Lula antecipa recondução de Paulo Gonet para PGR
Às vésperas do julgamento sobre tentativa de golpe no STF, presidente antecipou o movimento meses antes do término do atual mandato, em dezembro
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) oficializou nesta quarta-feira (27) a recondução de Paulo Gonet ao cargo de procurador-geral da República, antecipando o movimento meses antes do término do atual mandato, previsto para dezembro. A escolha será publicada no Diário Oficial da União (DOU) e segue para análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal.
Caso aprovado na sabatina, Gonet segue por mais dois anos à frente do Ministério Público Federal (MPF). No ano passado, ele foi aprovado com 65 votos favoráveis — precisa de, no mínimo, 41. O PGR, que não integrava a lista tríplice sugerida pela Associação Nacional dos Procuradores da Repúblicas (ANPR), foi indicado diretamente por Lula em 2023, rompendo uma tradição adotada nos seus dois primeiros mandatos e que também tinha sido quebrada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, quando indicou Augusto Aras.
Desde que assumiu, ações relevantes estão sob a responsabilidade de Gonet, como a responsabilização dos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro. Também se destacou ao denunciar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por cinco crimes relacionados à Ação Penal nº 2668, que trata sobre a tentativa de golpe de Estado após o resultado da eleição de 2022. Além disso, contrariou interesses do Planalto ao denunciar o deputado federal Juscelino Filho — que à época era ministro das Comunicações —, por suposto envolvimento em esquema de desvio de emendas parlamentares. O episódio resultou na demissão do ministro após indícios de contratação de empresa de fachada em obras da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf).
Pragmatismo
Lula antecipa a indicação de Gonet às vésperas do início do julgamento na Primeira Turma do STF do “núcleo crucial” da tentativa de golpe. Ao Correio da Manhã, o cientista político Elias Tavares avaliou que a decisão de Lula não é um gesto meramente burocrático. Para ele, além de reduzir incertezas institucionais, também envia um recado direto ao bolsonarismo de que “não haverá margem para manobras no Ministério Público”.
“A PGR é o braço máximo do Ministério Público junto ao STF e, portanto, exerce papel central em processos que envolvem autoridades da República. Ao agir agora, antes mesmo do fim do mandato em dezembro, Lula busca reduzir ruídos institucionais e evitar especulações sobre eventuais trocas às vésperas do julgamento de Jair Bolsonaro”, explicou. “É um movimento que mistura pragmatismo e política: garante previsibilidade para o Ministério Público e, ao mesmo tempo, reforça a narrativa de que não haverá espaço para manobras que fragilizem a responsabilização do ex-presidente”, completou Tavares à reportagem.
Novo processo
A recondução ocorre no momento em que o procurador-geral é chamado a se posicionar sobre novos desdobramentos envolvendo Jair Bolsonaro. A Polícia Federal indiciou o ex-presidente e seu filho, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), por obstrução de investigações e tentativa de interferência no curso do julgamento da suposta tentativa de golpe, que está marcado para iniciar no dia 2 de setembro. Segundo a corporação, Eduardo, que atualmente reside nos Estados Unidos, teria participado de articulações que resultaram em ações como a aplicação da Lei Magnitsky — criada para punir violações graves de direitos humanos e casos relevantes de corrupção — contra o ministro do STF Alexandre de Moraes, além do anúncio de tarifas a produtos brasileiros pelo presidente norte-americano Donald Trump (Republicano).
A Procuradoria tem até a próxima segunda-feira (1º) para decidir se oferece denúncia, pede novas investigações ou simplesmente dá ciência dos autos ao Supremo. O prazo, que se encerrava na quarta-feira, foi estendido por decisão de Moraes, que também autorizou vigilância integral na residência de Bolsonaro — que está em prisão domiciliar —, diante de suspeitas de descumprimento de medidas cautelares e a suposta tentativa de fuga para a Argentina.
A indicação do representante do MPF também se dá sob o pano de fundo de episódios diplomáticos com os EUA. No mês passado, o governo norte-americano suspendeu os vistos de oito ministros do STF e de Gonet, em represália ao que senadores republicanos classificaram como perseguição a Bolsonaro. A medida foi criticada duramente por Lula, que a classificou como “inaceitável interferência externa” no Judiciário brasileiro.