Congresso reage rapidamente à blindagem do STF por Gilmar

Ministro nega intenção diz que apenas aplicou a Constituição

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Gilmar tem dez pedidos de impeachment contra ele protocolados

A decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu uma disputa institucional e reacendeu o debate sobre a forma como o país trata o impeachment de ministros da Corte. Na última quarta-feira (3), o ministro definiu que somente o procurador-geral da República pode apresentar denúncias por crimes de responsabilidade contra integrantes do Supremo ao Senado. Até então, a Lei 1.079/1950 autorizava que “qualquer cidadão” fizesse esse tipo de protocolo.

Ao suspender esse trecho da legislação, Gilmar afirmou que o uso indiscriminado de pedidos de impeachment tem criado ambiente de “intimidação” contra o Judiciário. A medida ainda será analisada pelo plenário do STF, em sessão virtual marcada entre os dias 12 e 19 de dezembro.

Crise ampliada

A reação do Congresso e a tensão dentro do STF ajudam a dimensionar o impacto da liminar. Para o advogado e analista político Melillo Dinis, a decisão chega em um momento de desgaste entre os Poderes. Segundo ele, o movimento de Gilmar Mendes amplia a crise institucional porque altera a forma como o impeachment de ministros pode ser provocado.

Melillo avalia que a principal mudança está no filtro para acionar o Senado. “Se o plenário confirmar a liminar, somente o procurador-geral poderá ingressar com o pedido de juízo político”, afirma. Apesar disso, ele destaca que o papel dos senadores permanece o mesmo. “O Senado continua encarregado de processar e julgar. O que muda é a forma de representação, que antes era aberta a qualquer cidadão e agora fica restrita ao PGR”, explica.

Ele também comenta a acusação de blindagem feita por parlamentares. “A hipótese de blindagem é essencialmente política”, diz. Para o especialista, a crise atual não surge isolada. “A reação é, na verdade, uma disputa por espaços de poder”, afirma, citando embates acumulados ao longo dos últimos anos. Para ele, o cenário envolve um conflito entre Poderes, mas com um peso adicional. “O STF tem predominância como guardião da Constituição. O desafio é garantir legitimidade para decisões que deveriam sempre olhar para o bem comum e não para interesses corporativos”, afirma.

Reações imediatas

No Senado, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre, classificou a liminar como tentativa de “usurpar prerrogativas do Legislativo” e defendeu que mudanças nas regras de impeachment só podem ser feitas pelo Parlamento. Ele também mencionou a PEC 8/2021, aprovada pelos senadores em 2023, que limita decisões monocráticas e ainda aguarda análise da Câmara.

Na Câmara, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou o Projeto de Lei 3.640/2023, que restringe decisões monocráticas de ministros do STF contra leis aprovadas pelo Congresso. O texto foi aprovado em caráter terminativo e não precisa passar pelo plenário da Câmara. A proposta segue agora para apreciação do Senado Federal.

A Advocacia-Geral da União (AGU) pediu a reconsideração da liminar, mas o ministro rejeitou o pedido, afirmando que esse tipo de recurso “não é contemplado pelo ordenamento jurídico”. Para Gilmar, a decisão busca encerrar um “estado de coisas incompatível com a Constituição”.

Nos bastidores

Na noite de quarta-feira, Alcolumbre telefonou para Gilmar. Segundo relatos, disse que o ambiente no Senado “é péssimo” e que seria “inevitável” uma reação do Legislativo caso não houvesse gestos de pacificação. O ministro argumentou que a decisão foi técnica e que ainda é possível construir um entendimento antes do julgamento do dia 12.

Durante o Fórum JOTA de Segurança Jurídica, realizado na quinta-feira (4), em Brasília, o ministro Flávio Dino avaliou que há “excesso” no número de pedidos de impeachment contra integrantes do STF, comparando o cenário a mecanismos de “perseguição e chantagem”.

O presidente da Câmara, Hugo Motta, também comentou a crise. Disse que a disputa entre Supremo e Senado gera “fragilidade institucional”, mas avaliou que os poderes devem encontrar uma saída negociada. Ele atribuiu o acirramento do debate à polarização política.

Gilmar Mendes, que também participou do evento, afirmou que sua decisão não busca proteger a Corte, mas “aplicar a Constituição”. Ele mencionou que a medida se baseia no volume de pedidos de impeachment para justificar a necessidade de revisão da lei. Atualmente, há 81 solicitações pendentes no Senado. Alexandre de Moraes lidera com 43, seguido por Luís Roberto Barroso (20), já aposentado, e pelo próprio Gilmar (10).