Por: Rudolfo Lago

Moraes vai ao Congresso medir temperatura

Moraes foi ver de perto qual a disposição de Pacheco na briga com a Justiça | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

O motivo oficial foi entregar ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), um anteprojeto preparado por juristas que faz alterações no Código Civil. Mas, na verdade, a visita de surpresa que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, foi interpretada como uma ação para medir a temperatura do Congresso contra o poder Judiciário, depois de o Senado aprovar na terça-feira (16), por larga margem, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Drogas. A proposta, de iniciativa do próprio Pacheco, vai na linha oposta do que pretendia o STF, criminalizando a posse e o porte de qualquer quantidade de entorpecente. Trata-se de uma resposta do Congresso ao Supremo, diante de uma avaliação de que a Justiça vem extrapolando em suas funções.


Ainda na quarta-feira (17), Moraes teve uma reunião com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Lira também reuniu-se com o ministro da Casa Civil, Rui Costa. Há uma grande preocupação de nova disputa entre os poderes da República.

Aprovada no Senado, a PEC das Drogas será agora analisada pela Câmara. E não é a única possibilidade de retaliação ao Judiciário. Lira criou um grupo especial para estudar propostas que estão em tramitação que limitam poderes do STF, ao estabelecer mandatos, aumento da idade mínima para ser ministro, entre outras. O presidente da Câmara cogita ainda instalar cinco Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) pedidas pela oposição. Uma delas, pedida pelo deputado Marcel Van Hatten (Novo-RS), visa justamente investigar supostos abusos cometidos pelo STF e o TSE.

Moraes foi conversar para medir qual é a real disposição do Congresso em trabalhar essas retaliações contra o Judiciário e começar a estabelecer um diálogo para arrefecer esses ânimos. A conquista de um clima menos beligerante interessa também ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Primeiro, porque a desarmonia entre os poderes compromete a todos. E, segundo, porque o governo também precisa encontrar um clima mais harmônico, especialmente com Lira, que tem demonstrado insatisfação com o ministro de Relações Exteriores, Alexandre Padilha, e disposição maior para retaliar.

Jantar

A visita de Moraes a Pacheco e Lira começou a ser costurada na segunda-feira (15), em um jantar na casa do ministro decano (o mais antigo) do STF, Gilmar Mendes. No jantar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e o advogado-geral da União, Jorge Messias, conversaram com Gilmar, Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin, os ministros do Supremo mais alinhados com o governo.

Entre as garfadas, o presidente e os ministros acertaram estratégia para uma maior aproximação política entre o Judiciário e o Congresso. As ações de aproximação, em princípio, ficarão por conta desses ministros, especialmente os considerados mais políticos (Gilmar, Moraes e Dino, que é senador eleito).

No caso do STF, os ministros estão preocupados com a intensidade do confronto que parte do Congresso. Eles interpretam que as reações ao Judiciário decorrem do trabalho que teria sido feito para proteger a democracia brasileira de ataques ocorridos durante o governo anterior, com as tentativas de golpe e quebra do estado democrático de direito. Tal trabalho, porém, gerou reações políticas.
O atual perfil do Congresso brasileiro é mais conservador. E os partidos de oposição têm muita força. O PL, por exemplo, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, tem a maior bancada da Câmara. Algumas das ações do STF acabaram atingindo políticos, como os deputados Carlos Jordy (PL-RJ) e Alexandre Ramagem. Ainda que tenha sido mantida, a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de ser o mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco, também gerou repercussões.

E há ainda incômodo com ações do Supremo que invadiriam, na avaliação dos parlamentares, competências legislativas. Caso justamente da questão da descriminalização das drogas.

Assim, Moraes avisou por telefone a Pacheco que iria ao Senado minutos antes da sessão de entrega do anteprojeto que altera o Código Civil, composto por juristas sob a coordenação do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luís Felipe Salomão. A proposta visa atualizar algumas questões, como, por exemplo, as responsabilidades por conteúdos na internet. "Vossa excelência lembrou que na virada do século não existiam redes sociais; nós já éramos felizes e não sabíamos. A necessidade dessa regulamentação, do tratamento, da responsabilidade, do tratamento de novas formas obrigacionais. Então a comissão fez exatamente isso", disse Moraes, ao participar da entrega do anteprojeto.

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