Mais dez se tornam réus na ação sobre o golpe

Pela primeira vez, Primeira Turma retira nomes do processo: dois militares

Por Gabriela Gallo

Dez do "núcleo militar" se tornam réus por decisão da Primeira Turma

Por unanimidade, nesta terça-feira (20) a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) tornou nove militares e um agente da Polícia Federal, denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), réus por integrarem o núcleo 3 do plano de tentativa de golpe de Estado. O colegiado acatou integralmente o voto do ministro-relator do caso, Alexandre de Moraes, em abrir uma ação penal para cada indiciado, com exceção de dois que estavam na denúncia do procurador-geral, Paulo Gonet.

O núcleo 3, ou núcleo militar, era responsável por elaborar ações táticas para implementar o plano. Dentre as ações, também estava o plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa o assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e do então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do STF, Alexandre de Moraes.

Assim, passam a ser julgados pela Primeira Turma nove militares da ativa e da reserva do Exército Brasileiro e o agente da Polícia Federal (PF) Wladimir Matos Soares. Os militares do Exército são: Bernardo Romão Correa Netto (coronel), Estevam Cals Theophilo Gaspar De Oliveira (general da reserva), Fabrício Moreira de Bastos (coronel), Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel), Márcio Nunes Resende Júnior (coronel), Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel), Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel), Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel) e Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros (tenente-coronel).

Os únicos indiciados que não se tornaram réus são o coronel da reserva Cleverson Ney Magalhães e o general Nilton Diniz Rodrigues. Em seu voto, Alexandre de Moraes avaliou que não há provas suficientes que sustentem abrir uma ação penal contra os militares sobre o caso. Os demais ministros que compõem a turma – Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e o presidente do colegiado, Cristiano Zanin – acompanharam integralmente o voto do relator.

Crimes

Como a denúncia da PGR é somente uma – que foi fatiada em grupos para acelerar o processo de julgamento na Suprema Corte – caso o STF torne os indiciados réus, os acusados serão investigados pelos crimes: golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União.

Tal como nas sessões dos outros núcleos do plano julgados anteriormente, a defesa do tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira, o advogado Renato da Silva Martins, questionou a respeito da competência e imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes na relatoria do caso – já que ele era um dos alvos do plano de assassinato a autoridades. Em seu voto, Morares reforçou que a Corte não está julgando crimes de tentativa de homicídio, mas de tentativa de golpe de Estado. Portanto, na avaliação dos magistrados, isso não compromete o princípio de imparcialidade do ministro-relator.

A sessão

Durante a sessão, Alexandre de Moraes citou reuniões entre os kids pretos (militares da ativa ou da reserva especialistas em operações especiais) para a elaboração de estratégias para pressionar os comandantes das Forças Armadas a aderirem à trama golpista. Segundo o magistrado, esses encontros evidenciam mobilização dos acusados para tentar implementar o golpe. “Não era uma reunião de amigos como foi dito [pelas defesas], conversa de bar, jogar conversa fora. Na verdade, era para jogar a democracia fora”, destacou o relator.

Em seu voto, ele apresentou slides com trocas de mensagens entre os acusados. Ao ler as mensagens exibidas, ele reiterou que a Suprema Corte já considerou errado o argumento de que o artigo 142 da Constituição classifica as Forças Armadas como “poder moderador”.

“Os militares sabem, e por isso o comandante do Exército se negou a aderir ao golpe, que as Forças Armadas não são poder moderador, não substituíram o imperador. Esse poder moderador deixou de existir com a Constituição de 1891″, afirmou Moraes. “O artigo 142 não tem absolutamente nada a ver com poder moderador, e os juristas que assim escrevem não são juristas, são golpistas”, ele completou.

Todas as questões preliminares (que devem ser decididas antes de se avançar para o mérito da causa, geralmente apresentadas pelas defesas dos acusados na intenção de anular a condenação de seus clientes) apresentadas foram rejeitadas. Em comparação às questões apresentadas pelos advogados de núcleos já julgados, apenas a defesa do general da reserva Estevam Gaspar de Oliveira, trouxe argumentos diferentes. Os advogados alegaram que houve vícios na fase de investigação em decorrência de uma suposta tentativa de desestabilizar psiquicamente o militar antes de seu depoimento à PF. Contudo, os ministros negaram o caso, alegando que os advogados não apresentaram provas para sustentar a tese.

“Não parece crível que um general de quatro estrelas do Exército Brasileiro, que serviu no exterior, que foi feito refém das forças contrárias às forças de paz da ONU, se sentiria desestabilizado com o comentário ou fala de algum delegado da Polícia Federal”, disse Moraes.

Demissão

Também nesta terça-feira o Partido Liberal (PL) demitiu Fábio Wajngarten, assessor e um dos advogados do ex-presidente Jair Bolsonaro. A demissão ocorreu a pedido da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, dias após ser divulgada uma troca de mensagens entre Wajngarten com o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, divulgadas pelo UOL. Na conversa, ambos criticaram a possibilidade de o partido lançar Michelle como possível candidata à Presidência da República no lugar de Jair Bolsonaro.

“Prefiro o Lula”, disse Cid diante da possibilidade da ex-primeira-dama concorrer ao cargo. “Idem”, concordou Fábio Wajngarten. De acordo com o PL, as mensagens evidenciaram “deslealdade” do advogado, o que justificou sua demissão.