Por: Ana Paula Marques

Cartão de Vacina: PGR pede mais apuração sobre Bolsonaro

Gonet: cautela sobre eventual acusação | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu, nesta terça-feira (23), mais apuração à Polícia Federal (PF) das investigações sobre a falsificação de certificados de vacinas de covid-19 que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro, seu ex-ajudante de Ordens Mauro Cid e mais 15 pessoas por crimes como associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema de informação.

Gonet devolveu o material de acusação para a PF e pediu mais detalhes sobre o processo antes de resolver se apresentará denúncia contra os alvos. "Cabe sugerir, neste momento, a providência da devolução dos autos à Polícia Federal para a complementação das investigações", escreveu. O trâmite do processo, ainda deve passar pelo relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Alexandre de Moraes.

A investigação da PF comprovou que dados falsos de vacinação de Bolsonaro e de sua filha mais nova, Laura, foram inseridos no sistema do Ministério da Saúde a partir da prefeitura de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro. O fato foi confirmado por Mauro Cid. Em sua delação premiada à PF, ele afirmou que executou a fraude por ordens do próprio Bolsonaro. Já Bolsonaro nega ter dado tal ordem a Mauro Cid.

Incerteza

No entanto, as investigações não comprovaram se o cartão falso chegou a ser usado por Bolsonaro. Em dezembro de 2022, Bolsonaro viajou para o Estados Unidos, pouco antes da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Quando o processo de acusação foi enviado a Procuradoria-Geral da República, a PF ainda aguardava a chegada de informações solicitadas aos EUA para fechar esse ponto da apuração.

Por esse motivo, Gonet pediu mais apuração da polícia. “É relevante saber se algum certificado de vacinação foi apresentado por Jair Bolsonaro e pelos demais integrantes da comitiva presidencial, quando da entrada e permanência no território norte-americano. Ao menos seria de interesse apurar se havia, à época, norma no local de entrada da comitiva nos EUA impositiva para o ingresso no país da apresentação do certificado de vacina de todo estrangeiro, mesmo que detentor de passaporte e visto diplomático. A notícia é relevante para a avaliação dos tipos penais incidentes no episódio”, escreveu Gonet.

Além de pedir mais investigações, a Procuradoria também pediu à PF o relatório da perícia feita no celular do deputado Gutemberg Reis (MDB-RJ), um dos indiciados na investigação, e uma análise do conteúdo dos computadores, celulares e pendrives apreendidos com outros investigados, além de Mauro Cid.

Cautela

Gonet procura ter cautela para não existir a possibilidade de furo nas investigações, é o que defende o cientista politico André César. “Tivemos uma experiência negativa com a Operação Lava Jato, uma operação que tomou rápidas decisões. Gonet tenta blindar essas investigações para não deixar brechas para a defesa do ex-presidente, além de mostrar um perfil diferente do ex-procurador-geral da República, Augusto Aras”, disse. Ainda segundo o especialista, a estratégia de Bolsonaro “é sempre terceirizar a culpa”.

Para o professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), João Botelho, há um zelo maior em investigações contra o ex-presidente pelas questões politicas. “Existe uma sensibilidade de tudo que envolve. Então, as instâncias responsáveis e seus representantes têm buscado se cercar de uma gama consistente de evidências, para além de delações, de modo a embasar as decisões. Por outro lado, não se pode descartar que haja alguma intenção protelatória da parte da PGR, considerando o histórico analítico de Gonet como procurador”, disse.

Golpe

A investigação da PF também ligou o caso dos certificados de vacinação à investigação de uma suposta tentativa de golpe de Estado que teria sido planejado por Bolsonaro e aliados para impedir a posse do presidente Lula.

Segundo a PF, o esquema de fraude dos cartões de vacina “pode ter sido utilizado pelo grupo para permitir que seus integrantes, após a tentativa inicial de golpe de Estado, pudessem ter à disposição os documentos necessários para cumprir eventuais requisitos legais para entrada e permanência no exterior, aguardando a conclusão dos atos relacionados à nova tentativa de golpe de Estado que eclodiu no dia 8 de janeiro de 2023”, descreve a PF.

Em 2022, o ex-presidente conduziu reuniões com os comandantes das Forças Armadas para discutir a "legalidade jurídica" do tema e apresentar documentos com teor golpista. A informação foi confirmada pelos ex-comandantes da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior e do Exército Marco Antônio Freire Gomes.