociação da direita. Em ambos os casos, a pesquisa deixa claro que o bolsonarismo segue longe de sair de cena em 2026.
