Por: Ana Paula Marques

Marinha critica revogação de título para almirante

Vídeo deveria gerar a demissão do comandante da Marinha | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

Uma decisão do Conselho Universitário da Universidade Federal do Rio Grande (Consun) causou a reprovação de uma instituição inteira das Forças Armadas Brasileiras. Na última sexta-feira (5), o Conselho cassou o título de “doutor honoris causa” concedido ao Almirante-de-Esquadra Maximiano Eduardo da Silva Fonseca. A resposta da Marinha do Brasil à Universidade Federal do Rio Grande (FURG) aconteceu nesta segunda-feira (8) e foi de imediata reprovação.

A manifestação, em nota, do Comandante Marcos Sampaio Olsen não foi só de desagrado pela “desconsideração do legado do almirante”, mas também estabelecia que a ação feria a “instrumentalização política da academia”, ou seja, segundo o atual Almirante-de-Esquadra, atingia diretamente a Marinha. O Conselho Universitário também cassou os títulos de doutor honoris causa concedidos ao ex-presidente Emílio Garrastazu Médici e ao ex-ministro Golbery do Couto e Silva, ambos nomes da ditadura militar.

Entretanto, a carta enviada pelo comandante menciona apenas a decisão de cassar a honraria de Maximiano Fonseca. Na nota, Olsen argumenta que o oficial Maximiano Fonseca, morto nos anos 1990, teve sua "vida inteiramente consagrada ao labor ligado à Pesquisa Oceânica" e também pede explicações da universidade para a retirada do título.

“É difícil compreender as razões de renomada instituição, com vasta experiência em estudos do mar, ignorar as contribuições de um homem honrado, progressista e com uma vida dedicada ao Brasil e ao povo brasileiro”, descreveu.

Navio prisão

O oficial Maximiano Fonseca foi o idealizador do Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que por descrição da própria Marinha, tem o objetivo de “promover pesquisa científica diversificada e de alta qualidade na região antártica”. A nota foi confirmada pela Marinha, que ao Correio da Manhã declarou o conteúdo do documento como verdadeiro e disse se tratar da posição oficial da Força.

De fato, Maximiano criou o Proantar e teve papel importante no desenvolvimento de pesquisas oceânicas no país. Porém, apesar das atribuições de prestígio descritas na carta da Marinha, a Comissão da Verdade, — grupo instituído para investigar as graves violações de direitos humanos durante a Ditadura — revelou que Maximiano Fonseca, como comandante do navio hidrográfico Canopus durante o golpe militar de 1964, teria permitido que o navio servisse de prisão e local de tortura de 22 presos políticos. O navio fazia o levantamento hidrográfico da costa do Rio Grande do Sul. Mas, ao ser utilizado como prisão a partir de abril de 1964 após o golpe militar, gerou a justificativa para a revogação do título ao almirante.

Resposta

Essa informação foi a resposta da universidade para esclarecer a decisão da retirada do título. Nesta terça-feira (9), a FURG enviou uma carta em resposta ao comandante da Marinha. No texto, a universidade descreve em detalhes o motivo da cassação dos títulos, que passaram ao todo por sete estágios de análise.

“Cientes da já mencionada complexidade da revogação da concessão, iniciou-se um processo de profunda reflexão sobre as alternativas que se apresentavam [...] E só após recomendações do Ministério Público Federal foi tomada a decisão, não só nessa, mas em universidades federais gaúchas, que já revogaram os títulos honoríficos outorgados no mesmo contexto, assim como dezenas de universidades pelo país afora, seguindo exatamente a linha apresentada”.

Em um desses trechos, a universidade garante que “entre os presos políticos mantidos no navio em cativeiro e torturados, estiveram agentes da comunidade como professores, vereadores, jornalistas, ferroviários e outros cujas funções sociais ainda não são conhecidas”. A nota é assinada pelo reitor Danilo Giroldo, que logo depois diz reconhecer as “inquestionáveis e grandiosas contribuições ao nosso país” do almirante Maximiano. No entanto, o documento diz ainda que se vive um momento histórico diferente de 1984, último ano do regime militar, quando o título honorífico foi concedido.

A universidade termina o texto se dizendo à disposição da Marinha “para receber elementos adicionais ainda não analisados ou não presentes em documentos oficiais públicos que afastem a responsabilidade do Almirante Maximiano dos fatos apontados pela Comissão Nacional da Verdade em relação ao navio Canopus”.