Por tortura sofrida na ditadura, Dilma recebe anistia política
Decisão também contempla um pedido de desculpas formal e uma indenização de R$ 100 mil
A Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania concedeu, nesta quinta-feira (22), anistia política à ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em reconhecimento à violação que ela sofreu durante a ditadura militar (1964-1985) — incluindo tortura, prisão arbitrária, cassação de direitos políticos, perseguição profissional e violência de gênero. Em nome do Estado brasileiro, também recebeu um pedido formal de desculpas.
Por unanimidade, o voto do relator, conselheiro Rodrigo Lentz foi acompanhado pelos demais membros do conselho. No seu parecer, Lentz argumentou que a Lei da Anistia, que perdoa as vítimas do regime militar, é uma política pública da justiça de transição que constitui um pilar da mudança da política de uma cultura autoritária para a democrática, que, segundo ele, é vital para a defesa do Estado democrático de direito.
“A anistia de 1988 é um instrumento de reconstrução democrática e reconhecimento do sofrimento político como violência de Estado. Jamais poderá ser confundida com impunidade a conspirações autoritárias contra o regime democrático”, declarou.
Torturas
O relator contou a trajetória e as torturas que foram cometidas em Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo contra a ex-presidente. Também traz uma série de depoimentos inclusos nas denúncias dela.
“Se o interrogatório é de longa duração, com um ‘interrogador experiente’, ele te bota no pau de arara alguns momentos e depois leva para o choque. Uma dor que não deixa rastros, só te mina. Muitas vezes também usavam palmatória, usavam em mim muita palmatória”, diz um dos trechos.
O pedido foi protocolado pela ex-presidente em 2002, ano de criação da comissão. Porém, a própria Dilma pediu pela suspensão do processo enquanto ocupava cargos no governo. Ao sofrer impeachment em 2016, ela solicitou o retorno da tramitação e teve seu requerimento negado em 2022, durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Na ocasião, Bolsonaro chegou a sugerir que Dilma tentasse novamente quando um governo de esquerda voltasse ao poder. Ela recorreu novamente até ter a análise atendida na quinta-feira.
Provimento parcial
A decisão contempla também o provimento parcial do recurso apresentado pela ex-presidente. Dilma havia pedido uma indenização de R$ 10.735 a ser paga mensalmente em razão da época em que foi demitida da Fundação de Economia e Estatística (FEE), quando recebia este valor de salário. Além disso, pediu a contagem do tempo do período em que sofreu tortura e detenção. No entanto, o teto legal das reparações é de R$ 100 mil, valor que será pago a ela em parcela única.
“Esta comissão, pelos poderes que lhe são conferidos, lhe declara anistiada política brasileira. E, em nome do estado brasileiro, lhe pede desculpas por todas as atrocidades que lhe causou o estado ditatorial. Causou à senhora, à sua família, aos seus companheiros de luta e, ao fim e ao cabo, como disse o relator, a toda a sociedade brasileira”, disse a presidente da comissão, a procuradora federal aposentada Ana Maria Oliveira.
Por conflitos de agenda, a atual presidente do Novo Banco de Desenvolvimento — o banco do Brics — não conseguiu comparecer presencialmente à reunião do colegiado. Porém, as deputadas federais do Partido dos Trabalhadores Maria do Rosário, Jandira Feghali e Érika Kokay estiveram no local.