Primeira Turma do STF mantém Bolsonaro preso

Os quatro ministros consideraram pertinente a prisão preventiva pelo descumprimento de medidas cautelares

Por Rudolfo Lago

Demais ministros seguiram Moraes e mantiveram Bolsonaro preso

Não teria sido a primeira vez que o ex-presidente Jair Bolsonaro desrespeitou medidas cautelares. Inclusive, a determinação anterior, de prisão domiciliar e uso de tornozeleira devia-se ao fato de Bolsonaro ter participado, em vídeo, de uma manifestação popular quando estava proibido de ações desse tipo. Por essa razão, os quatro ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram manter a decisão do ministro Alexandre de Moraes, que no sábado (22) determinou a prisão preventiva do ex-presidente. Desde então, Bolsonaro ocupa uma sala na sede da Polícia Federal (PF) em Brasília.

"Não há dúvidas sobre a necessidade da conversão da prisão domiciliar em prisão preventiva, em virtude da necessidade da garantia da ordem pública, para assegurar a aplicação da lei penal e do desrespeito às medidas cautelares anteriormente aplicadas", disse Moraes. "Jair Messias Bolsonaro é reiterante no descumprimento das diversas medidas cautelares impostas" completou Alexandre de Moraes, o primeiro a votar, em julgamento no plenário virtual.

Os demais ministros da Primeira Turma – Flavio Dino, Cristiano Zanin e Cármem Lúcia – acompanharam o voto de Moraes. A Primeira Turma do STF está somente com quatro integrantes desde que Luiz Fux pediu mudança para a Segunda Turma, após divergir dos colegas e absolver os réus do chamado “núcleo crucial” da trama golpista, que inclui Bolsonaro.

A prisão, porém, não foi determinada em função do julgamento da trama golpista. Refere-se a uma outra ação, na qual Bolsonaro e seu filho, Eduardo Bolsonaro, respondem por tentar coagir a Justiça no julgamento. Por conta desse julgamento, uma decisão restringiu Bolsonaro do uso de redes sociais e manifestações políticas. O descumprimento dessas medidas cautelares, no entendimento do STF, o levou primeiro à prisão domiciliar. O descumprimento agora novamente de outras medidas – inclusive com a tentativa de violação da sua tornozeleira eletrônica – o levou à prisão preventiva.

Descumprimentos

No seu voto, Moraes afirmou que em julho e agosto Bolsonaro já descumprira a determinação de não usar redes sociais. "Em decisão de 4.ago.2025, em face do reiterado descumprimento das medidas cautelares impostas anteriormente, decretei a prisão domiciliar de Jair Messias Bolsonaro, ressaltando expressamente que o descumprimento de suas regras ou de qualquer uma das medidas cautelares implicaria na sua revogação e na decretação imediata da prisão preventiva", escreveu em seu voto.

"A continuidade no desrespeito às medidas cautelares, entretanto, não cessou. Pelo contrário, ampliou-se na última sexta-feira, dia 21.nov, quando Jair Messias Bolsonaro violou dolosa e conscientemente o equipamento de monitoramento eletrônico", continuou.

Fugas

Outro fator que pesou na avaliação dos ministros foi a ação de pessoas próximas ao ex-presidente que se ausentaram do país, o que poderia sinalizar uma intenção semelhante de Bolsonaro. Essa posição foi ressalta pelo presidente da Primeira Turma, ministro Flávio Dino, em seu voto. Estão nos Estados Unidos o filho do ex-presidente, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), que saiu do país na semana passada. E na Itália encontra-se presa a deputada Carla Zambelli (PL-SP).

"As fugas para outros países de deputados federais perpetradores de crimes similares e conexos, com uso de ardis diversos, demonstram a ambiência vulneradora da ordem pública em que atua a organização criminosa chefiada pelo condenado, compondo um quadro que, lamentavelmente, guarda coerência com o conjunto de ilegalidades já reprovadas pelo Poder Judiciário", disse o ministro. "As fugas citadas mostram profunda deslealdade com as instituições pátrias, compondo um deplorável ecossistema criminoso".

Vigília

Em seu voto, Flávio Dino também mencionou riscos à ordem pública que poderiam acontecer com a vigília convocada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) para acontecer em frente ao condomínio onde o ex-presidente mora no bairro Jardim Botânico em Brasília.

Para Dino, a vigília poderia gerar tumulto em uma região “densamente povoada”. Poderia expor “moradores e propriedades privadas a potenciais danos e situações de perigo iminente”. Ele acrescenta: "Pertinente lembrar que entre os moradores em risco estariam inclusive idosos e crianças, o que sublinha a insuportável ameaça em curso".

O risco da situação com a vigília sair do controle foi um dos pontos que levou à Polícia Federal a pedir a prisão preventiva no sábado. A violação da tornozeleira agravou o quadro. Aliados de Bolsonaro, porém, criticam a decretação da prisão pelo ato convocado por Flávio Bolsonaro. Alegam que manifestações políticas são um direito de qualquer cidadão, assegurado pela Constituição.

Surto

Na audiência de custódia a que foi submetido no domingo (23), Bolsonaro disse à juíza Luciana Sorrentino que tentou violar a tornozeleira eletrônica como consequência de um surto psicótico. Antes, porém, quando o alarme da Polícia Federal soou na madrugada de sábado (22) indicando que alguma coisa tinha acontecido com o aparelho, ele dissera à diretora-adjunta da Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal, Rita de Cassia Gaio Siqueira, que tinha tentado abrir a caixa da tornozeleira “por curiosidade”.

"Usei ferro quente, ferro quente aí, curiosidade", disse na ocasião. Na audiência de custódia, porém, Bolsonaro afirmou que teria sofrido um quadro de "confusão mental e alucinações"pela associação de medicamentos que tomara. Nessa situação, ele afirma ter imaginado que poderia haver um aparelho de escuta escondido na caixa da tornozeleira e, por isso, tentou abri-la. Parou, segundo ele, “quando caiu na razão”.

Diante da alegação do “surto”, a defesa de Bolsonaro pede a revogação da prisão preventiva. Segundo a defesa, “é inequívoco que inexistiu qualquer tentativa de fuga ou de se furtar à aplicação da lei penal".

A defesa de Bolsonaro já vinha preparando um pedido de prisão domiciliar para o momento em que se iniciasse a execução da pena pela condenação no julgamento por tentativa de golpe, por conta dos problemas de saúde do ex-presidente. Embora ainda haja possibilidade de recursos, estima-se que o processo por tentativa de golpe poderá transitar em julgado (chegar ao seu final) na próxima semana.