O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), apresenta, nesta terça-feira (9), seu voto como relator da ação penal da tentativa de golpe de Estado. Ele apontou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como líder da “organização criminosa” que tentou abolir com violência o Estado Democrático de Direito.
Bolsonaro e outros sete réus fazem parte do chamado ‘núcleo crucial’ da trama golpista levada a cabo para manter o capital reformado no poder após a derrota nas eleições de 2022. A partir de hoje, os ministros da Primeira Turma do STF começam a apresentar seus votos pela condenação ou absolvição dos réus.
Moraes listou 13 atos executórios para comprovar a existência da organização criminosa golpista e sua ação coordenada e planejada, em “uma cronologia criminosa lógica no sentido da obtenção dos resultados pretendidos pela organização criminosa”.
Segundo o magistrado, Bolsonaro que iniciou a execução do golpe por meio de uma reunião ministerial, duas lives na internet, uma entrevista e ameaças feitas durante o 7 de Setembro, Dia da Independência Nacional. Todos os atos foram praticados em 2021.
As ameaças feitas por Bolsonaro no 7 de Setembro foram citadas por Moraes. "Tem tempo ainda para ativar seus inquéritos", diz uma das falas. "Acabou o tempo dele. Sai, Alexandre de Moraes! Deixa de ser canalha!. Deixe de oprimir no povo brasileiro! Dizer a vocês que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já esgotou. Tem tempo ainda de cuidar da tua vida", prosseguiu Moraes, lendo a transcrição das falas de Bolsonaro.
Em seguida, o ministro disse: "Qualquer pessoa decente, qualquer pessoa decente e de boa fé, sabe que o líder político, num alto cargo, instigando e insuflando milhares de pessoas, dessa forma, aumenta exponencialmente as agressões, as ameaças".
Conforme o voto do relator, o objetivo da trama era a “restrição, a anulação, mediante grave ameaça, do Poder Judiciário, em especial, do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, para que não houvesse mais o sistema de freios e contrapesos [entre os Poderes]”.
“Além disso, uma série de atos executórios para que houvesse a sua perpetuação no poder. Que esse grupo político se perpetuasse no poder, impedindo, seja a posse de um novo governo legitimamente eleito pelo povo, seja retirando do poder. Aí, sim, o golpe de Estado”, prosseguiu Moraes.
Moraes relembrou, por exemplo, o discurso de Bolsonaro no 7 de setembro de 2021, afirmando para milhares de manifestantes que só sairia do poder “morto ou preso”, acrescentando que nunca seria preso.
“O líder do grupo criminoso deixa claro aqui, de viva voz, de forma pública, para toda a sociedade, que jamais aceitaria uma derrota democrática nas eleições, que jamais aceitaria ou cumpriria a vontade popular”, pontuou o relator.
O magistrado disse “não haver dúvidas” de que tais ameaças foram criminosas e uma execução, já então, do plano golpista de Bolsonaro.
“Isso não é conversa de bar. Isso não é alguém no clube conversando com um amigo. Isso é um presidente da República, no 7 de setembro, data da independência do Brasil, instigando milhares de pessoas contra o Supremo Tribunal Federal, contra o Poder Judiciário e contra um ministro”, acrescentou.
Moraes apresentou ainda o que disse serem provas de que o golpe começou a ser executado ainda em 2021, com “unidade de desígnios” e “divisão de tarefas”, características típicas das organizações criminosas.
Citou, por exemplo, anotações encontradas em uma agenda do réu Augusto Heleno, general do Exército e ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (Abin), e em um celular do réu Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
O magistrado enfatizou o uso ilegal da estrutura da Abin para a realização de monitoramento de adversários políticos de Bolsonaro, com o objetivo de investir contra a Justiça eleitoral e a legitimidade de eventual resultado das urnas, sem que fossem apresentadas provas de qualquer fraude real.
“Todos acompanharam o procedimento executório de deslegitimação de algo que sempre foi considerado patrimônio nacional, um grande orgulho do Brasil que são as urnas eletrônicas, a Justiça Eleitoral, as eleições livres e periódicas desde a redemocratização”, disse Moraes, em seu voto.