Foragida, Carla Zambelli é presa na Itália
Segundo o Ministério da Justiça, a parlamentar será submetida ao processo de extradição
Após quase dois meses foragida, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) foi detida na tarde desta terça-feira (29) em Roma, capital da Itália. A parlamentar havia deixado o Brasil para evitar o cumprimento da pena de dez anos de prisão à qual foi condenada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por envolvimento no planejamento da invasão aos sistemas eletrônicos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), executada em 2023 pelo hacker Walter Delgatti.
Zambelli iniciou sua fuga pela Argentina, seguiu para os Estados Unidos e, posteriormente, viajou para a Itália, onde pretendia residir. A deputada buscava se beneficiar da cidadania italiana que possui, na tentativa de escapar das consequências judiciais no seu país de origem. Desde então, foi declarada fugitiva pela Justiça brasileira e teve seu nome incluído na Difusão Vermelha da Interpol (Organização Internacional de Polícia Criminal), passando a ser considerada procurada internacionalmente.
Em nota, o Ministério da Justiça confirmou que autoridades italianas executaram a captura. “A medida é resultado de cooperação policial internacional entre a Polícia Federal, a Interpol e agências da Itália. A presa era procurada por crimes praticados no Brasil e será submetida ao processo de extradição, conforme os trâmites previstos na legislação italiana e nos acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário”, diz o trecho.
Repercussão
O deputado federal italiano Angelo Bonelli, filiado à Aliança Verde-Esquerda, afirmou que foi o responsável por informar à polícia local o endereço onde estava Zambelli. “Carla Zambelli está em um apartamento, em Roma. Forneci o endereço à polícia, neste momento a polícia está identificando Zambelli”, disse na rede social X (antigo Twitter). Essa não é a primeira vez que o deputado se pronuncia sobre o assunto, no dia 4 de junho deste ano — quando o ministro do STF, Alexandre de Moraes determinou a prisão preventiva e uma série de proibições —, Bonelli enviou um ofício aos ministros das Relações Exteriores, da Justiça e do Interior da Itália exigindo a aplicação de medidas contra a deputada brasileira.
No documento, Bonelli fez referência ao tratado de cooperação entre Brasil e Itália, em vigor desde 1993, e defendeu a colaboração com a Interpol. Na época, classificou como “uma vergonha” para a imagem de seu país não autorizar a extradição.
Embora a determinação da Suprema Corte também tenha previsto a perda do mandato da parlamentar e a declaração de sua inelegibilidade por um período de oito anos — além do pagamento de R$ 2 milhões por danos morais coletivos, valor que deverá ser dividido com Delgatti —, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), resolveu atender às demandas do campo oposicionista e deliberar sobre o caso. A cassação, até o momento, porém, ainda não foi votada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa Baixa.
Ao tomar conhecimento dos novos desdobramentos, Motta informou que consultou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e aguarda informações oficiais das autoridades. De acordo com ele, “as providências que cabem à Câmara já estão sendo adotadas, por meio da Representação que tramita na CCJC, em obediência ao Regimento e à Constituição”. “Não cabe à Casa deliberar sobre a prisão – apenas sobre a perda de mandato”, acrescentou.
Ainda nesta terça-feira, a bancada do Partido Liberal na Câmara, por meio do seu líder, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) manifestou “sua total solidariedade” a Zambelli. O advogado de Zambelli, Fábio Pagnozzi, informou que ela se apresentou voluntariamente às autoridades italianas, “dando início ao seu pedido de asilo político e não extradição".
“Esse gesto, firme e consciente, não é ato de fuga. É a consequência direta de um país que tem negado a seus representantes eleitos o direito à liberdade, ao contraditório e à legítima defesa”, diz a nota.
Próximos passos
Em entrevista ao Correio da Manhã, o professor de Direito Internacional da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), João Amorim, explicou os próximos passos. Segundo ele, agora as autoridades italianas têm 48 horas para decidir sobre a prisão.
“O Judiciário italiano pode encaminhar a presa diretamente para o processo de extradição, manter a prisão (diante de um eventual entendimento da impossibilidade de extradição, por conta da dupla nacionalidade de Zambelli) em instituição prisional comum, ou atender a um eventual pedido de prisão domiciliar. O cenário mais provável, mesmo diante da dupla nacionalidade, segundo a jurisprudência tradicional italiana, é que a cidadania italiana não seja impedimento para a extradição. Uma quarta possibilidade é o governo de Giorgia Meloni, primeira-ministra italiana, ofertar ou atender ao pedido de concessão de asilo político”, avaliou.
Em 15 de maio, quando o julgamento do STF estava na fase dos recursos — antes do resultado oficial da condenação sair e a parlamentar deixar o país —, Zambelli indicou que, em momento oportuno, poderia pleitear uma prisão domiciliar. Na ocasião, utilizou como embasamento alguns problemas de saúde que possui, como a síndrome de Ehlers-Danlos, que provoca deslocamentos nas articulações e órgãos; a síndrome de taquicardia ortostática postural, condição que causa batimento cardíaco acelerado ao ficar muito tempo em pé; além de manter um tratamento contra depressão.
No entanto, Amorim explicou que, caso ela retorne ao país de origem, essa possibilidade fica agora mais distante. “No Brasil, o Poder Judiciário, e a legislação penal, dificultam a concessão de relaxamento de prisão ou concessão de prisão domiciliar nos casos em que o condenado se encontrava foragido. O mesmo se dá na Itália”, disse o professor.