Ex-comandante da Aeronáutica confirma ameaça de prisão a Bolsonaro

Em depoimento ao STF, Baptista Júnior afirmou que a trama do golpe não avançou por falta de unanimidade nas Forças Armadas

Por Karoline Cavalcante

Depoimento de Baptista Júnior complica Bolsonaro

O ex-comandante da Aeronáutica brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior afirmou à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (21), que o então chefe do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, de fato chegou a ameaçar prender o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) caso ele tentasse impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, vencedor das eleições de 2022.

A declaração foi dada durante audiência da Ação Penal 2668, que apura uma tentativa de golpe de Estado articulada nos últimos meses do governo Bolsonaro. Baptista Júnior prestou depoimento na condição de testemunha tanto da Procuradoria-Geral da República (PGR), autora da denúncia, quanto das defesas de alguns dos acusados.

Questionado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, o brigadeiro confirmou ter conhecimento da repercussão do depoimento de Freire Gomes na terça-feira (20), que negou ter dado voz de prisão a Bolsonaro. Ainda assim, reiterou que o general fez um alerta direto ao então presidente.

"Confirmo, sim senhor. Acompanhei anteontem a repercussão [do depoimento de Freire Gomes]. Estava chegando de viagem. Freire Gomes é uma pessoa polida, educada, não falou com agressividade, ele não faria isso. Mas é isso que ele falou. Com muita tranquilidade, calma, mas colocou exatamente isso: ‘Se fizer isso, vou ter que te prender’", afirmou o ex-comandante da Aeronáutica.

Minuta do golpe

O brigadeiro também confirmou sua participação em uma reunião no Ministério da Defesa, em dezembro de 2022, durante a qual foi apresentado aos comandantes militares um rascunho de decreto que visava impedir a posse do presidente eleito, a chamada “minuta do golpe”. O documento foi entregue pelo então ministro da Pasta, Paulo Sérgio Nogueira.

O brigadeiro relatou também que, ao perceber o conteúdo do documento, questionou o ministro sobre a possibilidade de ele barrar a posse de Lula. Após a confirmação de Nogueira, o brigadeiro diz ter se recusado a ler o texto, alegando que não aceitava nem mesmo recebê-lo, e decidiu deixar a sala imediatamente.

Na mesma ocasião, o então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, teria colocado as tropas à disposição para colaborar com a execução do plano, segundo o depoente. Ao ser questionado pelo ministro Luiz Fux sobre o motivo da tentativa de golpe não ter avançado, o ex-comandante afirmou que não houve unanimidade das Forças Armadas para aderir à trama.

O brigadeiro também confirmou que Bolsonaro foi informado, por meio do Ministério da Defesa de que não havia indícios de fraude nas eleições. Além disso, afirmou ter ouvido que o então presidente tentou adiar a divulgação do relatório militar que atestava a segurança do processo eleitoral.

Núcleo duro

A Ação Penal 2668, em tramitação no STF, investiga o chamado "núcleo duro" da suposta trama golpista. Além de Bolsonaro, são réus o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier; o candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, general Braga Netto; o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem; o ex-ministro da Justiça Anderson Torres; o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno; e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid.

Eles respondem por cinco crimes: tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e destruição de patrimônio tombado.

As audiências continuam nesta sexta-feira (23), com os depoimentos do senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice-presidente da República, e do atual comandante da Marinha, almirante Marcos Sampaio Olsen.