O governo brasileiro manifestou, nesta segunda-feira (22), "profunda indignação" após o anúncio dos Estados Unidos de que a Lei Magnitsky seria aplicada à Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e ao instituto Lex, vinculado à família do magistrado. A medida, que já atinge Moraes desde o final de julho, foi divulgada pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros do Departamento do Tesouro dos EUA.
Em uma nota oficial, o Ministério das Relações Exteriores condenou a decisão, considerando-a mais uma tentativa de ingerência dos EUA nos assuntos internos do Brasil. O governo brasileiro classificou a sanção como uma “justificativa falsa” para a imposição de restrições. "Esse novo ataque à soberania brasileira não logrará seu objetivo de beneficiar aqueles que lideraram a tentativa frustrada de golpe de Estado, alguns dos quais já foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal. O Brasil não se curvará a mais essa agressão", afirmou a nota, referindo-se à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete membros do “Núcleo Crucial” da denúncia, que articulavam uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
Lei Magnitsky
Sancionada em 2016, a Lei Magnitsky foi criada para punir graves violações de direitos humanos e corrupção de grande escala. A inclusão de um indivíduo na lista implica, além da revogação do visto e da proibição de entrada nos EUA, restrições significativas em transações financeiras com pessoas ou empresas norte-americanas. Isso também inclui o bloqueio de acesso a serviços como Visa, Mastercard, American Express, e grandes empresas de tecnologia como Google, Apple, Meta, Microsoft e Amazon. A medida pode afetar ainda mais o ambiente digital, uma vez que essas plataformas podem restringir ou suspender serviços como e-mails, redes sociais, armazenamento em nuvem e licenças de software.
A nova sanção segue a linha das restrições já aplicadas ao ministro, em julho, e reforça a pressão do governo dos EUA sobre o STF e seus membros. A decisão ocorre em meio a um aumento nas tensões entre os dois países, em parte devido ao julgamento de Bolsonaro, atualmente em prisão domiciliar, enquanto aguarda o período de apelação de sua condenação a 27 anos e três meses de prisão. Moraes é o relator da Ação Penal 2668, que trata da tentativa de golpe de Estado, e tem sido alvo de críticas, principalmente por sua postura em relação a Bolsonaro e à imposição de restrições a plataformas de mídia social sediadas nos EUA que não cumpriram as leis locais.
‘Injustiça’
Para o juiz, a aplicação de sanções à sua esposa é "ilegal e lamentável", argumentando que além de contrariar os princípios históricos de respeito à lei e aos direitos fundamentais dos EUA, também fere o Direito Internacional, a soberania do Brasil e a independência do Judiciário.
“As instituições brasileiras são fortes e sólidas. O caminho é o respeito à Constituição, não havendo possibilidade constitucional de impunidade, omissão ou covarde apaziguamento. Como integrante do Supremo Tribunal Federal, continuarei a cumprir minha missão constitucional de julgar com independência e imparcialidade”, declarou Moraes.
O STF também se posicionou contra a decisão, classificando-a como “injusta”. “Infelizmente, as autoridades norte-americanas foram convencidas de uma narrativa que não corresponde aos fatos: estamos diante de um julgamento que respeitou o devido processo legal e o amplo direito de defesa, com total publicidade”, afirmou a Corte. "Se já havia injustiça na sanção a um juiz pela sua atuação independente e dentro das leis e da Constituição, ainda mais injusta é a ampliação das medidas para um familiar do magistrado”, completou o Supremo.
Mais sanções
O anúncio da sanção ocorreu pouco antes da chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aos Estados Unidos, onde participaria da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas. Não foi o único movimento. Também ao longo do dia, a Casa Branca revogou o visto de mais sete autoridades brasileiras, entre elas o advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias; o ex-secretário-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na gestão de Moraes, José Levi; o ex-ministro do TSE Benedito Gonçalves; e membros do gabinete de Moraes.
A tensão também se reflete no cenário interno. Enquanto impõe sanções ao Brasil, Trump, ameaça cancelar as licenças de emissoras de rádio e televisão que criticam seu governo. Sob pressão da Casa Branca, a emissora Disney ABC retirou do ar "indefinidamente" o programa do apresentador Jimmy Kimmel, um conhecido crítico da atual gestão. Kimmel havia feito comentários sobre o assassinato do militante de direita Charlie Kirk e sobre o movimento político MAGA [Make America Great Again]. Na mesma segunda-feira, Trump assinou uma ordem executiva designando o movimento Antifa (antifacista) como uma “organização terrorista doméstica”.