Segurança Pública se prepara para receber julgamento de Bolsonaro

Forças Armadas, dos Três Poderes e policiais reforçam atuação

Por Karoline Cavalcante

Julgamento de primeiro núcleo do plano de golpe de Estado começa nesta terça (2)

Com o início do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete réus — ex-integrantes do alto escalão do governo federal — marcado para iniciar nesta terça-feira (2), o Exército Brasileiro reafirmou que qualquer tipo de manifestação deve ocorrer “nos limites da Constituição Federal, das leis e das decisões judiciais”. A declaração busca afastar as instituições militares de qualquer envolvimento direto ou simbólico com atos políticos durante o período que envolve o processo no Supremo Tribunal Federal (STF) e as comemorações da Semana da Pátria.

“A Instituição respeita a livre manifestação política, desde que realizada em locais adequados e na forma prevista pela legislação vigente”, afirmou o Exército ao Correio da Manhã.

A ordem inclui a proibição de manifestações mesmo em caso de uma eventual condenação de Bolsonaro com cumprimento de pena em instalação militar e foi adotada em um contexto de forte tensão institucional, já que dos oito réus que compõem o núcleo central da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), seis são militares.

Segurança

O STF analisa acusações que envolvem tentativa de golpe de Estado, organização criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, além de crimes contra o patrimônio público. Além das equipes de policiais judiciais da Suprema Corte, foi montada uma força-tarefa composta por policiais judiciais do Distrito Federal e de outras localidades. Essas equipes trabalharão 24 horas por dia, sete dias por semana até o final do julgamento.

Os servidores e colaboradores que trabalham na sede do STF foram dispensados para trabalhar de forma remota nos dias de julgamento, com exceção aos que desempenham serviços indispensáveis à rotina de trabalho.

Paralelamente, a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) mobilizou um forte esquema para proteger áreas sensíveis da capital federal, especialmente a Praça dos Três Poderes. Gradis foram instalados em torno do Palácio do Planalto, da Alvorada e do Jaburu, e a vigilância foi ampliada com uso de drones, revistas em mochilas de transeuntes e aumento no efetivo policial.

“Imprescindíveis”

Ao Correio da Manhã, o membro do Conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Cássio Thyone, avaliou que as precauções que estão sendo implementadas, são, de fato, “realmente imprescindíveis”.

“Embora se espere que intercorrências sejam mínimas, é crucial reconhecer que, em qualquer cenário, a eliminação total de riscos é uma impossibilidade. Conclui-se, portanto, que a elaboração de um plano de contingência e segurança era, de fato, essencial, em virtude da complexidade e da relevância deste julgamento”, afirmou para a reportagem. Segundo Thyone, porém, é pouco provável que haja grandes protestos nas proximidades do STF, “mas temos que considerar que existe, claro, a possibilidade de ocorrência de manifestações”.

O especialista internacional em Segurança Leonardo Sant’Anna, explica que a capital federal detém todos os artifícios para lidar com quaisquer atividades com grandes volumes populacionais, além de uma arquitetura favorável. “A novidade é que, diferentemente do que ocorreu no 8 de janeiro, o que se espera é que a responsabilidade de segurança interna, pessoal ou patrimonial de cada órgão máximo do Executivo, Legislativo ou Judiciário, já que foram criadas, assumam as suas verdadeiras responsabilidades, as quais naturalmente surgiram depois de sua criação”, iniciou.

“Esse vai ser um excelente momento para colocar a prova o conhecimento, treinamento, poder logístico, capacidade de planejamento e implementação de segurança dessas novas instituições policiais que surgiram especificamente para as casas judiciais do governo federal”, completou Sant’Anna à reportagem.

O rito

O caso, considerado histórico e inédito desde a redemocratização, atraiu atenção internacional. O julgamento recebeu mais de 500 pedidos de credenciamento de jornalistas e mais de três mil solicitações de cidadãos interessados em acompanhar as sessões da sala da Primeira Turma. Apenas os primeiros 1.200 inscritos foram contemplados, e a maioria acompanhará a sessão por meio de um telão na área externa. As sessões do julgamento estão marcadas para os dias 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro — nos dias 2, 9 e 12, as sessões acontecerão em dois turnos, manhã e tarde; nos dias 3 e 10, apenas no período da manhã.

O rito do julgamento será conduzido pelo presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin, que abrirá a sessão e concederá a palavra ao relator, ministro Alexandre de Moraes, para leitura do relatório. Em seguida, a acusação será apresentada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, com até duas horas para exposição. As defesas de cada um dos réus terão até uma hora para suas sustentações orais.

Moraes será o primeiro a votar, podendo analisar previamente questões processuais levantadas pela defesa, como pedidos de nulidade da delação premiada do ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel Mauro Cid, alegações de cerceamento e solicitações de absolvição. Depois dele, os votos seguirão com os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e, por último, Zanin. A condenação ou absolvição ocorrerá por maioria simples: três votos bastam.

Embora uma eventual condenação não resulte em prisão automática, os réus podem ser levados a cumprir pena em unidades militares ou alas especiais, conforme determina a legislação para oficiais das Forças Armadas. A Corte ainda pode enfrentar um pedido de vista de algum dos ministros, o que suspenderia temporariamente o julgamento, mas, segundo o regimento do STF, o processo precisaria retornar à pauta em até 90 dias.

Às vésperas

Nas vésperas do julgamento, um episódio aumentou ainda mais a tensão no centro do poder. No último sábado (30), um homem de 45 anos foi detido na Praça dos Três Poderes após ameaçar explodir supostos artefatos. A ocorrência mobilizou equipes do Batalhão de Choque e do Corpo de Bombeiros. Segundo avaliação médica, tratava-se de um surto psicótico. O homem foi encaminhado para uma unidade de pronto atendimento, e a área foi rapidamente isolada.

No mesmo dia, Moraes determinou que a Polícia Penal do DF intensificasse a vigilância presencial na área externa da casa de Jair Bolsonaro, onde o ex-presidente cumpre prisão domiciliar com monitoramento por tornozeleira eletrônica. A decisão atende a um pedido da Polícia Federal, que apontou vulnerabilidades no local, como “pontos cegos” entre terrenos vizinhos, além de riscos relacionados a eventuais tentativas de fuga. Moraes autorizou ainda que todos os veículos que saírem da residência sejam vistoriados, com registro detalhado de motoristas e passageiros, e envio diário dos relatórios ao STF.

Apesar da decisão de reforçar a vigilância, a PGR considerou na última sexta-feira (29) que, no momento, não há necessidade de adotar medidas mais severas, mas reconheceu a importância de ações para evitar qualquer possibilidade de fuga, especialmente diante de relatos sobre pedidos de asilo político e ligações com dirigentes estrangeiros.