Governo tenta tirar lucro com discurso sobre taxar mais ricos
Ao Correio, especialistas avaliam estratégia do governo de tentar aumentar popularidade
Com as negociações para alcançar a promessa de companha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Congresso Nacional analisa o projeto de lei, entregue pelo Executivo, que aumenta o limite de isenção do pagamento do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensal, a partir de 2026 (PL 1087/2025). Nesta terça-feira (17), a comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa o projeto realizará, a partir das 9h30, uma audiência pública para debater sobre o tema – convocada pelo relator da medida, deputado Arthur Lira (PP-AL).
Dentre as propostas anunciadas pelo poder Executivo para compensar a perda arrecadatória está a tributação para quem ganha acima de R$ 50 mil por mês (o equivalente a R$ 600 mil por ano) em dividendos de empresas. Dividendos são uma parcela do lucro da empresa que é distribuída a seus acionistas.
Ao Correio da Manhã, a coordenadora de Jurídico e Tributário na BMJ Consultores Associados Gabriela Rosa explicou que, para o governo ter sucesso em políticas tributárias, “depende muito mais de como vai ser a estratégia de comunicação do que propriamente o impacto da política tributária”.
“O que está sendo feito é uma equalização da tributação. Então, se não tem essa dinâmica do governo usar politicamente a comunicação dessa medida, ela não tem efeito prático. E esse é precisamente um dos maiores problemas que a questão da tributação desse governo enfrentou. Uma série de medidas foram aprovadas e elas são de caráter muito técnico e são muito distantes da população e não foram utilizadas em nível de comunicação de maneira de facilitar o entendimento do âmbito público”, explicou Rosa.
Estratégia
E com uma derrota do governo na aprovação da urgência do projeto que susta o decreto que aumenta a tributação do IOF, nesta segunda-feira (16), o governo reforça o discurso de aumentar a taxação aos chamados super-ricos e que isso, se não avança, é por impedimento do Congresso. Parte do governo e do Partido dos Trabalhadores avalia que a defesa da taxação dos mais ricos deve gerar dividendos políticos, o que pode trazer a popularidade do governo de volta – especialmente porque pesquisas anteriores apontam que grande parte da população concorda com a ampliação da isenção do imposto de renda. Com isso, a estratégia do governo seria passar para o Congresso o ônus da taxação de dividendos, e considerando que ela seja barrada pelo Congresso, pode gerar lucros ao governo ao jogar a responsabilidade aos congressistas.
Questionada pela reportagem, Gabriela Rosa avaliou que “essa estratégia de passar o ônus para o Congresso” é possível porque, como a tributação de dividendos vem da mesma proposta de ampliar a faixa de isenção do imposto de renda, é “uma política muito difícil dos parlamentares serem contrários”, eleitoralmente falando. “Se faz uma contra campanha dizendo: ‘Esse foi o parlamentar que votou contra a ampliação da isenção do imposto de renda, que foi contra a redução do imposto para as famílias’”, ponderou a jurista.
Todavia, em conversa com reportagem, o cientista político Márcio Coimbra avalia que o governo não será capaz de lucrar com esse projeto. “O Brasil passou a ser muito mais um país de empreendedores, a direita vendeu ao Brasil essa ideia, e o brasileiro comprou a ideia de que quem gera recursos são as empresas, são os pequenos e médios empresários”, disse.
Ainda sobre estratégias de comunicação, Coimbra ponderou que, quando o Congresso começar a discutir o aumento na tributação de dividendos, parlamentares da direita reforçará um discurso negativo à medida. “Talvez, por exemplo num vídeo do [deputado] Nikolas Ferreira, se ele achar a narrativa correta para transmitir essa mensagem, ele pode matar o projeto no nascedouro. Eu acredito que, como a direita é melhor na criação de narrativas do discurso, pode acabar derrubando isso [a compensação]”, ponderou o cientista político.