Por: Karoline Cavalcante

Por unanimidade, Senado enterra PEC da Blindagem e rejeita retorno de privilégios

Alcolumbre decidiu seguir o regimento e confirmou o arquivamento definitivo da matéria | Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, conhecida como PEC da Blindagem, foi rejeitada por unanimidade nesta quarta-feira (24) pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal. Os senadores presentes aprovaram, nesta quarta-feira (24), o parecer do relator, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que se colocou contrário ao texto inicial, que previa a exigência de autorização prévia do Congresso Nacional para processar criminalmente parlamentares.

A matéria, aprovada pela Câmara dos Deputados na última terça-feira (16), pretendia restaurar mecanismos de proteção vigentes até 2001, impondo voto secreto do Legislativo como pré-requisito para que membros das Casas pudessem responder judicialmente por crimes comuns. O conteúdo também previa foro privilegiado para presidentes de partidos e regras específicas para prisões em flagrante.

Parecer

O relator classificou a proposta como “um golpe fatal na legitimidade do Parlamento” e recomendou sua rejeição completa. No parecer, Vieira argumentou que sob aparência de constitucionalidade, o que efetivamente se pretende com a mudança não é dar condições plenas aos parlamentares para exercerem sua atividade-fim, mas sim “blindá-los das penas e demais consequências legais do cometimento de crimes das mais variadas espécies”.

“O exercício do mandato já é suficientemente protegido pela Constituição, com a imunidade material e o direito da Casa Legislativa de sustar os processos que entender abusivos. Assim, a PEC teria o real objetivo de proteger autores de crimes graves, como corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, o que configura claro desvio de finalidade e, consequentemente, inconstitucionalidade”, argumentou.

Reações

Durante os debates, senadores de diferentes campos políticos se uniram em críticas contundentes à proposta. Para o senador Fabiano Contarato (PT-ES), tratava-se de um “escárnio com a população brasileira”. Já o senador Sergio Moro (União-PR), ex-juiz da Lava Jato, afirmou que a aprovação da PEC representaria um “retrocesso inaceitável” e um atentado aos avanços obtidos com a Emenda Constitucional de 2001, que restringiu a imunidade processual de parlamentares. O senador Eduardo Girão (Novo-CE) criticou o uso do voto secreto na proposta: “A diferença entre o remédio e o veneno é a dose, e a iniciativa poderia até ter um objetivo nobre, mas não tem o menor cabimento, em pleno século 21, a gente ter voto secreto para admissão de processos”.

Na avaliação do senador Carlos Portinho (PL-RJ) o projeto não tem bandeira partidária, “pois não é uma pauta da esquerda, da direita, ou do centro. É um absurdo para o país”. Segundo o senador Rogério Carvalho (PT-SE), o Congresso não pode abrigar “cometedores de crimes sofisticados”. A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) concluiu: “Não adianta emenda, nem penduricalho. Precisamos enterrar de vez essa PEC, que aprofundaria a desconfiança da sociedade”.

‘Sepultamento definitivo’

Sob o comando do senador Otto Alencar (PSD-BA), presidente da CCJ, o colegiado acelerou a tramitação da PEC após acordo com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Ao fim da votação, Alencar declarou que a decisão representa “o sepultamento definitivo” da matéria. Embora regimentalmente o texto não pudesse seguir ao plenário sem votos contrários, Otto já havia sinalizado a intenção de levar o tema à deliberação dos 81 senadores.

No entanto, ao abrir a sessão plenária no início da tarde desta quarta, Alcolumbre decidiu seguir o regimento interno da Casa e confirmou o arquivamento definitivo. "Não há o que esclarecer. Assim, tendo em vista que a CCJ aprovou, de forma unânime, o parecer concluindo pela inconstitucionalidade da PEC e no mérito pela sua rejeição. Esta Presidência, com amparo regimental claríssimo, determina seu arquivamento, sem deliberação de plenário", disse o presidente do Senado.

A repercussão negativa foi imediata e intensa. Protestos organizados por movimentos civis tomaram as ruas das 27 capitais brasileiras no último domingo (21), evidenciando a rejeição popular ao projeto. Em São Paulo, mais de 42 mil manifestantes se reuniram na Avenida Paulista, enquanto no Rio de Janeiro, a Praia de Copacabana registrou público superior a 41 mil pessoas, segundo estimativas do Monitor do Debate Político do Cebrap.