Eduardo pode enfrentar resistência do STF para assumir novo cargo
Deputado poderia assumir secretaria de governo estadual para tenta adiar retorno ao Brasil
Embora a nomeação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para uma secretaria estadual ou municipal em administrações aliadas — considerada uma alternativa para manter sua licença parlamentar — encontre respaldo jurídico na Constituição Federal, sua viabilidade prática e legal é amplamente contestada, especialmente diante do atual contexto político e das circunstâncias individuais que a cercam.
Eduardo, que está no exterior, é investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e tenta evitar um possível retorno ao Brasil que possa culminar em sua prisão. Assumir um cargo em algum governo poderia ser uma forma de estender a sua licença como deputado. Mas essa possibilidade é controversa. É o que avalia o advogado Flávio Vieira, sócio do Vieira e Marques Sociedade de Advogados, em entrevista ao Correio da Manhã.
Segundo Vieira, um dos principais entraves seria a exigência de posse presencial no território onde o cargo será exercido. O parlamentar está nos Estados Unidos desde março, com o objetivo declarado de denunciar supostas violações de direitos humanos no Brasil. Desde então, articula com aliados formas de permanecer fora do país sem perder o mandato, cuja licença de 120 dias expirou no domingo (20). Ele já manifestou publicamente temor de ser preso caso retorne. Eduardo é investigado por supostamente articular com autoridades norte-americanas sanções contra membros do governo brasileiro.
Obstáculos
“Essa imposição é claramente regulamentada por legislações administrativas estaduais e municipais, que exigem a presença do nomeado para a formalização do ato de posse. Uma eventual tentativa de realizar o ato de posse por procuração seria sujeita a questionamentos severos, tanto por parte da comunidade jurídica quanto das esferas políticas, colocando em dúvida sua legitimidade”, explicou Vieira.
“Além dos desafios práticos, a proposta levanta significativas questões jurídicas. O STF já demonstrou sensibilidade a situações que podem caracterizar desvio de finalidade no uso de prerrogativas constitucionais. A Corte pode interpretar essa nomeação como uma tentativa de manipular os mecanismos institucionais para favorecer interesses pessoais e, desse modo, violar princípios fundamentais como os da moralidade administrativa, legalidade e finalidade administrativa, consagrados no artigo 37 da Constituição Federal”, prosseguiu o advogado.
Suprema Corte
Em coletiva realizada por integrantes da oposição na segunda-feira (21), o líder do Partido Liberal na Câmara, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), confirmou que a possibilidade de Eduardo assumir um cargo no Executivo estadual está sendo considerada. Segundo o G1, já foi enviada ao STF uma consulta informal envolvendo uma eventual nomeação no governo do Rio de Janeiro, comandado por Cláudio Castro (PL).
Na terça-feira, o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), protocolou uma nova ação na Corte contra Eduardo. No documento, solicitou ao ministro Alexandre de Moraes uma medida cautelar que impeça o deputado de ser nomeado para cargos comissionados de livre nomeação ou funções de confiança nas esferas estadual, distrital ou municipal. Também pede o afastamento cautelar do exercício do mandato, argumentando que ele estaria sendo instrumentalizado para a continuidade de condutas ilícitas.
Além disso, Farias requer que governadores e o governador do Distrito Federal sejam impedidos de formalizar qualquer vínculo funcional, direto ou indireto, com o parlamentar, sob pena de responsabilização criminal e político-administrativa. No dia anterior, Moraes já havia atendido a outro pedido do petista e determinado o bloqueio de contas bancárias e bens de Eduardo Bolsonaro.
Caso similar
O advogado e ex-juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010), relembrou um precedente relevante do STF em 2016. Na ocasião, o ministro Gilmar Mendes suspendeu a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil no governo Dilma Rousseff, entendendo que a medida visava garantir foro privilegiado ao petista e impedir sua responsabilização na Operação Lava Jato. Para a Corte, isso configurou desvio de finalidade e afronta à Constituição.
No caso de Eduardo, segundo Reis, a irregularidade estaria no fato de ele não estar em território nacional e, aparentemente, não ter intenção de retornar. “A nomeação, portanto, teria como único propósito impedir a contagem de faltas por sua ausência na Câmara dos Deputados — algo que tem sido, inclusive, publicamente admitido por seus aliados. O nome disso, como já reconheceu o STF, é fraude. O precedente de 2016 se aplica com clareza”, afirmou. Os argumentos de Reis são compartilhados por Flávio Vieira.