Eduardo pode enfrentar resistência do STF para assumir novo cargo

Deputado poderia assumir secretaria de governo estadual para tenta adiar retorno ao Brasil

Por Karoline Cavalcante

Eventual posse não presencial pode ser contestada

Embora a nomeação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para uma secretaria estadual ou municipal em administrações aliadas — considerada uma alternativa para manter sua licença parlamentar — encontre respaldo jurídico na Constituição Federal, sua viabilidade prática e legal é amplamente contestada, especialmente diante do atual contexto político e das circunstâncias individuais que a cercam.

Eduardo, que está no exterior, é investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e tenta evitar um possível retorno ao Brasil que possa culminar em sua prisão. Assumir um cargo em algum governo poderia ser uma forma de estender a sua licença como deputado. Mas essa possibilidade é controversa. É o que avalia o advogado Flávio Vieira, sócio do Vieira e Marques Sociedade de Advogados, em entrevista ao Correio da Manhã.

Segundo Vieira, um dos principais entraves seria a exigência de posse presencial no território onde o cargo será exercido. O parlamentar está nos Estados Unidos desde março, com o objetivo declarado de denunciar supostas violações de direitos humanos no Brasil. Desde então, articula com aliados formas de permanecer fora do país sem perder o mandato, cuja licença de 120 dias expirou no domingo (20). Ele já manifestou publicamente temor de ser preso caso retorne. Eduardo é investigado por supostamente articular com autoridades norte-americanas sanções contra membros do governo brasileiro.

Obstáculos

“Essa imposição é claramente regulamentada por legislações administrativas estaduais e municipais, que exigem a presença do nomeado para a formalização do ato de posse. Uma eventual tentativa de realizar o ato de posse por procuração seria sujeita a questionamentos severos, tanto por parte da comunidade jurídica quanto das esferas políticas, colocando em dúvida sua legitimidade”, explicou Vieira.

“Além dos desafios práticos, a proposta levanta significativas questões jurídicas. O STF já demonstrou sensibilidade a situações que podem caracterizar desvio de finalidade no uso de prerrogativas constitucionais. A Corte pode interpretar essa nomeação como uma tentativa de manipular os mecanismos institucionais para favorecer interesses pessoais e, desse modo, violar princípios fundamentais como os da moralidade administrativa, legalidade e finalidade administrativa, consagrados no artigo 37 da Constituição Federal”, prosseguiu o advogado.

Suprema Corte

Em coletiva realizada por integrantes da oposição na segunda-feira (21), o líder do Partido Liberal na Câmara, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), confirmou que a possibilidade de Eduardo assumir um cargo no Executivo estadual está sendo considerada. Segundo o G1, já foi enviada ao STF uma consulta informal envolvendo uma eventual nomeação no governo do Rio de Janeiro, comandado por Cláudio Castro (PL).

Na terça-feira, o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), protocolou uma nova ação na Corte contra Eduardo. No documento, solicitou ao ministro Alexandre de Moraes uma medida cautelar que impeça o deputado de ser nomeado para cargos comissionados de livre nomeação ou funções de confiança nas esferas estadual, distrital ou municipal. Também pede o afastamento cautelar do exercício do mandato, argumentando que ele estaria sendo instrumentalizado para a continuidade de condutas ilícitas.

Além disso, Farias requer que governadores e o governador do Distrito Federal sejam impedidos de formalizar qualquer vínculo funcional, direto ou indireto, com o parlamentar, sob pena de responsabilização criminal e político-administrativa. No dia anterior, Moraes já havia atendido a outro pedido do petista e determinado o bloqueio de contas bancárias e bens de Eduardo Bolsonaro.

Caso similar

O advogado e ex-juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010), relembrou um precedente relevante do STF em 2016. Na ocasião, o ministro Gilmar Mendes suspendeu a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil no governo Dilma Rousseff, entendendo que a medida visava garantir foro privilegiado ao petista e impedir sua responsabilização na Operação Lava Jato. Para a Corte, isso configurou desvio de finalidade e afronta à Constituição.

No caso de Eduardo, segundo Reis, a irregularidade estaria no fato de ele não estar em território nacional e, aparentemente, não ter intenção de retornar. “A nomeação, portanto, teria como único propósito impedir a contagem de faltas por sua ausência na Câmara dos Deputados — algo que tem sido, inclusive, publicamente admitido por seus aliados. O nome disso, como já reconheceu o STF, é fraude. O precedente de 2016 se aplica com clareza”, afirmou. Os argumentos de Reis são compartilhados por Flávio Vieira.