Sem citar Trump, Lula defende democracia e multilateralismo

No Chile, carta conjunta dos presidentes deixa críticas veladas aos EUA

Por Gabriela Gallo

Lula e demais presidentes fizeram defesa conjunta do multilateralismo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que, considerando a atual situação global, ele observa uma “ofensiva antidemocrática internacional” que se manifesta presente no mundo. As declarações foram realizadas nesta segunda-feira (21) na reunião de Alto Nível Democracia Sempre, realizada em Santiago (capital do Chile), no Palácio de la Moneda. Além de Lula e do presidente chileno, Gabriel Boric, também estavam presentes os presidentes Pedro Sánchez (Espanha), Yamandú Orsi (Uruguai) e Gustavo Petro (Colômbia).

“Neste momento em que o extremismo tenta reeditar práticas intervencionistas, precisamos atuar juntos. A defesa da democracia não cabe somente aos governos. Requer participação ativa da academia, dos parlamentos, da sociedade civil, da mídia e do setor privado”, declarou o presidente brasileiro em entrevista à imprensa.

Nota conjunta

Ainda nesta segunda-feira, os presidentes presentes no encontro divulgaram uma nota conjunta em que defendem o compromisso com a defesa da democracia e do multilateralismo, discurso adotado pelos países desde que a gestão de Donald Trump (Republicano) nos governo dos Estados Unidos da América (EUA) passou a adotar uma política protecionista monetária.

“Reafirmamos nosso compromisso com a defesa da democracia, do multilateralismo e do trabalho conjunto para enfrentar as causas profundas e estruturais que enfraquecem nossas instituições democráticas, seus valores e legitimidade”, afirma o texto. “Acreditamos que é um imperativo ético e político promover uma estratégia comum para enfrentar fenômenos globais como o aumento da desigualdade, a desinformação, os desafios colocados pelas tecnologias digitais e pela inteligência artificial”, completou a nota.

Ao Correio da Manhã, a advogada especialista em direito internacional Hanna Gomes avaliou que “a polarização política e a disseminação de desinformação têm sido desafios em várias nações, e ao reafirmar esse compromisso, os líderes signatários da carta demonstram uma frente unida contra tendências que podem minar a ordem democrática”.

“Para o Brasil em particular, que vive tensões institucionais recentes, essa declaração ganha um peso adicional”, ela ponderou citando os conflitos recentes com os EUA.

Multilateralismo

O evento ocorreu dias após o presidente dos Estados Unidos Donald Trump anunciar que os EUA aplicarão uma tarifa de 50% a produtos brasileiros a partir de 1º de agosto. Dentre as justificativas do presidente norte-americano, ele alega que o Brasil aplica tarifas injustas a produtos estadunidenses e citou o ex-presidente brasileiro Jair Messias Bolsonaro (PL), afirmando que Bolsonaro vive uma “caça as bruxas” com o Judiciário do Brasil. O documento, porém, não o nome de Donald Trump, tampouco de Jair Bolsonaro.

Hanna Gomes destacou que a carta conjunta “não é uma ‘resposta’ direta ao tarifaço de Trump no sentido de uma retaliação ou comunicado formal de repúdio”, mas ela representa “um posicionamento estratégico por parte desses líderes, em defesa dos valores democráticos e da cooperação internacional”. E dentre os posicionamentos mais sutis no documento, ela pontua como a importância do multilateralismo é citada.

“O multilateralismo prega a cooperação entre múltiplas nações para resolver problemas globais, em contraste com abordagens unilaterais ou bilaterais que podem levar a conflitos e desequilíbrios. Esse foi o recado da carta que resumo o encontro. A política ‘America First’ de Trump, caracterizada por medidas protecionistas com a imposição de tarifas, é um exemplo clássico de unilateralismo, criticado de forma velada pela carta”, afirmou Hanna Gomes.

“A carta não cita explicitamente Trump ou as tarifas, mas ao defender o multilateralismo, ela implicitamente critica e contrasta com as ações unilaterais dos EUA. Os países signatários estão sinalizando que acreditam em um sistema global baseado em regras, negociações e cooperação, e não em imposições. É uma forma de reiterar a importância das instituições internacionais e do diálogo para resolver divergências, em vez de medidas retaliatórias”, completou a advogada.